A desigualdade de rendimentos é elevada ou está a aumentar em mais de 60% dos países que beneficiam de subvenções ou empréstimos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, segundo os dados coligidos pela Oxfam, uma federação internacional de 19 organizações que lutam contra a pobreza, mas, nos países de língua portuguesa, a situação tem melhorado, com exceção de Angola.

O estudo da Oxfam mostra que a desigualdade de rendimentos aumentou em 37 países durante a última década e é elevada em 37 outros Estados, ou seja, aumentou ou é elevada em 64 dos 106 países de rendimentos baixos e médios analisados.

A análise foi feita antes das reuniões da primavera do FMI e do Banco Mundial, em abril, em Washington.

“O FMI e o Banco Mundial dizem que combater a desigualdade é uma prioridade mas, ao mesmo tempo, recuam políticas que aumentam a divisão entre os ricos e o resto”, disse Kate Donald, chefe do Escritório da Oxfam Internacional em Washington. “As pessoas comuns lutam cada vez mais, todos os dias, para compensar os cortes no financiamento público da saúde, da educação e dos transportes. Esta hipocrisia de alto risco tem de acabar”, acrescentou.

Os países com elevados níveis de desigualdade de rendimentos têm coeficientes de Gini acima de 0,4 pontos (ou 40%), o nível de alerta estabelecido pela Organização das Nações Unidas. O coeficiente de Gini é uma medida da desigualdade de rendimentos num país, variando entre 0 (ou 0%, a igualdade perfeita) e 1 (ou 100%, a desigualdade perfeita).

Em Portugal, o coeficiente de Gini caiu 10,8%, entre 2003 e 2021, para 34,59%, segundo os dados da plataforma para a pobreza e desigualdade do Banco Mundial.

Nos dados cedidos pela Oxfam ao NOVO sobre os países de língua oficial portuguesa destaca-se, pela negativa, a evolução em Angola, em que o índice subiu 20%, para 0,51 pontos (ou 51%), entre 2010 e 2018.

Angola acumula a dupla condição de ter um coeficiente a subir, para um valor que ultrapassa os 0,4 pontos (ou 40%) do ponto de alerta considerado pela ONU, e tem uma dívida elevada ao FMI e ao Banco Mundial, superior a 6,6 mil milhões de dólares (cerca de 6,17 mil milhões de euros).

Segundo o Banco Nacional de Angola, a dívida pública angolana expressa em dólares aumentou cerca de 11,46% em 2023, face ao ano anterior, para um máximo de 80,61 mil milhões de dólares (cerca de 75,46 mil milhões de euros), o que representa mais de 88% do produto interno bruto (PIB) do país.

O Brasil também apresenta um coeficiente de Gini superior ao nível que a ONU considera de alerta, com 0,5 (53%), mas que se manteve inalterado durante a última década. A dívida às instituições de Bretton Woods ascendem a 15,6 mil milhões de dólares (cerca de 14,5 mil milhões de euros).

E Moçambique registou uma melhoria de 7%, entre 2010 e 2019, mas para 0,5 pontos (50,4%), um valor ainda elevado.

A dívida moçambicana ao FMI e ao Banco Mundial ascende a 516,8 milhões de dólares (cerca de 482 milhões de euros). Segundo o Ministério da Economia e Finanças de Moçambique, a dívida do país cresceu 5,2% em 2023, face a 2022, para 15.217,7 milhões de dólares (cerca de 14.307 milhões de euros), o equivalente a 73% do PIB.

Em Cabo Verde, o índice de Gini caiu 10%, mas mantém-se acima dos 0,4 pontos (42%).

Na Guiné-Bissau caiu 12%, para 0,3 pontos, enquanto em Timor-Leste subiu 3%, mas para um nível inferior a 0,3 pontos (29%). Nestes dois países, no entanto, os rendimentos são baixos e as taxas de pobreza elevadas.

A Oxfam defende que metade dos países elegíveis para acederem a subvenções ou empréstimos a juros baixos da Associação Internacional de Desenvolvimento (IDA) do Banco Mundial estão sobreendividados e precisam de que cerca de 45% da sua dívida seja cancelada.

Nas reuniões de primavera, o Banco Mundial alertou que a disparidade de rendimentos entre os países mais ricos e os mais pobres do mundo estava a aumentar pela primeira vez neste século.

No seu relatório A Grande Reversão: Perspetivas, Riscos e Políticas nos Países da AID, o banco analisou as oportunidades e os riscos enfrentados pelos 75 países elegíveis para subvenções e empréstimos a juros zero ou baixos — a maioria em África –, constatando que, entre 2020 e 2024, os rendimentos médios per capita em metade dos países da AID – a maior percentagem desde o início deste século – têm crescido mais lentamente do que os das economias ricas. Uma em cada quatro pessoas nos países da AID vive com menos de 2,15 dólares por dia.

“O mundo não pode dar-se ao luxo de virar as costas aos países da AID”, afirmou Indermit Gill, economista-chefe e vice-presidente sénior do Grupo Banco Mundial.