Marcelo Rebelo de Sousa pediu que o encontro realizado esta quinta-feira no Centro Cultural de Belém (CCB), com os presidentes dos PALOP e também o de Timor Leste, para assinalar os 50 anos do 25 Abril, “seja para olhar o futuro”.

“Hoje, no meio século do 25 de Abril, agradeço em nome de Portugal aos presidentes João Lourenço (Angola) José Maria Neves (Cabo Verde),Umaro Sissoco Embaló (Guiné-Bissau), Carlos Vila Nova (São Tomé e Príncipe) e José Ramos Horta (Timor) a honra da sua presença fraternal, solidária e gratificante neste encontro de futuro”. E salientou: “Sim de futuro é este encontro”.

E acrescentou: “Do passado colonial, guardamos todos as memórias e as lições que nos hão de guiar no futuro. Do passado livre dos últimos 50 anos, retiramos a inspiração para irmos mais longe na afirmação da força do nosso futuro na língua, na cultura, na ciência, no Estado de direito, na sociedade, na economia, na diplomacia da paz, do desenvolvimento sustentável, da luta contra a pobreza, da ação climática, do respeito pelo direito internacional, os direitos humanos, do multilateralismo, do universalismo”.

Marcelo Rebelo de Sousa, um discurso bastante breve, terminou com “vivas” a todos os países que foram colónias de Portugal. “Via o 25 de Abril, vivam as pátrias e os povos irmãos”, disse.

Dois dias após ter defendido restituições e indemnizações às ex-colónias portuguesas num jantar com jornalistas estrangeiros – o que lhe valeu duras críticas do Chega, Iniciativa Liberal e CDS – o Presidente da República ignorou por completo o assunto perante os seus homólogos de Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, e Timor-Leste.

Mesmo depois de uma ministra brasileira ter falado do assunto ontem, nenhum dos Presidentes africanos aflorou o tema das indemnizações pela escravatura ou a restituição de obras de arte.

 

João Lourenço

Antes de Marcelo intervieram os presidentes dos países convidados, com destaque para o presidente de Angola, João Lourenço, que falou em primeiro lugar, tendo salientado: “A revolução de Abril inaugurou uma nova fase da história da nação portuguesa que conseguiu estabelecer nos anos que se seguiram uma democracia criativa, vibrante e inclusiva, capaz de manter relações fraternais com as suas antigas colónias assentes na partilha de um património linguístico, histórico e cultural comum”.

João Lourenço terminou com um convite aos chefes de Estado da CPLP para no próximo ano se deslocarem a Angola para as comemorações dos 50 anos da independência do país.

 

José Maria Neves

Segui-se a intervenção do José Maria Neves, presidente de Cabo Verde, salientando “o impacto do 25 de abril ultrapassou as fronteiras de Portugal”.

“É tempo de pensarmos agora nos nossos sonhos para os próximos 50 anos”, pediu o chefe de Estado africano, tendo frisado que no “dealbar do século XXI há um sentimento de que a democracia está a ser carcomida, com fortes ameaças”.

José Maria Neves considerou ainda que a globalização tem contribuído para o “aumento” das desigualdades e alertou para o sistema político mundial onde “os consensos são cada vez mais difíceis”.

O líder africano acusou ainda a “manifesta incapacidade dos governos de responder às exigências da sociedade civil” e que os eleitores estão “cada vez mais céticos” sobre a saúde das suas democracias.

José Maria Neves referiu-se às novas “teses negacionistas e discurso do ódio” que têm mais influência “onde as instituições são mais débeis”, que causam um “notório desencanto e degenerescência dos partidos tradicionais”.

Terminou alertando que “há que pensar como proteger a democracia”.

 

Umaro Sissoco Embaló 

O presidente da Guiné Bissau Umaro Sissoco Embaló  recordou o líder histórico do país, Amílcar Cabral, assassinado em 1973.

Na revolução “nada foi fácil”, assumiu o chefe de Estado guineense.

Sissoco Embaló recordou que há 50 anos, quando se deu o 25 de Abril, o “povo guineense em luta – dirigido pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) de Amílcar Cabral – já tinha proclamado unilateralmente a sua própria independência nacional, o seu próprio Estado” e este “evento histórico relevante” em 24 de Setembro de 1973, foi reconhecido “por uma larga maioria” dos membros da ONU.

“A evocação da Revolução portuguesa do 25 de Abril convoca imediatamente para uma reflexão conjunta das lutas de libertação nacional dos nossos povos”, disse Embaló, sublinhando a ocorrência de “dois processos históricos que se cruzavam”.

Estes dois processos, disse, “tinham em comum uma mesma aspiração”, liberdade e libertação nacional, pelo que não foi “de estranhar que uma convergência estratégica – entre os combatentes contra o Império e os combatentes contra a ditadura – começasse a ganhar, pouco a pouco, maior densidade, maior força”.

 

Filipe Nyusi

Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi discursou em seguida e abordou um tema sensível nas relações com Portugal. Descreveu os massacres como o de Wiriyamu como “indesculpáveis”.

Nyusi referia-se ao ataque à população civil da província de Tête, alegadamente praticados por soldados portugueses em dezembro de 1972.

O líder africano salientou que se “tratam de atos praticados durante a guerra e que nunca foram atribuídos ao povo português”, mas que são “indesculpáveis”.

Nyusi pediu que se encarem os factos históricos com “honestidade” e sem “revisionismos”, apelando para que não se esqueça “nunca a contribuição” dos povos africanos no 25 de abril.

Deixou ainda o desafio para que nas escolas e no espaço da lusofonia “se ensine a verdade”.

O líder de Moçambique assinalou ainda que a presença dos chefes de Estado dos PALOP é um “tributo” aos capitães de abril que puseram fim a um regime que “subjugava os nossos povos”, concluindo que aprecia “os líderes da nova geração portuguesa”.

De registar que a sensível situação de terrorismo na província de Cabo Delgado no norte de Moçambique ficou ausente do discurso do chefe de Estado africano.

 

Carlos Vilanova

Carlos Vilanova, de São Tomé e Príncipe, lembrou a música:

“O perfume da liberdade era intenso através da música, Zeca Afonso e outros interpretes aqui e d’alem mar. Era Portugal pôs-se do lado certo da história”, afirmou o presidente são-tomense na cerimónia de Marcelo Presidente de Sousa com os seus homólogos dos PALOP, no CCB.

 

José Ramos-Horta

O Presidente da República de Timor-Leste, José Ramos-Horta, considerou que Portugal soube reconhecer a derrota colonial e que a reconciliação com os países vencedores aconteceu rápida, imediata e naturalmente.

“Os portugueses souberam reagir às mudanças sem ódio nem vinganças, sem fuzilamentos, sem guerra civil, aceitaram as independências e lutaram connosco pelo longínquo Timor”, disse Ramos-Horta durante a sua intervenção na cerimónia de comemoração dos 50 anos do 25 de Abril, que juntou todos os presidente dos países africanos lusófonos em Lisboa.

Na intervenção, Ramos-Horta fez a distinção entre o Portugal antes da revolução, “asfixiado e isolado”, com o país que se seguiu, exclamando: “Quanto mudou para melhor, para muito melhor, em todas as vertentes!”.