Ainda não foi desta. Os procuradores do caso EDP/CMEC – em que se investiga suspeitas de corrupção e participação económica em negócio em torno das rendas excessivas da energia (os chamados CMEC – Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual) – receberam da Procuradoria-Geral da República (PGR) mais um aval positivo para o adiamento da dedução da acusação. Assim, o processo que deveria ter conhecido um despacho final de encerramento de inquérito a 30 de abril, prazo esse que foi depois prorrogado até 30 de junho, tem agora afinal de ser concluído até 30 de setembro. Carlos Adérito Teixeira, vice-procurador-geral da República, concordou uma vez mais com o prolongamento do prazo pedido pelos procuradores Carlos Casimiro Nunes e Hugo Neto. Os magistrados que lideram a investigação consideram que é preciso não correr riscos e não usar provas que venham a ser declaradas nulas.
“Pese embora o longo tempo de pendência da investigação, reconhece-se, mais uma vez, a necessidade de conjugar as exigências dos direitos dos investigados. Não podemos, contudo, deixar de enfatizar que o inquérito deve ser objeto de despacho de encerramento com a maior brevidade, devendo imprimir-se a devida e adequada celeridade”, diz o vice-PGR em despacho datado de 28 de junho.
Mas afinal, por que razão a conclusão deste inquérito (que já dura há 12 anos) tem sido sucessivamente adiado?
Em condições normais, o despacho final de encerramento do inquérito que investiga as rendas excessivas da energia (os chamados CMEC – Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual) há cerca de 12 anos, já teria sido deduzido no final de abril, uma vez que o mesmo estava praticamente concluído. O que aconteceu foi que uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, num acórdão de fixação de jurisprudência, se transformou num volte-face que tem sido usado pelas defesas dos ex-gestores da EDP para tentar anular uma série de provas apreendidas pela investigação.
Em condições “normais”, a acusação teria sido deduzida no final de abril e estaríamos agora a assistir uma roda-viva de recursos para os tribunais superiores, com os arguidos a defenderem que a acusação teria usado prova proibida e o Ministério Público a defender o contrário.
Só que perante o anúncio de que o Ministério Público tencionava usar na mesma no despacho de acusação os emails apreendidos sem ordem prévia de um juiz, os antigos gestores da EDP jogaram por antecipação e recorreram ao juiz de instrução, Nuno Dias Costa, para alegar que se o fizessem os magistrados estariam a incorrer num crime de desobediência. Ou, por outras palavras, a fazer “um golpe de estado judiciário”. E os procuradores que lideram o inquérito decidiram então esperar.
Só que a resposta do juiz de instrução foi tudo menos clara, porque ao mesmo tempo que invocava a nulidade daqueles meios de prova (os emails apreendidos na sede da EDP e sem ordem do juiz de instrução) também vincava que o Ministério Público tem a sua autonomia. Os advogados dos arguidos resolveram então usar novamente este trunfo junto do mesmo magistrado. Alegam agora que se há uma série de emails apreendidos pela investigação que não podem ser usados porque não são válidos, também há uma série de outras provas que terão de ser anuladas pois só existem porque aqueles emails existiam. E, como tal, são provas “contaminadas”.
Sim, parece confuso, mas se tiverem existido inquirições que tiveram por base aqueles emails apreendidos na sede da EDP; ou até novas buscas que derivaram do que foi lido durante essa apreensão, nada disso poderá ser usado pela acusação, defendem os advogados de António Mexia e João Manso Neto. Caso um juiz venha a concordar com este entendimento, a tarefa do Ministério Público ficará ainda mais limitada. É por isso que o Ministério Público tem insistido na estratégia do “esperar para ver”: primeiro quer saber o que pode usar como prova, e só depois formular a acusação.
O processo EDP começou há 12 anos no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) precisamente com a investigação às chamadas rendas excessivas da energia e, à medida que foi sendo apreendida prova, foi derivando para outros caminhos. A primeira acusação a ser deduzida acabou por dizer respeito a Ricardo Salgado, Manuel Pinho e a sua mulher, Alexandra Pinho. A acusação foi deduzida em 2022 e, no mês passado, o julgamento chegou a um veredicto final, com o coletivo de juízes a condenar o ex-ministro da Economia a dez anos anos de prisão e o ex-presidente do BES a seis anos e três meses.
Na parte que ainda está “pendurada” à espera de acusação, António Mexia e João Manso Neto são arguidos desde 2017.