Encomendado pelo anterior Governo, a comunicação social divulgou na passada semana a versão preliminar do Livro Verde da Segurança Social, agregando os contributos de um grupo de alegados peritos na matéria de contas sobre a sustentabilidade do nosso modelo atual de repartição.

Posteriormente, alguns desses alegados peritos manifestaram a sua indignação pela divulgação, alegando que seriam apenas medidas avulsas. Ao coro juntou-se a central sindical do regime, que se queixou de que o fórum adequado para a divulgação seria outro. Deduz-se que estarão melindrados por terem sido ignorados.

Quase todos com impecáveis credenciais de esquerda, os alegados peritos têm o pequeno problema de não serem peritos no tema, mas apenas pessoas inteligentes e com boa imprensa. O suficiente, talvez, para domar alguma central sindical mais influenciável.

Isto dito, as recomendações dos alegados peritos mais não fazem do que penalizar os trabalhadores. Sempre os trabalhadores, claro está. Ora, por menos, por muito menos, levantaram-se em protesto os sindicatos franceses contra o plano de suposta reforma da Segurança Social francesa. Aqui, como lá, o mesmo diapasão: adiar a idade de reforma, restringir o acesso à reforma antecipada em caso de desemprego de longa duração estrutural,ou dificultar o acesso à reforma, apesar da penosidade psicológica de algumas carreiras de elevado desgaste. Enfim, um desfile de horrores sem fim.

Por outro lado, convém realçar que o nosso modelo puro de repartição aliena os cidadãos, gera uma cruel incerteza e reduz as expectativas fundadas de dignidade das prestações das pensões de velhice e de sobrevivência. Ao não divulgar as contas atuariais por tipologia e por pessoa, ao não convidar as empresas e os cidadãos a empenharem-se na constituição e no reforço de segundos e terceiros pilares, este modelo perpetua uma situação de fragilidade assente exclusivamente em variáveis como as empresas de trabalho-intensivo, os nascimentos e a imigração.

Sejamos claros. Não precisamos de mais imigrantes para sustentar um modelo monolítico. Não precisamos de mais restrições que penalizam os trabalhadores e os deixam à mercê de reestruturações empresariais decididas à escala global e sem o escape da reforma. Nem precisamos de alegados peritos.

Do que necessitamos é de transparência sobre o valor expectável de pensão de cada trabalhador. Do que precisamos é de colocar as transações digitais, os robôs e as máquinas, os royalties pagos às casas-mãe, todos a financiar o modelo de pensões de velhice numa parte equivalente aos salários e ao emprego.

Insistir em deixar de fora, entre outras, as plataformas digitais de comércio eletrónico, as redes sociais, as operações de capital intensivo, assim prejudicando os trabalhadores e as empresas que criam emprego, é por demais idiota e não é sequer de esquerda.

Portanto, com toda a franqueza, à luz do que ficámos a conhecer, a conclusão é clara: cartão amarelo, a tender muitíssimo para o vermelho, para o tal Livro Verde.

Presidente do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários