O ex-primeiro-ministro desejou “uma nova governação”, que rompa com as “políticas que degradaram o país” nos últimos oito anos, lideradas por um chefe de governo que fez “indecente e má figura” e a esquerda leu nas entrelinhas que um acordo PSD-Chega vinha a caminho. Mas é mesmo assim?

As críticas e a suposta ameaça
“O projeto do PSD é um projeto com o Chega”, afirmou a líder bloquista, Mariana Mortágua, colando o partido ao acordo feito pelo PSD Açores e André Ventura a Passos e Montenegro: “São a mesma família política e Ventura era protegido de Passos Coelho”, disse.

Na verdade, mesmo quando segurou o então candidato social-democrata à câmara de Loures, na sequência de afirmações sobre a comunidade cigana que mais tarde motivaram uma queixa-crime, Passos Coelho foi claro: “Eu estou tranquilo quanto àquilo que é a nossa posição, uma posição não racista, não xenófoba: o PSD nunca o foi, não o é e, atrevo-me a dizer, nunca o será”, afirmou o então líder social-democrata, um ano antes de Ventura se desvincular do PSD para fundar o Chega.

Montenegro recusa Ventura desde 2018
De notar é que conforme o discurso de André Ventura endureceu, várias figuras do PSD se demarcaram dele e das suas ideias. A começar pelo atual presidente, Luís Montenegro.

Ainda assim, também os comunistas e os socialistas veem nas palavras de Passos Coelho vontade de uma união de forças com o Chega. E acusam o atual líder social-democrata de não ser claro na sua posição.

A verdade é que Montenegro não se cansa de repetir que traça uma linha vermelha entre a sua bancada e a de Ventura. “Não é não”, tem dito o líder do PSD. E ainda nesta semana, confrontado com as declarações de Passos, reafirmou: “Eu já disse o que pensava, nem sequer preciso de repetir. Vou cumprir a minha palavra.”

O que disse Passos Coelho
Mas afinal, o que disse Passos revelava esse desejo de união de toda a direita, Chega incluído? Tire as suas conclusões. “Eu não tenho tido intervenção no espaço político nos últimos tempos, nem desejo ter. Cada um tem o seu tempo e este não me pertence (…) O que posso formular é um desejo sincero de que o PSD possa estar preparado para os tempos que aí vêm”, disse Passos Coelho. E continuou: “O país vai precisar de um governo que tenha não apenas um rumo bem definido mas que possa inspirar confiança às pessoas para inverter uma degradação extraordinária de uma parte muito significativa das políticas públicas, que são importantes para o crescimento da economia, para a geração de valor e para as pessoas. Da saúde à educação, habitação, até à segurança, (o país) degradou-se muito, portanto precisamos de um governo esclarecido, com rumo bem definido e força, ou seja, autoridade moral, para seguir uma política diferente. Isso vai depender das estratégias dos partidos e das condições que os portugueses ofereçam aos partidos que terão responsabilidade de governar. E espero que ambos tenham uma aguda consciência dos tempos que aí vêm e que seja possível fazer um governo com autoridade moral e força – que só pode ser dada pelos eleitores – para fazer o que for necessário. Espero que o PSD possa liderar essa fase nova. Espero que o país saiba identificar no atual governo responsabilidades graves no momento que vive o país.”