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O candidato da Iniciativa Liberal às eleições europeias, João Cotrim Figueiredo, considera que a União Europeia tem de ser reformada e que o ex-primeiro-ministro António Costa não tem o perfil para o fazer.

Em Discurso Direto, ao NOVO e ao Jornal Económico, diz que estas europeias são difíceis de sentir e que o seu resultado não devia ter consequências na governação, mas sim para os seus protagonistas.

Admite maior pressão para ter um bom resultado, mas garante que vive bem com ela.

 

Disse que António Costa não tem arrojo para ser um bom presidente do Conselho Europeu. Porquê?

Já falei nisso várias vezes. Quem não reforma Portugal não vai reformar a Europa e o Conselho Europeu é o mais político dos órgãos, não sendo estritamente executivo é político, onde estão os chefes de Estado e de Governo dos países membros da União. Portanto, é ali que a política se faz e se negoceia e é preciso que tenha à frente alguém que reconheça as necessidades absolutas de reformas na defesa, no alargamento, nas instituições, na revitalização do mercado único. São reformas difíceis, algumas delas, como dissemos também, difíceis de vender politicamente. É preciso coragem, é preciso apetência pelo risco e, tudo isso, durante oito anos António Costa deu provas de que não tinha. Em condições idênticas de competência, tenho gosto que seja um português, mas prefiro que seja um estrangeiro com uma visão correta e reformista da Europa do que um português que não a tenha.

Aplica-se o mesmo à presidência da Comissão Europeia?

Aplica-se o mesmo, com uma diferença, que [a escolha] é resultante do jogo de forças da aritmética parlamentar que resultar das eleições de dia 9 de junho, que vão, desta feita, eleger 720 eurodeputados, não só os 705 da última legislatura. Essa aritmética é determinante para o processo de escolha da presidente da Comissão Europeia. E sim, os critérios para mim seriam os mesmos, mas o processo de escolha, como é diferente, é mais um motivo para apelar a que as pessoas votem em forças europeístas, que querem verdadeiramente reformar a Europa e que querem a Europa volte a ser um símbolo da tal paz, liberdade e prosperidade que sempre foi e que acho que tem deixado de ser.

Estas são as primeiras eleições europeias mais a sério da Iniciativa Liberal; as primeiras foram logo a seguir à formação. Qual é o objetivo? Um deputado, dois deputados?

A moção estratégica da Iniciativa Liberal é muito clara: o objetivo é um deputado e temos a ambição de trabalhar para ter dois, se a situação política e o próprio decurso da campanha o proporcionar obviamente que não hesitaremos em fazer e ambicionar mais.

E, já agora, também lá menciona a notoriedade do candidato e em relação a isso eu não vou falar.

Mas como os objetivos políticos se fazem para depois serem medidos em relação aos resultados que se conseguem, eu vou manter a assunção da moção estratégica, mas não é por uma questão de prudência, é por uma questão de realismo, porque estas eleições são particularmente difíceis de sentir, se quiser, de prever, porque vêm muito em cima de umas legislativas; nós não sabemos, mas imaginamos que não haja tendência para o voto de protesto e de castigar o Governo incumbente que tem havido em algumas outras eleições europeias, mas não sabemos se em dois meses esse fenómeno é igual ou menor, mandaria a lógica fosse menor, mas nãos abemos. Não sabemos se o acréscimo da participação nas eleições de março – houve mais meio milhão de pessoas a votar – foi por algum motivo que os leva outra vez às urnas nestas eleições ou não. Sabemos que a abstenção será, infelizmente, mais alta, espero que não tão alta como anteriormente, nem muito mais alta do que em março, mas será certamente algo mais alta, e se pode ser muito assimétrica, com determinados eleitorados de partidos absterem-se mais do que outros. E depois temos candidatos que, no fundo, estão a dar-se a conhecer, alguns deles há uma semana. Portanto, é difícil perceber como é que a dinâmica de campanha se vai compor. Por tudo isto, aquilo que eu às vezes costumo ter que são intuições sobre aquilo que pode acontecer numa campanha ainda não tive, mas assim que tenha partilho com a comunicação social.

E temos o Chega que teve uma subida grande e, no fundo, estas são também as primeiras eleições europeias mais a sério para eles.

São eleições em que quererão provar que a votação significativa que tiveram em março não foi apenas por protestos e que são um eleitorado que se pode considerar fiel. E eu tenho dúvidas.

Falou na sua notoriedade e há quem diga que é o ativo mais relevante do partido atualmente, reconhecendo-lhe capacidade para ter um melhor resultado agora nas europeias do que o partido teve nas legislativas.

Essas discussões de universos paralelos são sempre difíceis.

Eu vou direto ao cerne da questão, acho que o Rui Rocha está a fazer um trabalho absolutamente extraordinário e só lamento que as qualidades políticas dele não tenham sido reconhecidas mais cedo do que começaram a ser desde a última campanha das legislativas. É, de facto, uma pessoa extraordinariamente bem preparada e capaz de ser um excelente mensageiro da mensagem liberal. Quanto a ser mais capaz ou menos capaz do que eu, como digo, é um universo paralelo e eu acho que há coisas que o Rui faz muito melhor do que eu, haverá outras que eu farei melhor do que ele, como é normal entre dois seres humanos que são diferentes e não tenho nada a certeza de que tivesse tido um resultado diferente, porque o as eleições de março, recordo, foram particularmente polarizadas, particularmente suscetíveis ao voto útil e tidas em condições que não foram de facto as mais propícias a uma campanha efetiva da Iniciativa Liberal.

Pergunto-lhe ao contrário, sobre si, se não haverá maior pressão, tendo em conta esta leitura?

Admito, mas vivo bem com ela, porque não procurei ter essa essa expectativa, não a geri, as pessoas criaram-na sozinha, se tiverem de desinflar sozinhas também não virá mal ao mundo e eu continuei a fazer o papel – e nesta entrevista também dei exemplos disso – de ser sério e de não enganar as pessoas.

Não vou falar aqui de problemas, nem soluções da Europa que competem aos Estados-membros. Não vou falar de educação, de saúde, não vou falar de habitação aqui, a dizer que, especialmente alguém que vai para o Parlamento Europeu, nem sequer é para órgãos executivos da Europa, vai ter aí grandes papéis. Não vou dizer que incluir a habitação na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia faz uma enorme diferença.

Interessa é as coisas que se fazem aqui e, sim, os governos têm de ser eficazes e as oposições também têm de ter boas ideias para obrigar os governos a fazer melhor. Nisso sim, parece uma de duas coisas e qualquer uma delas má: uma desresponsabilização dos governos nacionais, empurrando para a Europa, um bocado o perverso de eu não tenho de fazer grande coisa porque vêm fundos da Europa e não tenho de fazer grandes políticas porque a Europa vai resgatar-me, digamos assim; e a outra é ter uma incapacidade permanente de conseguir olhar para as suas próprias competências, exercê-las e, desta maneira, ao dizer aos eleitores que a Europa vai resolver estes problemas que são de competência nacional está-se, na prática, a enganá-los, está-se a dizer que estão a votar em pessoas que podem de uma forma milagrosa qualquer resolver os problemas, porque a Europa, esta coisa abstrata, é de onde vem muito dinheiro. Portanto, vai resolver a habitação, não, nada, não vai, não vai e isso é enganar as pessoas e por isso é que não me vê, com a seriedade que eu acho que me esforce pelo menos por ter no tratamento dos assuntos a falar de temas para os quais o Parlamento Europeu pode acrescentar pouco.

Estas eleições podem ter uma leitura nacional e faz sentido haver essa leitura nacional?

Eu acho que é inevitável, mas é inevitável porque uma eleição não deixa de ser uma grande sondagem, sem controlo da ERC. Mesmo numas europeias pouco concorridas, vão votar 3,5 ou quatro milhões de pessoas. É uma enorme sondagem ou auscultação e, portanto, é inevitável que os resultados sejam lidos, mas eu diria que não deviam – e isso sim, é irrazoável – ter consequências governamentais; são eleições para outro órgão. Sendo certo que qualquer dos partidos, incluindo os da coligação governamental, vão olhar para eles e tirar ilações táticas, mas não devia ter reflexos.

Nos partidos que se apresentam, que fiquem acima ou abaixo dos seus resultados pode ou não ter consequências, também em função da forma como definiram as suas fasquias e da responsabilidade que se auto atribuam ou alguém lhes atribua relativamente a esses eventuais resultados menos positivos.

Para os candidatos, sim, para os candidatos deve ter consequências. Portanto, se eu tiver um mau resultado saberei, até porque estas eleições são particularmente personalizadas, que há responsabilidades minhas e sobre isso.