São 14 os antigos advogados que esta tarde de quinta-feira vão ser condecorados pelo Presidente da República com a Ordem da Liberdade Grau de Grande Oficial. A proposta partiu da Ordem dos Advogados (OA) em reconhecimento pela “coragem” em defender nos Tribunais Plenários os homens e mulheres que eram presos por se oporem ao regime politico fascista então vigente.

“Exercer a advocacia, naquele tempo, em que punham em risco a própria liberdade, a perda da vida, a ofensa à integridade física, incluindo a de familiares e amigos, revela uma enorme coragem que não é atributo de todos”, disse ao NOVO a bastonária da OA, sublinhando: “Quem a tem a coragem, de forma altruística e despojada, de lutar pela liberdade é digno de homenagem e de todas as honras”.

Para Fernanda de Almeida Pinheiro, “se hoje exercemos uma advocacia livre e temos assegurados os direitos, liberdade e garantias das pessoas – não totalmente observados, mas de uma forma completamente diferente do que era há 50 anos -, também o devemos principalmente aos advogados porque não calam, porque recorrem, porque interpõem ações, porque lutam pelos interesses dos cidadãos e das empresas deste país”.

Marcelo Rebelo de Sousa vai esta tarde condecorar os antigos advogados Amadeu Lopes Sabino, Antonio Cortés Simões, Delgado Martins, Joaquim Cavaqueiro Mestre, Jorge Santos, José Biscaia Pereira, José Carlos de Vasconcelos, José Coelho Alves, José Vera Jardim, Levy Baptista, Lopes de Almeida, Macaísta Malheiros, Monteiro Matias e Saúl Nunes.

A “OA esteve sempre na primeira linha na defesa dos seus advogados/as e na defesa dos presos políticos”, diz Fernanda de Almeida Pinheiro, salientando que “no ano do celebração do 50.º aniversário dos 25 de Abril de 1974 nunca é demais homenagear estes advogados/as”. “Homenagem que representa uma passagem de testemunho para as novas gerações, no sentido de preservar a memória colectiva de resistência à ditadura e dignificar a luta pela liberdade e democracia”, acrescentou.

Na terça-feira, assinalando os 50 anos do 25 de Abril, a OA prestou homenagem a todos os políticos presos pelo antigo regime. A bastonária Fernanda de Almeida Pinheiro, na parte da manhã, esteve no Estabelecimento Prisional de Caxias, em Oeiras, onde depositou uma coroa de flores em memória dos que foram perseguidos por pretenderem exercer o direito a oporem-se ao regime político vigente entre 1932 e 1974. Na parte da tarde, já na sede da instituição, em Lisboa, a OA homenageou a título póstumo a mulher-advogada que mais políticos defendeu em tribunal plenário: Maria Lucília Miranda Santos. A homenagem estendeu-se a outros que também passaram muitas horas nos Tribunais Plenários a defenderem os da “oposição”.

Os Tribunais Plenários, criados em 1932, deram cobertura à arbitrariedade e à violência do Estado Novo, e deram “corpo àquilo a que alguém chamou o fascismo de toga”.

“O comportamento dos juízes do Tribunal Plenário era particularmente complacente para com os agentes da PIDE, permitindo que ocupassem a sala de audiências à vontade, de modo a impossibilitar a presença de assistentes, ao mesmo tempo que impediam que os réus denunciassem as condições preparatórias do processo sob prisão ou que afirmassem as suas convicções.

Diz Alexandre Babo, Advogado e testemunha de defesa: “No Plenário de Lisboa muitas vezes os réus eram espancados pelos agentes da PIDE, durante os julgamentos e arrancados dali à força, quando exigiam apresentar as suas razões. E isto com a aquiescência dos juízes que constituíam o Tribunal”.

Os juízes do Plenário foram ainda frequentemente grosseiros e prepotentes em relação aos Advogados de defesa, condicionando a sua atuação, multando-os e chegando mesmo a determinar o seu julgamento sumaríssimo, como aconteceu com Manuel João da Palma Carlos em 23 de abril de 1957, foi preso em pleno tribunal e condenado por responder aos juízes nos seguintes termos: “Julguem Vossas Excelências como quiserem, com ou sem prova, mas o que não podem é deixar de consignar em ata tudo quanto na audiência se passar”. Estas palavras valeram-lhe sete meses de prisão e um ano de privação dos direitos políticos.

A última sessão de julgamento do Tribunal Plenário, adiada por impossibilidade de comparência dos réus, teve lugar na manhã de 25 de Abril de 1974. A democratização provocou alterações profundas na estrutura orgânica da Justiça. Os Advogados e Advogadas mantiveram-se sempre fiéis aos seus princípios a defesa dos direitos, liberdades e garantias, pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e instituições jurídicas.