O governo vai colocar a Estamo, empresa que concentra ativos imobiliários do Estado avaliados em cerca de mil milhões de euros, sob alçada partilhada das Finanças e do Ministério das Infraestruturas e Habitação (MIH). Esta dupla tutela, até agora nas mãos do Ministério das Finanças, tem por objetivo “colocar muito do património do Estado ao serviço das populações”. A revelação foi feita ao Jornal Económico por Miguel Pinto Luz, que considera “fundamental” aumentar a oferta, sinalizando que, nas próximas duas a três semanas, o executivo irá apresentar medidas na Habitação, após este primeiro sinal para desenvolver uma política pública no sector que incide na orgânica do governo, ao colocar a Estamo numa tutela partilhada.

“A passagem da coordenação da Estamo S.A. para a Habitação é agilizar o uso dos imóveis do Estado a favor das políticas públicas de habitação. É uma mudança clara de paradigma na forma como o atual governo da AD quer gerir o património do Estado e que diz bem da ambição que este governo coloca na área da habitação”, revelou o governante ao Jornal Económico, à margem do Special Report – Desafios do Imobiliário em 2024, que decorreu nesta terça-feira, em Lisboa, organizado pelo Jornal Económico.

Segundo Miguel Pinto Luz, em termos práticos, com a dupla tutela na Estamo, “o Ministério das Infraestruturas e Habitação terá o poder de olhar para o portefólio da Estamo e de, em conjunto com as Finanças, selecionar os imóveis que mais se adaptam a implementar uma política pública de habitação de qualidade”.

Já durante o evento organizado pelo Jornal Económico, o ministro das Infraestruturas e Habitação tinha sinalizado que a nova orgânica do governo coloca a Estamo sob uma dupla tutela das Finanças e da Habitação, realçando o desafio de “desenvolver uma política pública de habitação verdadeira, duradoura e transformadora”. O ministro antecipou ainda que “nas próximas duas a três semanas, o governo apresentará as medidas que considera fundamentais na habitação”.

Recorde-se que a Estamo substituiu a Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) na gestão dos imóveis públicos, por determinação do executivo socialista, em julho do ano passado, mas a tutela manteve-se apenas nas mãos do ministro das Finanças, sem vocação para a promoção das políticas públicas para a habitação.

Em causa está o decreto-lei que fixou o novo modelo de gestão integrada do património imobiliário público, ou seja, todos os imóveis do domínio privado do Estado e da administração indireta do Estado.

Na prática, a Estamo passou a desempenhar as competências que até então eram exercidas pela DGTF em matéria de gestão de património imobiliário público, para permitir uma “atuação integrada e mais focada numa gestão profissional”. Mas o Ministério das Finanças continuou a manter a tutela da empresa de capitais exclusivamente públicos criada com a finalidade de assegurar a administração de património imobiliário da esfera pública.

O anterior governo sinalizou que este novo modelo de gestão para o património imobiliário público visava “recentrar a atuação da DGTF em torno das suas missões nucleares, reforçando a sua capacitação no âmbito das operações de intervenção financeira do Estado, do acompanhamento das matérias respeitantes ao exercício da tutela financeira do sector público administrativo e empresarial e da função acionista do Estado”.

De acordo com este diploma, a gestão integrada do património imobiliário público passou a ser desenvolvida pela Estamo no quadro das orientações a fixar por despacho do primeiro-ministro, sob proposta do membro do governo responsável pela área das Finanças, “de forma a assegurar a permanente subordinação daquela atividade a objetivos de estrito interesse público”.

O decreto-lei atribuiu, no ano passado, à Estamo o direito de preferência em caso de alienação ou constituição de outros direitos reais sobre imóveis de entidades públicas pertencentes à administração indireta do Estado e ao sector empresarial do Estado, quando estes não se encontrem sob sua gestão.

Nas competências fixadas no diploma passou a estar previsto que os bens imóveis do domínio privado do Estado possam ser arrendados mediante autorização do membro do governo responsável pela área das Finanças — um processo de seleção de imóveis que passará agora também a ser partilhado com o MIH.

Recorde-se também que o anterior executivo determinou a parceria entre a Estamo e o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) no Programa Arrendar para Subarrendar (PAS), uma das medidas inscritas no pacote Mais Habitação para aumentar o número de casas no mercado de arrendamento. A medida destina-se a arrendar imóveis e posteriormente subarrendá-los às famílias a preços acessíveis.

Apoio dos autarcas na questão do licenciamento é uma das soluções para a habitação

 No evento organizado pelo JE, o ministro das Infraestruturas e Habitação destacou ainda quatro medidas que considera fundamentais para resolver os problemas da habitação no país: a promoção própria e a transformação da Parque Escolar para construção pública; a ausência de preconceitos ideológicos para com o sector privado; o apoio dos autarcas na questão do licenciamento; e o revisitar das cooperativas.

“Sabemos que as políticas implementadas nos últimos anos não resultaram. Houve uma preocupação de encontrar culpados e de virar uns contra os outros. Não contem connosco para o passa-culpas. Estamos à procura de eficácia para permitir a oferta para os jovens”, afirmou, realçando que o país não pode ter a ilusão de que a crise da habitação se resolve de um dia para o outro.

Mais Habitação e Simplex serão revisitados

“Temos de encontrar soluções em conjunto. É fundamental aumentar a oferta”, realçou Miguel Pinto Luz no encerramento do Special Report – Desafios do Imobiliário em 2024, organizado pelo JE, onde antecipou que o novo executivo vai apresentar “medidas transformadoras” nas próximas semanas. “Iremos revogar as medidas que consideramos serem injustas, nomeadamente o alojamento local. Iremos dialogar com as autarquias e investidores a revogação do arrendamento forçado, que iremos implementar no mais breve espaço de tempo”, acrescentou.

Miguel Pinto Luz anunciou ainda que o governo vai olhar para o Simplex e perceber o que pode melhorar: “É normal que num processo inovador existam obstáculos. Iremos atuar a curto prazo num gargalo gritante do PRR. Temos de melhorar o sistema nas suas diferentes vertentes. O IHRU tem sido a nossa preocupação com tudo o que tem a ver com o PRR.”

A finalizar, o ministro deu também conta da necessidade de alterar a política fiscal, nomeadamente para o segmento da juventude, e de debater o novo código da construção e alinhar expectativas do mercado a vários públicos-alvo. “O sector tem de falar olhos nos olhos e perceber as necessidades dos vários segmentos”, salientou.