Apesar de o juiz de instrução Nuno Dias Costa ter decidido há uns dias que os emails apreendidos pelo Ministério Público numa busca à sede da EDP devem ser destruídos, porque quando foram apreendidos pelos procuradores estes não tinham a autorização prévia de um juiz, o Ministério Público está longe de encarar esta decisão como o fim do processo EDP/CMEC e vai mesmo continuar a usar aquelas mensagens de correio elétrico e deduzir a acusação já na próxima semana contra António Mexia, ex-presidente da EDP, Manso Neto, ex-presidente executivo da EDP Renováveis, e outras figuras que estiveram ligadas ao processo dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual, que ficaram conhecidos como as rendas excessivas da energia.

Depois de se concentrarem na formulação da acusação – num processo que começou há 12 anos -, e que estará inevitavelmente concluída até 2 de maio, os procuradores deverão recorrer da decisão do juiz de instrução para o Tribunal da Relação de Lisboa. Até porque existem dois entendimentos diferentes: enquanto a defesa de António Mexia entende que a decisão de Nuno Dias Costa determina que todos os emails apreendidos naquela busca devem ser anulados, ou seja, inutilizados em processo-crime, o Ministério Público entende que a decisão do magistrado Nuno Dias Costa protege apenas uma parte dos emails que visam Artur Trindade, ex-secretário de Estado da Energia, e que já não é arguido no processo EDP/CMEC pois o MP determinou a extração de certidões e que o seu caso iria continuar a ser investigado num inquérito-crime à parte.

Caso a Relação de Lisboa venha a concordar com a tese do Ministério Público, a prova que irá servir de base à acusação dos CMEC continuará protegida. E o que poderá vir a ser posto em causa mais à frente é mesmo uma possível acusação contra Artur Trindade.

Já se aquele tribunal superior for ao encontro da interpretação dos advogados de António Mexia, que defendem que o juiz determinou a destruição de todos os emails apreendidos naquela busca, o Ministério Público, ao que o NOVO averiguou, também entende que essa decisão não iria “mandar abaixo” a acusação dos CMEC/EDP. Isto porque, de acordo com informações recolhidas pelo NOVO, os procuradores irão introduzir na acusação (que terá mais de mil páginas) muitas outras provas que têm outras origens e proveniências, incluindo emails que vieram dos EUA e alegadamente servirão de prova de que a EDP deu um patrocínio à Universidade de Columbia, em Nova Iorque, em troca de Manuel Pinho ser o professor escolhido para ali dar aulas. Além disso, os procuradores do processo EDP não veem como poderão estes emails ser anulados quando estes já foram validados, depois da sua apreensão, pelo juiz Ivo Rosa.

Ou seja, para o Ministério Público a acusação que está a acabar de ser redigida não está consolidada nem alicerçada nos emails polémicos que agora o juiz de instrução mandou destruir.

E o que pode vir a acontecer no outro processo EDP, que já está na reta final do julgamento, e em que Manuel Pinho é acusado de ter beneficiado o Grupo Espírito Santo em troca de uma avença de 15 mil euros e outros bónus durante o tempo em que foi ministro da Economia de José Sócrates? Poderão as defesas dos arguidos tentar usar o mesmo argumento dos emails para invalidar o processo? Ao que o NOVO apurou, não, pois a maior parte dessa prova teve origem no processo BES.

A defesa de António Mexia recorreu ao juiz de instrução, depois de o Supremo Tribunal de Justiça ter redigido um acórdão de uniformização de jurisprudência que dava razão à sua tese. Nesse acórdão, aquele tribunal superior considerou que a apreensão de emails, independentemente de terem sido ou não lidos, deve ser sempre autorizada por um juiz de instrução criminal, dando razão a um recurso dos antigos gestores da EDP.

A decisão ameaça ser motivo de grande debate nos tribunais, mas os procuradores vão continuar a fazer finca-pé e a utilizar estes emails.

No centro da acusação dos CMEC estarão Manuel Pinho e António Mexia. A acusação irá defender que o antigo ministro só se tornou professor na reputada Universidade de Columbia, em Nova Iorque, depois de ter deixado o governo de José Sócrates, porque a elétrica nacional terá compensado o favor do ex-governante com um patrocínio de cerca de 1 milhão de euros àquela instituição americana.