Os arquitetos estão a votar para escolher quem os representará no próximo triénio entre dois candidatos a presidente do conselho diretivo Nacional da Ordem dos Arquitetos, entre a continuidade e a mudança.

O processo eleitoral para a Ordem dos Arquitetos (OA) já se iniciou, com os votos eletrónicos e por correspondência, e culmina com as assembleias eleitorais convocadas para 21 de setembro, entre as 15h00 e as 20h00, nas sedes das secções regionais.

A Lista C, de Gonçalo Byrne, tem uma candidatura conjunta a todos os órgãos nacionais e a todos os órgãos regionais de todas as secções regionais, com exceção das regiões autónomas e do Alentejo.

Gonçalo Byrne é o atual bastonário da Ordem dos Advogados. Desenvolve a atividade há 35 anos, de forma diversificada, desde o planeamento urbano ao desenho de espaço público e de edifícios, à gestão de projecto, desenvolvimento e sustentabilidade; é, também, docente universitário.

Em entrevista ao NOVO, o candidato elege a luta contra as baixas remunerações e maior capacidade de intervenção da OA no espaço público.

 

Que balanço faz do último mandato na OA e da evolução da profissão?

O mandato que agora termina começou em plena pandemia e nessa condição restrita decorreu durante mais de um ano e meio. Órgãos nacionais regionais tomaram posse em julho de 2020. Por decreto, a OA altera a orgânica, passando de duas para sete secções regionais. Se duas estruturas tinham necessariamente de redimensionar as suas estruturas, cinco novas secções regionais não tinham sede, não tinham recursos humanos nem recursos tecnológicos, mas tinham uma direção legitimamente eleita e sem meios para exercer as suas competências.

Hoje, com elevado orgulho, afirmamos ter sete secções devidamente implementadas, com sedes, com recursos humanos administrativos e técnicos, a trabalhar em rede. Partilhar recursos e cooperar foi, efetivamente, a única via possível. Ganhou a instituição. Ganharam os arquitetos.

Se só tivéssemos assegurado a reorganização interna da instituição e promovido a desejável política de proximidade com os membros em todo o território, já teríamos feito muito. São muitas as ações da Ordem dos Arquitetos. Nem todas igualmente valorizadas, nem todas igualmente visíveis, mas todas imprescindíveis.

Connosco, a OA passou a ser um agente ativo junto dos decisores políticos: propusemos a alteração da taxa de IVA de 6% em projetos de reabilitação, somos hoje parceiros da Secretaria de Estado da Habitação e da Agência para Modernização Administrativa na desmaterialização de procedimentos urbanísticos e lideramos o processo para a Uniformização de procedimentos, processo no qual estão envolvidas outras ordens profissionais e todas as principais associações do sector da construção.

Aquando da revisão do Código dos Contratos Públicos conseguimos o recuo do governo na generalização do concurso de conceção-construção, sempre na defesa da qualidade e de honorários justos na contratação de serviços de Arquitetura.

Contribuímos na revisão de todos os diplomas e propostas de Lei nas quais a Ordem foi chamada a pronunciar-se; contribuímos para a redação dos Bairros Saudáveis, para a visão estratégica do Plano de Recuperação Económica Portugal 2030 e no âmbito do PRR fomos à Assembleia da República reclamar verbas especiais para a reabilitação.

Demos o primeiro passo concertado para o Código da Edificação com a celebração de um protocolo com o SILUC na recolha e sistematização da legislação.

Pronunciámo-nos sobre a Lei das Ordens e ainda hoje estamos a trabalhar arduamente na alteração imposta pelo Governo ao Estatuto da Ordem dos Arquitetos na defesa justa dos atos próprios exclusivos e partilhados da profissão de Arquiteto.

Conscientes da crescente responsabilidade que é exigida aos Arquitetos, reforçámos o Seguro de Responsabilidade Civil, disponível gratuitamente a todos os membros, duplicando o capital seguro e ampliando as coberturas agora mais adequadas aos atos próprios exclusivos e partilhados da profissão.

Fomos exemplo na modernização da instituição, tendo unificado as plataformas de comunicação e alargado os serviços disponibilizados aos membros de forma desmaterializada.

Acompanhámos o momento e agenda política e marcámos o debate. Fomos voz presente e influente nos locais de decisão de matérias que dizem respeito à Arquitetura e Paisagem.

Uma Ordem que se quer consciente, não pode deixar de ser ativista.

Quais são os principais desafios que a profissão enfrenta?

Inverter a contínua desvalorização da profissão. A desregulação generalizada na prática de honorários excessivamente baixos, pouco transparentes e inferiores ao financeiramente sustentável, é indissociável das questões de instabilidade laboral vulgarizada. Temos de pugnar pela qualidade na contratação pública do projeto em vez da opção recorrente de seleção pelo menor preço.

Paralelamente, combater a iliteracia da sociedade sobre o que é um projeto de arquitetura e o trabalho do arquiteto.

É urgente convocar novamente todos a intervir na reivindicação de qualidade da cidade e do território, na qualidade de vida, na qualidade do edificado, na qualidade do ensino e no direito a uma prática digna da responsabilidade que lhe é atribuída.

Enfrentar a crise habitacional em conjunto com os demais profissionais do setor, como é o caso dos engenheiros. Os arquitetos possuem formação e competências técnicas adequadas para, com segurança, conceberem, desenharem, projetarem e implementarem o que venham a ser decisões necessárias para Portugal suprir as graves carências habitacionais existentes. Juntos temos de garantir que este momento de urgência se transforme numa oportunidade de requalificação das nossas cidades.

Quais são as principais propostas e objetivos para o novo mandato?

É da responsabilidade da OA conduzir as políticas de arquitetura e paisagem. Porque não pode haver investimento na qualidade do ambiente construído e dos sistemas naturais que o inscrevem, sem a criação de políticas que apoiem uma cultura de decisão democrática, consciente e informada. Em tempos de urgência, como aqueles que hoje se evidenciam, propomos, por um lado, ser uma voz ativa na esfera pública, identificando e debatendo questões emergentes, e, por outro, ser um agente interventivo na construção e coprodução de novas políticas, criando “rotinas” de comunicação com os decisores políticos, e endereçando documentação estruturada que possa contribuir para a revisão das políticas para a transformação do território construído e natural.

Os cinco laboratórios que propomos integrar na OA procuram, precisamente, criar circunstâncias privilegiadas de reflexão, discussão, ensaio e implementação de propostas inovadoras nos domínios da Educação, da Praxis, da Cidade e Território, da Habitação ao Habitat, e da Edificação, com o objetivo comum de gerar uma cultura para a qualidade.

Centrados em domínios de natureza distinta, os laboratórios constituem uma rede dinâmica de cooperação que tem na raiz a urgência da Arquitetura na comunicação com os agentes de intervenção do território e sociedade em geral; na construção de uma cultura qualificada do ambiente construído e não construído; e na consolidação de uma cultura de decisão democrática.

Como avalia a nova lei das associações profissionais e o que propõe em relação aos novos estatutos da OA?

A proposta de alteração ao Estatuto da Ordem dos Arquitetos (EOA) por parte do Governo revela uma incompreensão do valor da arquitetura e não reconhece o seu papel crucial no ordenamento e desenvolvimento do território e do próprio país, como um todo. O legislador procedeu a uma gravosa alteração do artigo 44.º do EOA, relativo aos atos próprios da profissão, ao suprimir a expressa referência à apreciação de estudos, planos e projetos de arquitetura como um ato próprio reservado aos arquitetos.

Desconsidera a arquitetura e os arquitetos e fá-lo a contraciclo com o resto da Europa. Uma Europa que insiste na promoção da arquitetura de qualidade para todos, salvaguardando a qualidade dos serviços prestados e assim o bem comum. Uma Europa que já entendeu que não há inclusividade, resiliência e sustentabilidade sem arquitetura e que ninguém pode ficar para trás.

A Ordem dos Arquitetos deverá continuar, pelos canais institucionais, a defender, como tem feito até agora, uma redação que assegure a promoção e salvaguarda da qualidade da arquitetura e do ambiente construído.