O crescimento desenfreado do nacionalismo nos últimos anos não é necessariamente surpreendente: é, aliás, relativamente expectável. Importa mais decifrar as suas tipologias do que julgar nacionalismo sem o devido contexto.

O sentimento de identidade individual das pessoas deriva, naturalmente, do seu contexto social. Filiações religiosas, sindicatos, organizações políticas, escolas e universidades podem ter – e têm, certamente – significado para os seres humanos. No entanto, a identidade nacional parece continuar a ser essencial para muitos que dela dependem para dar sentido às suas vidas e para quem dela derivam sentimentos de pertença e segurança. O seu valor-base está ligado ao sentimento de pertença cultural que providencia significado adicional – e coletivo – às ações individuais.

Assim o disse Isaiah Berlin: homens preferem receber ordens, mesmo que isso implique maus tratos, de membros da sua própria fé, nação ou classe, a uma tutela – por mais benevolente que seja – por parte de paternalistas de um país estrangeiro ou de uma classe ou meio estranho. O sentimento de inclusão pressupõe a noção de que todos os outros são, por sua vez, excluídos. Um português é português em detrimento de todos os que não o são e que não partilham o nome comum que evoca o sentimento consciente de parentesco em torno de membros da mesma nação.

Não tecendo comentários morais, não é surpreendente que o Estado não consiga ser cultural ou linguisticamente neutro ou que não veja qualquer tipo de incentivo nesse sentido e, por isso, o próprio conceito do quê e de quem constitui a nação que o Estado privilegia é importante. Compreendendo a ligação quase umbilical entre Estado e cultura, surpreendente será que não existam mais movimentos nacionalistas.

Mas atenção: a nação não é um conceito imutável. Existem nações sem Estado e Estados que não são nações, mesmo que o Estado-nação seja a norma no mundo moderno. Do pré ao pós-moderno, o que é e constitui uma nação evoluiu, assim como os seus interesses políticos e culturais. O mundo mudou desde que Isaiah Berlin ou Ernest Gellner apresentaram as suas contribuições para este tema.

A contrarreação à globalização ou à constituição de blocos políticos como a União Europeia manifesta-se em reações extremadas e a evolução de nacionalismos terá de ser para contrabalançar a infeliz tendência. O sentido legalista do Estado terá de adiantar-se a sentimentos arcaicos que têm vindo a ser instrumentalizados continuamente pela extrema-direita. O sentimento popular terá, no entanto, de ter algo onde se agarrar para que a “nação” evolua. No caso europeu, a identidade ideológica e democrática comum; no caso americano, é difícil prever.

Mestrando em Ciência Política e Relações Internacionais