Há segredos ancestrais do artesanato português que são transmitidos oralmente ao longo de gerações e gerações e que correm o risco de perder-se. Para combater essa perda de memória e herança, a Direção Geral das Artes criou o Programa Nacional Saber-Fazer, que tem como objetivo salvaguardar e reconhecer o sector das artes e ofícios tradicionais, através da criação de um repositório digital com informação sobre a produção artesanal nacional, a organização de laboratórios e workshops e ainda a dinamização de atividades pedagógicas que valorizem as técnicas tradicionais.

Uma dessas atividades passa por levar a arte dos palitos de Lorvão e do bracejo até à Rio Artes Manuais, feira internacional de artesanato do Rio de Janeiro, entre 24 e 28 de abril, no Rio de Janeiro, a convite da Secretaria de Estado da Cultura e Economia Criativa do Estado do Rio de Janeiro.

Fátima Lopes é a única mulher artesã que se dedica a tempo inteiro a fazer palitos decorativos de Lorvão. Isabel Martins cria peças a partir do bracejo, uma fibra vegetal, recuperando uma técnica ancestral. São estas as duas artesãs, guardiãs desses segredos com séculos de história, transmitidos de geração em geração, que vão representar Portugal no Brasil.

“Aprendi a fazer os palitos de flor com a minha mãe, que por sua vez foi ensinada pela minha bisavó. Já sou a quarta geração da família a dedicar-se a trabalhar a madeira do salgueiro com a ajuda de uma navalha”, explica Fátima Lopes, vencedora de dois prémios na final regional do concurso World Food Gifts Challenge.

A arte de trabalhar a madeira de salgueiro corre na família de Fátima desde o início do século passado, quando a sua bisavó começou a fazer palitos de flor. Fátima aprendeu a trabalhar a madeira com a mãe, com mais ou menos 12 anos. O marido João corta os salgueiros e choupos que crescem nos seus terrenos à beira-rio e que fornecem a matéria-prima para fazer os tradicionais palitos.

Acredita-se que a origem dos palitos de flor vem do Mosteiro de Lorvão, no concelho de Penacova, onde as freiras começaram a esculpir pedaços de salgueiro em pequenas tiras para decorar os doces conventuais.

Isabel Martins cria peças feitas a partir do bracejo, fibra vegetal com a designação científica Stipa gigantea, que cresce espontaneamente na serra da Malcata, onde vive. Depois de apanhada e seca, é trabalhada em espiral cosida, recuperando uma técnica ancestral utilizada em cestaria. Para além de peças decorativas, tenta criar peças úteis para o dia-a-dia.

As duas artesãs acreditam que a ida ao Brasil serve para preservar o artesanato português e as suas práticas ancestrais, já com vários séculos de história.

“Esta é uma forma de promover o quer é nosso e que já quase ninguém faz. É preciso mostrar às novas gerações que se podem fazer coisas úteis e bonitas só com aquilo que a natureza nos dá. As matérias-primas que utilizo sou eu quem as vai recolher campo. É um ofício amigo do ambiente”, defende Isabel Martins. “Tenho 66 anos, tenho ensinado este ofício a algumas pessoas, mas quase todas elas têm a minha idade. Esta ida ao Brasil pode ajudar a promovê-lo junto das novas gerações”.

“A ida ao Brasil é um reconhecimento e uma oportunidade para dar a conhecer este ofício com séculos de história”, acrescenta Fátima Lopes.