Nuno Magalhães está afastado da vida política ativa, mas mantém disponibilidade para apoiar o CDS e Nuno Melo. Gostaria de ver Paulo Portas regressar à vida política e lamenta que o mundo da política esteja tão “agressivo”.

Defende a criação de pontes de diálogo entre PSD, CDS e Iniciativa Liberal e critica a opção do governo de não desagravar impostos para as empresas.

Como tem visto este ano de liderança de Nuno Melo no CDS, depois de o partido ter perdido representação parlamentar?
Tenho visto com alguma preocupação porque a situação não é fácil – perder a representação parlamentar é perder espaço de intervenção -, mas também com esperança. Estou consciente de que a situação é complicada, mas acho que é possível o CDS, se calhar demorando mais tempo do que gostaríamos, recuperar o papel que é seu e faz falta.
Como pode conseguir o CDS crescer eleitoralmente, perante um Chega que resiste nas sondagens e uma IL a ocupar também o mesmo espaço político?
Em termos de posicionamento, o CDS deve estar onde sempre esteve. O CDS é um partido democrata-cristão, com inspiração e correntes quer conservadoras, quer liberais, mas é democrata-cristão, tem de parar de perder tempo a questionar-se e tem de dizer que está onde sempre esteve. A pior coisa que o CDS pode fazer é perder tempo a olhar para o lado. Chega de falar do Chega. Uma coisa é tentar perceber os eleitores do Chega, procurar perceber porque as pessoas estão tão zangadas ao ponto de votarem num partido que é basicamente um partido de protesto, uma interjeição. Outra coisa é passar a vida a olhar para o Chega. O CDS tem de seguir o seu caminho pensando nos seus eleitores e em como reconquistar outros que nas últimas eleições votaram no Chega, na IL, no PSD e até no PS.
A questão é como vai o CDS reconquistar esse eleitorado perdido nas últimas eleições com um Chega firme nas sondagens?
Com ideias firmes e com uma convicção: não é gritando e berrando que se resolvem os problemas, o mundo não dá para essas infantilidades. O CDS tem quadros, tem firmeza nas suas convicções, mas também capacidade e bom senso para o diálogo. O partido tem de mostrar a sua capacidade para o diálogo porque, sem ele, nenhum governo consegue governar. Governar não é falar para a televisão ou uma rede social; o CDS tem essa mais-valia e deve sublinhá-la. Além disso, o CDS continua a ter ótimos quadros e tem ótimos quadros jovens. Não estou tão no ativo como, se calhar, gostaria ou como, se calhar, deveria como militante, mas vejo gente com enorme qualidade na Juventude Popular e isso também é um fator de esperança.
Acabou de dizer que deveria estar mais ativo. Está disponível para fazer campanha ao lado de Nuno Melo nas eleições europeias ou até mesmo ser candidato?
Não. Ser candidato, não. Estou bem onde estou, gosto do que faço. A política, para mim, é uma página que, neste momento, está encerrada. Não vou dizer que nunca mais, porque não gosto de dizer nunca mais e, normalmente, quando se diz dá mau resultado. Mas, francamente, candidato, nem pensar nisso e o Nuno Melo sabe-o. Dentro das minhas possibilidades, ajudar como militante, segurar uma bandeira ou ir a um jantar ou ajudar com uma ideia, isso, com certeza. Ajudar, sim; participar ativamente, não. Isso é uma página que já lá foi.
Caso o CDS não consiga eleger um eurodeputado, o partido deve continuar a lutar pela sobrevivência ou deve assumir a extinção? Será o fim?
O fim, nunca será, mas acho que há duas ou três coisas que o centro-direita, sobretudo, tem feito nos últimos tempos e que são prejudiciais. Uma, já disse, e que é chega de falar no Chega. A segunda é chega de estar sempre a dizer “e se perdermos?”. Esse pessimismo militante e essa visão… Olhe, aí acho que devemos aprender alguma coisa com o “irritante otimista”, o dr. António Costa. Acho que é possível o CDS eleger um eurodeputado. Acho que vai dar trabalho – ao CDS, nunca nada foi dado, foi sempre tudo conquistado, mas temos de partir com a convicção de que vamos eleger, porque merecemos, porque temos qualidade, temos gente, temos projeto, temos ideias, nomeadamente a nível europeu.
Vejo nas suas palavras, então, uma crítica a Luís Montenegro, pelo facto de ter chegado a reconhecer que podia perder as europeias por pouco….
Acho que não foi dos melhores momentos dele. Digo isto com amizade e admiração. Mas também acho que a posição dele não é nada fácil, porque toda a gente lhe pergunta: e se perder as europeias? O PSD tem de pensar é o que vai fazer se ganhar as europeias porque segue-se um ciclo eleitoral e já ganhou, com o CDS, as regionais na Madeira com um resultado extraordinário: ganhou em todos os concelhos e o PS teve 21%, e disto não se fala. Passámos semanas a falar de uma eventual derrota de quem ganhou e não do resultado do PS. O PS, nisso, é competente e sabe fazer o seu spin, e nós, o centro-direita, parecemos um bocadinho aquelas famílias que estão desavindas, porque nos focamos demasiado no que correu menos bem e no que pode correr mal, e não no que manifestamente correu bem. A coligação de direita teve o dobro dos votos do PS.
E acha que Luís Montenegro fez bem em ir à Madeira e colocar-se naquele palco, nacionalizando os resultados?
Acho que é sempre mais fácil acertar no resultado à segunda-feira. Percebo a tentação, percebo até a proximidade que tem com o presidente do governo regional. Hoje, vendo o que sucedeu, não teria sido a melhor solução… mas lá está: mais uma vez, isso não é acessório sobre o essencial, que é quem ganhou e quem perdeu?
O presidente do PSD já afastou a possibilidade de uma coligação pré-eleitoral com o CDS para as europeias. Ir sozinho pode prejudicar o CDS?
Sou muito favorável – e não é de hoje, já é de há muitos anos – a um modelo de coligação quer pré-eleitoral, quer pós-eleitoral, porque acho que alarga, cresce, acrescenta. Não estou a falar só de votos, falo também de perspetivas, horizontes e ideias. Uma tensão boa num governo pode ser bom, no sentido de ser mais autoexigente. Mas, por vezes, pode não haver condições por motivos internos, que são respeitáveis. Tenho pena, mas vamos a isso…
Tem pena porque o CDS teria mais a ganhar se fosse coligado?
Não sei, dependeria do acordo de coligação que fizesse. Tanto sou favorável a uma coligação como sou a que cada um tenha a sua calha própria. Uma coligação é mais forte quanto mais fortes estiverem os dois e, por isso, o CDS tem de fazer o seu trabalho de casa. E tem projetos, tem equipa, tem ideias…
e tem de ter um bom cabeça-de-lista ? Deve ser Nuno Melo ou pode surgir um nome novo?
Não sei… Vai haver um congresso no início do ano e estou confiante de que Nuno Melo apresentará a solução de uma pessoa com prestígio, com perfil, com provas dadas e capaz de mobilizar o partido, que é isso que é preciso fazer.
Acha que o centro-direita e a direita ainda não se habituaram a lidar com esta dispersão de votos que se deu no seu campo político e continuam à procura de um posicionamento?
Ainda andam à procura do seu posicionamento, até porque ainda não sabemos também se essa dispersão é definitiva. Os eleitores têm razões que, por vezes, a razão desconhece. A direita tem de habituar-se a ter vasos comunicantes e capacidade de diálogo uns com os outros, e quero ser aqui claro que, quando falo de centro-direita, falo de PSD, CDS e admito pontos de convergência com a Iniciativa Liberal. Excluo o Chega. É difícil por vezes perceber o que o Chega pensa em áreas fundamentais como saúde, educação, ambiente. A ideia que dá é que o Chega, nestas áreas, quando há um problema, tem apenas um protesto, uma ideia fácil e demagógica: ou prende-se, ou fecha-se, ou dá-se mais dinheiro. Não consigo fazer uma plataforma de entendimento com quem tem este tipo de plano político. Por outro lado, os valores que o Chega defende não são os valores que o CDS e o PSD defendem. Portanto, fazer um casamento em que está pré-anunciado um divórcio é um erro. Há que haver coerência. Agora, o centro-direita deve ter um espaço de diálogo e fazer pontes de ligação e eu já penso isto há muitos anos.
Concorda, então, com a ideia de Diogo Feio de criação de uma federação da direita democrática e moderada. Mas essa federação e esse diálogo, na prática, significam o quê? Ou seja, o que é que PSD, CDS e IL já deviam estar a fazer?
Não sei se deveriam estar já a fazer. Pelo menos, podem nada fazer que inviabilize essa solução ou que torne esse diálogo mais difícil, e o que eu tenho visto, no geral, é que o que é proposto pelos três partidos não inviabiliza em nada essa plataforma. Admito que agora, tão perto das eleições europeias, não seja o melhor momento, mas tem de se pensar para depois das europeias se se mantiver esta ideia de cada um por si.
Mas, por exemplo, Nuno Melo queixou-se de não ter sido ouvido no acordo entre PSD/Madeira e PAN e na aliança do PSD com o PAN. Isto não causa tensão? Houve quem considerasse imprudente….
Pelo que sei, o CDS/Madeira foi ouvido. Na política, o desacordo não é irreversível. E na Madeira levam muito a sério a autonomia.
Luís Montenegro não tem conseguido descolar nas sondagens. É uma questão de mensagem e perfil ou apenas uma questão de tempo?
Luís Montenegro tem procurado estar próximo das pessoas com a iniciativa Sentir Portugal e, ao mesmo tempo, tem tentado – o que é muito difícil – ser uma oposição de propostas, o que é difícil de fazer quando se está na oposição, porque não se tem acesso à informação financeira toda. Mas ele tem tido essa coragem. Não pode ser preso por ter cão e por não ter. Se apresenta propostas é porque é destrutivo, se não faz propostas é porque é fofinho. Qualquer líder da oposição não tem vida fácil. Não existem assim tantos casos de líderes da oposição do PS e/ou do PSD que tenham descolado assim tanto nas sondagens muito tempo antes de umas eleições. Já existiram várias surpresas de pessoas que davam empate e depois ganharam. A verdadeira sondagem são as eleições e as eleições podem ser diferentes. Aliás, como as últimas foram: ninguém esperava a maioria absoluta do PS, acho que nem o dr. António Costa.
O governo tem enfrentado muita contestação social, com crises na saúde, habitação e educação. A proposta de Orçamento do Estado que foi apresentada resolve os problemas do país?
Não sei se resolve e não é o Orçamento do Estado, por si só, que resolve estas crises. Os problemas são mais profundos que a falta de dinheiro. O Orçamento do Estado, indiscutivelmente, procura uma devolução de poder de compra às pessoas singulares, é um facto, mas outro facto é que aumenta os impostos indiretos e não tem uma política de desagravamento fiscal para as empresas. Tem as suas virtudes para as pessoas; a meu ver, não tem boas notícias para as empresas. O problema da habitação é seríssimo. Porventura todos, sem exceção, incluindo o CDS, não valorizámos tanto esse problema como devíamos ter valorizado… Creio que é o principal problema.
O governo de Pedro Passos Coelho, portanto…
Vários governos. Quero ser justo. O PS está há oito anos no governo; portanto, tem as suas responsabilidades, mas também é verdade que há questões que são estruturais e que podiam ter sido atalhadas e resolvidas anteriormente. Preocupa-me como cidadão que seja um luxo para um jovem vir estudar para a universidade em Lisboa. Isto representa um retrocesso em relação à minha geração.
A habitação é uma área que exigiria um pacto de regime – como gostaria o Presidente da República?
Sem dúvida. Este pacote Mais Habitação, que tem algumas medidas positivas, não corresponde aos problemas; nisso, acompanho a opinião do Presidente da República, áreas como a habitação e uma reforma fiscal séria, duradoura e estável, e também a educação e a saúde. O que as pessoas cada vez mais querem é que resolvam os seus problemas concretos e isso não se resolve aos berros, resolve-se com diálogo, compromisso e planificação.
Tem visto neste governo abertura e disponibilidade para esse tipo de diálogo e pactos de regime ou só acordos?
Às vezes parece ser mais uma disponibilidade dita do que efetiva. Mas, hoje, a forma de fazer política – e é uma das razões porque não tenho vontade nenhuma de voltar – tornou-se muito agressiva, como se fosse um jogo de futebol, com claques, com radicalização, com muito soundbite para a rede social. Em vez de se procurar ter as melhores ideias, procura-se que as dos outros sejam desvalorizadas, com muito pouco espaço para o diálogo e isso preocupa-me. Quando as coisas na forma são violentas, por vezes tornam-se pessoais e, quando é assim, é quase impossível haver qualquer tipo de acordo.
Está a querer dizer que hoje se faz uma política mais para o dia-a-dia do que a médio/longo prazo, com visão de fundo?
É exatamente isso que estou a tentar dizer, acho que sim. Mas a política é um espelho da sociedade e acho que essa é uma reflexão que todos devemos fazer.
A estratégia do ministro das Finanças, Fernando Medina, de não abrandar nas contas certas, mesmo sendo feita à conta de impostos e inflação, é certa? E não retira o trunfo que a direita acenava há anos como sendo só seu?
É certa, sim, mas não fomos nós que mudámos de opinião. É evidente que retira um argumento: agora, a direita, o que tem de fazer é dizer o que faria diferente. Podia dizer que faria diferente com outro tipo de política fiscal para as empresas e não através dos impostos indiretos. Mas, lá está, o centro-direita, ao invés de cair nessa discussão se o governo está a copiar ou não, devia ir a jogo, dar as boas-vindas e dizer como é que fazia diferente. E neste momento podiam dizer: temos contas certas, mas é o momento de os empresários terem alívio fiscal. Acho que aí fariam uma distinção. O PS optou pelo desagravamento do IRS: acho que devia fazê-lo de forma mais gradual, procurando ao mesmo tempo dar sinais à economia e incentivar a criação de emprego através das empresas. É a minha visão de centro-direita. É possível fazer diferente e melhor e é nisso que o centro-direita tem de se concentrar. O centro-direita tem de ser muito claro no que quer fazer e no que diverge do PS, bem como no que converge. Às vezes, a ideia que dá é que não é assim tão impossível haver um denominador comum entre o centro-direita e o centro-esquerda – neste caso, o PS -, não é assim tão difícil se houver capacidade de diálogo.
Mudando de assunto, gostava de ver o ex-líder do CDS/PP Paulo Portas regressar à vida política ativa?
Gostava de ver Paulo Portas em qualquer lugar. É seguramente um dos maiores políticos do século XX, é alguém que estimo e admiro muito, mas acho que está muito contente a fazer aquilo que faz. Agora, se a pergunta é se eu gostava, gostava.
Seria um bom candidato presidencial do CDS ou até mesmo um candidato para congregar toda a direita?
Acho que seria bom candidato a qualquer lugar com responsabilidade pública.
Para as eleições europeias também?
Aí, já me parece mais difícil. A minha resposta é: se acho, no plano do desejo, que Paulo Portas seria um bom candidato, seria um bom candidato a muita coisa, mas só o próprio poderá dizer se é altura para isso. Se eu próprio estou a dizer que não estou disponível, não vou pôr outra pessoa nessa posição.
Há uns meses, como sabe, o governo viveu um período bastante conturbado e a possibilidade de dissolução da Assembleia da República esteve em cima da mesa. Acredita que Costa superou essa crise e que vamos chegar ao fim do ciclo político?
Eu sempre acreditei que íamos chegar ao fim do ciclo político, mesmo nessa altura de ditas tormentas. Posso enganar-me, mas acho que chegaremos ao fim do ciclo político e não acho isso mau. Os mandatos são para se cumprir, para serem julgados no momento certo.
Marcelo Rebelo de Sousa fez bem, então, em não ter usado a bomba atómica dissolvendo a Assembleia da República, mesmo perante o caso João Galamba e a polémica com o SIS?
Acho que sim. Não fui daqueles que exigiam ao Presidente a dissolução, ainda mais decorrido tão pouco tempo das eleições. Acho que Marcelo fez bem.
Não estava em causa o regular funcionamento das instituições democráticas?
Percebo quem na minha área política, à data, disse que podia estar em causa o regular funcionamento das instituições e fez a comparação com 2005, percebo onde quis chegar quem fez essa comparação e a defesa do irregular funcionamento das instituições, mas percebo, sobretudo, a posição do Presidente da República. Estamos a falar de um governo de maioria absoluta de um só partido acabado de ganhar essa maioria absoluta. É verdade que em 2005 também havia um governo com poucos meses, é verdade que na comparação podemos ficar com estados de alma, mas acho que o Presidente da República esteve bem.
A questão da intervenção do SIS no caso Galamba, para a recuperação do computador de um assessor, devia ser esclarecida? Por quem?
Deve ser esclarecida, à cabeça… seguramente, quem o poderá fazer é o primeiro-ministro. Compreendo que nesta altura não o queira fazer, até porque não está na ordem do dia. Surpreendeu-me e preocupou-me muito a forma algo ligeira como aparente e alegadamente o SIS possa ter tido intervenção nesta matéria, porque são serviços altamente sensíveis, compostos por pessoas altamente preparadas e qualificadas, e o que julgamos todos saber que aconteceu não prestigia esses serviços. Pode ter uma explicação, oxalá que tenha, espero que tenha, mas então que se diga.
Ainda acredita que vamos ter essa explicação?
Um dia, mas não está para breve.