O analista Albino Pakisi considerou hoje que o tema das autarquias vai dominar a agenda política angolana em 2024, ano em que haverá mais pressão da oposição nas ruas e respostas mais duras do regime.

“Este tema das autarquias neste ano de 2024 vai dominar o debate nacional”, disse à Lusa Albino Pakisi, refletindo sobre os discursos dos líderes dos dois maiores partidos angolanos, MPLA e UNITA, que lançaram no sábado a sua agenda política para o corrente ano.

Os dois líderes partidários, João Lourenço, também presidente de Angola, e Adalberto Costa Júnior convergiram no tema e trocaram recados, com o presidente do MPLA a dizer que as autárquicas não devem ser exigidas nas ruas e sim na Assembleia Nacional, enquanto o presidente da UNITA propõe eleições autárquicas para 2024.

Para o analista, as eleições autárquicas são “uma urgência”, porque muitos administradores municipais [nomeados pelos governos provinciais] não realizam os anseios das comunidades.

Do discurso do líder da UNITA, realçou também as preocupações com a nova Lei da Segurança Nacional, porque prevê que os Serviços de Inteligência e Segurança do Estado possam desligar a internet e as comunicações quando convier, o que considerou “um perigo”.

“Vamos retroceder, João Lourenço não pode chegar a este ponto. Ele significou uma grande esperança em 2017, quando disse que não tinha medo da implementação de autarquias e de mais liberdade de expressão e da própria comunicação social”, criticou o comentador.

Albino Pakisi sublinhou que, à medida que vai erguendo as infraestruturas para as autarquias, o MPLA está também a preparar os seus quadros, salientando que a UNITA quer manter a pressão sobre o presidente angolano, porque sabe que este tem influência sobre o grupo parlamentar para a discussão e aprovação do pacote autárquico.

“No fim da linha, quem manda é o presidente da Republica”, disse, admitindo que há algum receio do MPLA em partir já para as autárquicas porque muitos administradores têm demonstrado incompetência e João Lourenço quer “preparar camaradas que não estejam viciados”.

“[O MPLA e João Lourenço] perceberam que há muita gente viciada que está na administração do Estado e pode perder com a UNITA, porque a UNITA tem mais rigor e mais disciplina partidária e tem mais pessoas honestas, porque a UNITA, na mata, aprendeu a não roubar e não se corromper, e penso que têm medo de perder muitas autarquias para a UNITA e oposição”, opinou, admitindo que o MPLA se está a preparar para implementar as autarquias em 2025.

Sobre a implementação em simultâneo da nova Divisão Política Administrativa, considerou que não interfere na realização das autarquias, porque estas deverão realizar-se de forma faseada.

“Penso que as duas coisas poderão ser feitas ao mesmo tempo”, disse.

Sobre as manifestações, que a UNITA já disse querer fazer este ano, enquanto o MPLA respondeu que as autarquias não se fazem nas ruas, Albino Pakisi considerou que “as coisas vão endurecer de um lado e do outro: do lado do governo, com a Lei da Segurança Nacional; do lado da UNITA, com mais protestos na rua”.

Realçou ainda que a UNITA tem de mostrar aos seus eleitores que não é igual ao MPLA, depois de ter aceitado os resultados das eleições de 2022, apesar de considerar que não foram transparentes nem justas, e de os deputados eleitos nas suas listas terem tomado os seus assentos na Assembleia Nacional.

“Em 2022, a UNITA não saiu à rua porque Adalberto foi aconselhado que haveria um banho de sangue e as tropas sairiam logo a seguir”, sublinhou. “Mas se, em 2027, a UNITA não sair à rua, como está a prometer, as pessoas vão dizer que a UNITA e o MPLA são a mesma coisa.”

Albino Pakisi falou ainda sobre os preços elevados e o descontentamento da população angolana, o que está a ser usado pela UNITA em seu favor.

“O MPLA pode pressionar com leis, pode pressionar com militares, mas se o povo todo sai às ruas, o MPLA não vai esmagar o povo todo, não vai ser sensato combater com o povo”, alertou, reforçando que o líder da UNITA “está a aproveitar o momento de fragilidade da governação do MPLA para jogar todas as cartas”.