Qual será o estado da nossa democracia depois do dia 10 de março? Com um hemiciclo fraturado, polarizado, instável, diz-se que todo o poder de negociação estará nas mãos de quem não deveria. Ora, sim e não. Eis o porquê.

As sondagens dão percentagens idênticas de intenção de voto a qualquer que seja o próximo líder do PS, seja José Luís Carneiro ou Pedro Nuno Santos. O futuro secretário-geral tem uma missão complicada pela frente: combater a fadiga eleitoral da população portuguesa e enfrentar simultaneamente a perspetiva de uma perda de maioria da esquerda parlamentar.

Certo é que, mesmo que ambos os candidatos enfrentem o mesmo problema, as suas soluções não poderiam ser mais diferentes – nomeadamente no combate à direita, que parece ser a arena argumentativa mais acesa. Aliás, a própria definição de “alvo a abater” difere nos dois políticos, já que enquanto José Luís Carneiro se opõe categoricamente a qualquer participação do Chega num governo, Pedro Nuno Santos parece ostracizar tudo o que está à sua direita.

Ao PSD, atualmente e enquanto partido de oposição, competem outras vertentes. O histórico erro estratégico de Rui Rio de não pintar o PSD como um partido de direita, numa altura em que a direita se estava a fragmentar, ajudou ao crescimento da Iniciativa Liberal e do Chega.

Disto resultou não só uma mudança fundamental do paradigma político nacional, como a necessidade de uma mudança clara de estratégia eleitoral por parte dos sociais democratas: o apelo ao voto ao centro-direita enquanto alternativa ao PS e a rejeição contínua e categórica de qualquer acordo com o Chega são uma opção inteligente por parte de Luís Montenegro, que poderá assim capitalizar uma situação estrategicamente favorável mesmo não tendo o apoio popular (e até partidário) que desejaria.

Cabe ao PSD manter a sua palavra – não governar se não ganhar as eleições, lembrando sempre que o poder são os meios e não os fins.

O elefante na sala é, naturalmente, o Chega. Enquanto garantor técnico da maioria à direita – e, consequentemente, de uma minoria à esquerda que a impediria de formar governo –, pretende fazer parte de um governo, o que, se Luís Montenegro se mantiver fiel à sua palavra, tal não será possível. Estará, portanto, o poder de negociação nas mãos de quem não deveria? Sim, porque se o Chega assim o quiser, não viabiliza coisa nenhuma.

Ao mesmo tempo, não, porque se o Chega não viabilizar um governo de direita, abre o jogo para o PS – atitude hipócrita, até para os critérios do Chega, que não seria bem-vista pela sua base. Este “nim” deixa-nos num estado cheio de incerteza.

A minha infeliz previsão é que em 2026 iremos novamente a eleições. O Chega poderá viabilizar o governo numa fase inicial, mas é um “parceiro” demasiado instável e com exigências inatingíveis. Num possível, porém improvável, caso de vitória de José Luís Carneiro e uma viabilização, ainda mais improvável, de um governo do PSD por parte do PS, assim que houver uma abertura política, logo se cortam as pernas deste frágil entendimento.

Quem está entre a espada e a parede não é o Chega; também não é o PS e quem pensa que é o PSD também está enganado. Quem está entre a espada e a parede somos todos nós.

Mestrando em Ciência Política e Relações Internacionais