O juiz da “operação influencer” considerou contraditória e vaga a tese do Ministério Público de que os arguidos Diogo Lacerda Machado e Vitor Escária tentaram pressionar António Costa com vista à aprovação de um decreto-lei favorável à sociedade Start Campus.

Esta argumentação do juiz de instrução criminal Nuno Dias Costa consta da sua resposta ao recurso do Ministério Público, a que a agência Lusa teve acesso, a contestar as medidas de coação aos cinco arguidos detidos, nenhuma privativa da liberdade, aplicadas pelo magistrado no interrogatório judicial.

Na tese do Ministério Público, alguns suspeitos recorreram a Diogo Lacerda Machado, advogado e amigo de António Costa, “no sentido de contactar, direta ou indiretamente, o primeiro-ministro, com vista a pressionar” a secretária de Estado Ana Fontoura Gouveia e “visaram – e lograram – que o referido decreto-lei fosse aprovado e publicado o mais rapidamente possível e com o conteúdo normativo favorável aos interesses da Start Campus”.

Para o juiz, as alegações do Ministério Público são vagas “quanto a qual seria a entidade pública junto de quem iria ser exercida a influência”, questionando se seria o governo, através de Diogo Lacerda Machado junto do primeiro-ministro, ou a secretária de Estado da Energia, através de Vitor Escária, chefe de gabinete de António Costa à data dos factos.

Considera também que os factos apontados pelo Ministério Público são contraditórios quanto à decisão pretendida, dado que os arguidos queriam pressionar Ana Fontoura Gouveia para aprovar um decreto-lei favorável aos interesses Start Campus, quando “a competência para elaborar decretos-lei cabe ao governo e não a uma secretaria de Estado”.

“Tal descrição é omissa no que tange à ilicitude [tráfico de influência próprio] ou licitude [tráfico de influência impróprio] da decisão pretendida”, sublinha o juiz.

Nuno Dias Costa criticou ainda o Ministério Público por, no recurso das medidas de coação aplicadas aos cinco arguidos, ter invocado novos factos que não apresentou no interrogatório judicial, reiterando que, à exceção dos factos que consubstanciam tráfico de influência e recebimento indevido de vantagem, que considerou estarem “fortemente indiciados”, os restantes factos apresentados pelo Ministério Público, “não preenchem os elementos típicos” de qualquer crime.

A operação levou à detenção de Vítor Escária, Diogo Lacerda Machado, dos administradores da empresa Start Campus Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, e do presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, que o juiz colocou em liberdade após interrogatório judicial.

Além destes, há outros quatro arguidos no processo, incluindo o agora ex-ministro das Infraestruturas, João Galamba, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o advogado, antigo secretário de Estado da Justiça e ex-porta-voz do PS João Tiago Silveira e a empresa Start Campus.

O processo está relacionado com a produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, Setúbal, e com o projeto de construção de um data center na zona industrial e logística de Sines pela Start Campus.

António Costa surgiu associado a este caso e foi alvo da abertura de um inquérito no Ministério  junto do Supremo Tribunal de Justiça, situação que o levou a pedir a demissão e Marcelo Rebelo de Sousa marcou eleições para 10 de março.