“…Angola, Moçambique, Goa e Macau. Ai, fui até Timor. Já fui conquistador”, cantavam os Da Vinci na canção que representou Portugal na Eurovisão em 1989, que tem uma letra que hoje certamente seria bastante polémica.

Os portugueses podem e devem orgulhar-se da sua História, sabendo que teve acontecimentos heróicos e acontecimentos bastante infelizes, pelo menos aos olhos de hoje. Quando o Presidente da República levanta a questão de uma hipotética reparação histórica, está a cometer um erro e a ser bastante injusto com os próprios portugueses.

Em primeiro lugar, a mais alta figura da nação devia ter especificado o que poderá ter em mente quando fala em reparação histórica. Reparação a quem? Reparação como? Reparação de quanto? Reparação quando? Mas não. Marcelo Rebelo de Sousa generalizou e não explicou nada. Automaticamente, uma ministra brasileira reagiu e exigiu acções concretas.

O Brasil é precisamente aquele país em que faz menos sentido falar em reparações históricas, sejam elas quais forem. É um Estado independente há mais de 200 anos, foi a colónia que Portugal mais desenvolveu, a quase totalidade dos colonos ficaram no Brasil e os seus descendentes são brasileiros. Passados já dois séculos depois da independência os males de que hoje esse país sofre são total responsabilidade dos próprios.

Mesmo os males que os portugueses cometeram, com a escravatura à cabeça, não eram vistos, há mais de 200 anos, com a mesma gravidade com que são vistos hoje. É bom lembrar que, nesse tempo, não havia sequer direitos humanos e todos os povos, mesmo os das sociedades mais ricas e colonizadoras, eram explorados e pobres. É inaceitável sermos hoje juízes de actos cometidos no passado, sobretudo do passado longínquo como é o caso do Brasil colónia. Mais, se é para fazer balanços entre o deve e o haver, o Brasil deve muito mais a Portugal do que Portugal ao Brasil.

Nos casos da chamada Índia portuguesa, Timor Leste e Macau há uma especificidade e uma História desses territórios tão diferente que não os coloca na agenda das reparações históricas. Pelo menos por enquanto. Já os PALOP têm maiores razões de queixa. Bem mais recentes, também. Portugal só deixou as colónias africanas em 1975 e teve uma guerra com movimentos armados de libertação em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.

Mais, muitas pessoas que passaram por essas três guerras ainda estão vivas e muitos filhos dessa geração são a força laboral desses três países. Há ainda traumas que não foram superados e Portugal foi responsável por vários crimes que, mesmo à luz daquela época (1961-1974) já eram considerados inaceitáveis. Nestes três casos e apenas nestes três casos fará sentido conversar com os seus governos e perceber de que forma poderá haver uma reparação, que pode ser monetária, mas também pode ter outros formatos.

Ao longo destes últimos 50 anos, o Portugal democrático tem trilhado, e bem, uma relação especial e bastante amiga com os PALOP. Esse caminho deve ser continuado em várias formas de cooperação. Tanto os Presidentes da República como os primeiros-ministros portugueses – em colaboração com os governos de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau – podem procurar formas de uma reparação, seja indemnizações a famílias de massacres específicos cometidos durante a guerra colonial, seja através de outras formas criativas de ajuda.

Não deixa de ser curioso, no entanto, que esses países africanos tenham uma postura com Portugal muito mais amistosa e colaborante do que o Brasil, que veio logo, sem qualquer razão do seu lado, exigir reparações históricas por actos cometidos há mais de 200 anos. Era tempo de o Brasil deixar de ser aquele jovem adulto que culpa os pais por não ser bem sucedido na vida e olhar para si próprio.

Presidente do movimento Partido Democrata Europeu

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia