Portugal “está na liderança” da execução dos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), garantiu nesta semana a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, reforçando a ideia com o facto de sermos um dos dois países que já avançaram com o quarto pedido de pagamento junto de Bruxelas.

Mas é verdade que a execução está a correr bem? A teoria diverge… a começar pelas empresas, que continuam a queixar-se do atraso no recebimento dos fundos, e a acabar nos 713 milhões de euros que Bruxelas travou em dezembro porque as reformas exigidas como contrapartida, com as quais o governo se comprometeu, não estavam feitas. Valor que continua retido pela Comissão.

31 de agosto de 2026 é o prazo estabelecido por Bruxelas para o cumprimento dos objetivos do PRR, sendo 31 de dezembro de 2026 o dia limite para a execução dos fundos.

Os factos

Até dia 1 de fevereiro, conforme revela uma análise comparativa do Financial Times, Eslováquia (99,55% de 2,7 mil milhões de euros), França (58,07% de 40,3 mil milhões) e Itália (52,72% de 102,5 mil milhões) compunham o top três dos países com maior percentagem de alocações financeiras recebidas do PRR. Portugal surge em quinto lugar (depois da Grécia), mas com pouco mais de um terço dos fundos (34,99%) recebidos: 7,77 mil milhões dos 22,2 mil milhões atribuídos ao país.

Mas há mais problemas. No final do ano passado, Bruxelas aprovou o terceiro e o quarto pedidos de desembolso, mas reteve parte dos fundos porque as reformas exigidas, que deviam ter avançado entre julho de 2022 e de 2023, estavam por cumprir. Foi o único país em incumprimento e os três marcos e metas em falta, respeitando reformas na saúde e mudanças nas ordens profissionais, custaram ao país cerca de um quarto dos 3170 milhões que deviam ter chegado ainda no ano passado. O pagamento destes 713 milhões (a fundo perdido) retidos devia ser pedido neste mês, tal como a quinta tranche, de 2.775 milhões, mas a queda do governo e consequentes eleições voltaram a atrasar o calendário. E não é certo que o dinheiro entre, visto que pouco mais de metade dos objetivos impostos para este desembolso estão garantidos. Ao Público, a ministra da Presidência assumiu já neste mês ser provável o resvalar do cumprimento de pelo menos três dos 28 marcos que deviam estar assegurados no fim de março – reorganização de Ministérios, incentivos ao mercado de capitais e parte da barragem do Crato, segundo a mesma publicação, que antecipa que até uma dúzia destes marcos e metas podem atrasar.

Além dos desembolsos de Bruxelas, importa olhar o ritmo a que o dinheiro está a chegar aos beneficiários – e que também tem ficado aquém do desejado. De acordo com o relatório semanal de monitorização do PRR, do total de 22,2 mil milhões previstos, chegaram ao país 7,77 mil milhões (os tais 34,99%). Mas só cerca de metade já está em campo: 4.073 milhões, dos quais 1,5 mil milhões entregues às empresas privadas (de 6 mil milhões aprovados), outros 3,5 mil milhões às diferentes entidades públicas.

A conclusão

Não só Portugal não está entre os campeões, sendo quinto na lista, como a percentagem de execução do PRR aqui corresponde, neste momento, a menos de 35%. E destes, só 18% do dinheiro que Bruxelas já desembolsou foram ainda pagos aos beneficiários finais.

Portugal é ainda o único país a ter visto, em dezembro, parte dos terceiro e quarto cheques retida por incumprimento das metas (713 milhões) e arrisca-se a voltar a não cumprir o compromisso que lhe permitiria receber o quinto cheque, uma vez que os marcos e metas exigidos até fim de março atrasaram.

Artigo publicado na edição do NOVO de 23 de março