A queima de combustíveis fósseis causa graves danos ao ambiente e à saúde. A principal causa das alterações climáticas é a utilização desta fonte de energia para a produção de eletricidade e calor. A substituição por fontes de energia renováveis, não geradoras de poluição atmosférica, permitiria salvar cerca de cinco milhões de vida por ano.

Os efeitos das alterações climáticas já se fazem sentir, bem como os seus impactos na saúde. Este ano foi o mais quente desde que há registos. O aumento das ondas de calor e da sua intensidade provoca um aumento da mortalidade, que atinge de forma desigual a população. Comunidades com menos recursos sofrem maior impacto das ondas de calor, com um aumento até 3% de mortalidade por cada 1 ºC de aumento de temperatura.

Como sempre, os piores efeitos são sentidos por quem já se encontra em pior situação. Cidades mais desiguais, com maior índice de Gini, assim como cidades com menor PIB, apresentam maior mortalidade quando são atingidas por ondas de calor. Estes são motivos mais do que suficientes para defender a ideia e acelerar a tomada de medidas que permitam uma transição energética que não deixe ninguém para trás.

Se nada for feito, estas desigualdades estão destinadas a aumentar, as alterações climáticas e a pobreza energética farão cada vez mais vítimas. É necessário investir em habitação de qualidade, na redução da poluição atmosférica, incentivar a utilização de transportes públicos e melhorar o planeamento das cidades.

É neste contexto que se realiza a COP28, no Dubai. Com cada vez mais evidência sobre o efeito dos combustíveis fósseis na degradação do clima e da saúde, seria expectável que fosse tomada uma posição clara em favor de uma transição energética. No entanto, as promessas e as declarações ficam muito aquém da necessidade e da urgência do momento.

Precisamos de incentivar os transportes públicos? Chegaram à COP28 dezenas de jatos privados. É necessária uma mensagem inequívoca a favor de uma redução das emissões? Responsáveis do emirado, um dos maiores produtores de combustíveis fósseis, referem que não há certezas sobre a necessidade de uma transição energética. Precisamos de ação política? Políticos influentes fazem compromissos com a indústria que atrasam o cumprimento de metas.

O clima e a saúde deterioram-se, enquanto a indústria acumula lucros recordes e obscenos. Na agenda para a COP28 encontrava-se um acordo mundial para a redução da utilização de combustíveis fósseis. Falhou, por oposição dos países produtores. Fomos ingénuos em pensar que os interesses de curto prazo seriam vencidos pela vontade de deixar um mundo melhor para o futuro. Fica claro que a escolha de um país produtor para receber a COP28 foi tudo menos inocente e que a indústria é a principal vencedora da cimeira. Perde o clima e a saúde. Perdemos todos.

Temos a obrigação moral e política de construir um ambiente promotor de saúde. Para tal, é necessário ter respostas à altura. Não podemos andar preocupados com a doença e mortalidade causadas pela poluição atmosférica e não investir em transportes públicos ou ciclovias. É incoerente levantar a questão do excesso de mortalidade durante ondas de calor para depois bloquear a transição energética ou a construção de habitação digna e eficiente.

A saúde deve estar em todas as políticas. Combater as alterações climáticas significa lutar por uma melhor saúde para todas e todos nós. Devemos fazer o nosso caminho, mesmo que não tenha sido possível ter o tão desejado acordo no Dubai.

Enfermeiro, Urgência Pediátrica e coordenador da Unidade Saúde Pública Hospitalar do Hospital Fernando Fonseca