Telescópio espacial europeu Euclid vai fazer 50 mil observações planeadas por Portugal
Pela primeira vez, Portugal ocupa um lugar de destaque numa missão espacial da ESA, agência da qual é Estado-membro desde 2000.
O telescópio espacial europeu Euclid vai fazer durante seis anos de missão cerca de 50 mil observações de galáxias, um trabalho que teve no seu planeamento o Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA).
O IA lidera a participação portuguesa na missão da Agência Espacial Europeia (ESA) que lançará no sábado, dos Estados Unidos, se tudo correr conforme o previsto, o telescópio que irá explorar o lado escuro e desconhecido do Universo.
Pela primeira vez, Portugal ocupa um lugar de destaque numa missão espacial da ESA, agência da qual é Estado-membro desde 2000.
A colaboração de Portugal no Euclid começou em 2012 quando o país assinou um acordo multilateral com a ESA e restantes representantes de um consórcio formado para desenvolver, construir e explorar o telescópio espacial.
Desde então mais de 40 investigadores e alunos de mestrado e doutoramento portugueses têm estado a trabalhar na missão.
António da Silva, investigador do IA e professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), é o representante de Portugal na direcção do consórcio do Euclid.
À Lusa, o cosmólogo justificou a importância da missão espacial com a explicação de que “foi concebida para procurar respostas a perguntas científicas simples, mas verdadeiramente enigmáticas e de implicações profundas ao nível da Física fundamental, Cosmologia e Astrofísica”.
“Até hoje não conhecemos verdadeiramente como se distribuem as galáxias no Universo nem porque nos indicam que o Universo se está a expandir aceleradamente”, afirmou.
Segundo António da Silva, várias questões se levantam.
“Que mecanismos físicos provocam esta aceleração? Qual o papel da energia escura e da gravidade nessa expansão? Estará a Teoria da Relatividade Geral de Einstein correcta? E a matéria escura, o que é? Como se relaciona com os modelos de física de altas energias e partículas que procuram descrever o Universo logo após o Big Bang [teoria cosmológica sobre o desenvolvimento inicial do Universo]?”, enumerou.
Os cientistas estimam que a quase totalidade (95%) do Universo seja constituída por energia e matéria escuras, “componentes desconhecidas à luz da Física atual”, de acordo com o investigador.
Para “fazer luz” sobre o Universo escuro, o telescópio Euclid vai observar em detalhe, a 1,5 milhões de quilómetros da Terra, milhares de milhões de galáxias, sobre as quais a matéria e a energia escuras geram efeitos na sua estrutura, forma, distribuição, movimento e evolução.
O telescópio irá captar a luz visível, mas também invisível ao olho humano, de galáxias e enxames de galáxias, incluindo as mais distantes, formadas nalguns casos há 10 mil milhões de anos, quando o Universo dava “os primeiros passos” (o Universo terá 13,8 mil milhões de anos).
O Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço fez parte do grupo responsável pela elaboração do calendário do rastreamento do céu com as cerca de 50 mil observações do telescópio, determinando qual a região do céu que o Euclid irá observar a cada momento da missão.
Juntos, o IA e a FCUL produziram o ‘software’ que gera o cronograma das orientações do telescópio no espaço e os tempos de observação para o calendário da missão, que se estenderá até perto de 2030.
Após o lançamento do Euclid, o plano de observações será actualizado por uma equipa de apoio às operações de rastreio do céu, liderada por ambas as instituições portuguesas.
Todas as actualizações serão entregues regularmente à ESA para que o centro de operações de voo possa apontar o telescópio na direcção certa do que se pretende observar no espaço profundo.
O IA coordena ainda os grupos científicos que vão usar os dados obtidos para outros objectivos sem ser propriamente os da missão espacial e participa na coordenação de estudos de física teórica, lentes gravitacionais e enxames de galáxias.
“O grande número de galáxias e espectros obtidos vai constituir um legado, incluindo populações estelares de galáxias próximas, morfologias, massas, taxas de formação estelar, entre muitos outros parâmetros que são também muito valiosos em vários domínios da Astrofísica. Tudo isso torna o Euclid uma missão única e estruturante da ciência europeia, capaz de congregar os interesses das comunidades de Cosmologia, Astrofísica e Física fundamental”, sustentou António da Silva.
Ao fazer o mapeamento tridimensional do Universo, o mais amplo e exacto alguma vez feito ao longo do tempo e espaço, ao cobrir mais de um terço do céu e recuar até 10 mil milhões de anos, o telescópio “vai permitir caracterizar as propriedades dinâmicas das componentes escuras” do Universo e, com isso, abrir caminho ao desenvolvimento de “novos modelos de física de partículas e altas energias que entram nos modelos de evolução do Universo logo após o Big Bang e até ao presente”, segundo o especialista português.
Para António da Silva, tais descobertas “poderão não só vir a permitir revolucionar o entendimento” sobre a “fase crítica do Universo”, a do Big Bang, “como poderão ter implicações ao nível da Física fundamental” que é utilizada “nas mais variadas áreas do conhecimento”.