Problemas legais de filho de Biden são “risco”, mas menos graves que os de Trump

Em causa estão duas contravenções (misdemeanors) fiscais, relativas ao não-pagamento de 100 mil dólares em impostos entre 2017 e 2018, dívida que entretanto o filho do presidente saldou.

Os problemas legais de Hunter Biden, cujo acordo judicial com procuradores foi revogado pelo Departamento de Justiça, acarretam riscos para a campanha do presidente, apesar de menos graves que os de Donald Trump, disse à Lusa a analista Daniela Melo.

“A curto prazo, este caso tem ocupado a Casa Branca e a equipa de campanha de [Joe] Biden (pai de Hunter Biden) com controlo de danos e distraído o público dos temas que interessam à sua campanha, tal como a economia, o abrandamento da inflação, etc.”, considerou a cientista política.

“A atenção mediática dada a este caso é sobretudo de uma natureza política, porque do ponto de vista legal trata-se, até agora, de uma acusação de crimes menores”, sublinhou.

Em causa estão duas contravenções (misdemeanors) fiscais relativas ao não-pagamento de 100 mil dólares em impostos entre 2017 e 2018, dívida que entretanto o filho do presidente saldou.

Hunter Biden tinha chegado a acordo com o procurador David Weiss, nomeado por Donald Trump e mantido na investigação por Joe Biden, segundo o qual se declararia culpado em troca de liberdade condicional e da suspensão de outra acusação relacionada com a posse de uma pistola Colt Cobra .38 durante 11 dias enquanto utilizou drogas.

As notícias do acordo inflamaram comentadores mais à direita, numa altura em que a maioria Republicana na Câmara de Representantes tem em curso várias investigações ao filho do presidente norte-americano.

Em julho, a juíza Maryellen Noreika, também nomeada por Trump, expressou dúvidas sobre o acordo e a audiência chegou ao fim sem resolução, com Hunter Biden a mudar para uma declaração de inocência nas contravenções fiscais.

A nomeação de Weiss como procurador especial num caso que já está a ser investigado há cinco anos aconteceu dois dias antes da quarta acusação a Trump, indiciado na Geórgia pela tentativa de subverter os resultados das eleições de 2020 com grandes eleitores falsos.

“O eleitorado que não segue os detalhes dos casos pode rapidamente chegar à conclusão de que é tudo ‘farinha do mesmo saco’”, apontou Daniela Melo.

Com o acordo desfeito, David Weiss pediu ao procurador-geral Merrick Garland para ser constituído procurador especial e este aceitou, estando em aberto novas acusações a Hunter Biden e a possibilidade de este ser julgado.

Para Daniela Melo, a substância do caso é pouca, mas a sua instrumentalização é séria.

“Este caso em nada se compara com a gravidade dos casos do qual Donald Trump é arguido”, indicou a politóloga. No entanto, referiu, “quem vê Fox News todas as noites pode acreditar, e as sondagens apontam isso, que a investigação a Hunter Biden é tão grave que poderá levar ao impeachment [destituição] do seu pai, o presidente Biden”.

A professora da Universidade de Boston referiu que a forma como o caso está a ser tratado nos meios à direita faz lembrar a investigação de Benghazi, que durou dois anos, custou 7 milhões de dólares, obrigou Hillary Clinton a testemunhar durante horas, mas não teve resultados concretos.

“Este escândalo tem ecos do caso Benghazi”, afirmou. “Uma tentativa por elementos do Partido Republicano e de toda a estrutura de apoio à campanha presidencial de Donald Trump, incluindo PAC [comités de ação política, veículos de usados para financiar ações de campanha], com a ajuda de meios de comunicação afetos à direita, de transformar um caso que até à data é fogo de palha num verdadeiro incêndio politico”.

A 9 de agosto, os congressistas Republicanos publicaram um memorando renovando as suspeitas sobre a conduta de Hunter Biden em negócios internacionais.

Do outro lado, nos canais mais associados à esquerda norte-americana, o caso está a ser enquadrado “como uma caça às bruxas”, continuou a analista.

Numa sondagem Reuters/Ipsos realizada em junho, antes da revogação do acordo extrajudicial, metade do eleitorado (50%) disse acreditar que Hunter Biden estava a receber tratamento preferencial por ser filho do presidente. E apenas um terço (34%) indicou que a acusação tinha motivações políticas.

Com Weiss nomeado procurador especial, um artigo no jornal informativo on-line Politico indicou que os aliados do presidente na Casa Branca criticam a pressão do Partido Republicano, que consideram pretender distrair das várias acusações a Donald Trump.

No entanto, também nos círculos Republicanos a nomeação de Weiss caiu mal, por considerarem que a intenção é proteger o presidente e empatar as várias investigações conduzidas pela maioria Republicana na Câmara dos Representantes.

“O que não podemos saber ainda é que tipo de efeito esta pressão mediática à direita poderá ter sobre o eleitorado nas eleições nacionais de 2024”, indicou Daniela Melo.

“Por exemplo, pode causar um efeito de falsa equivalência”, aventou. “Ou seja, a campanha de Donald Trump para a presidência poderá beneficiar do facto de as suas investigações e julgamentos acontecerem ao mesmo tempo das de Hunter Biden”.