Há várias semanas, mas sobretudo após o debate de 27 de Junho, que se questiona se Joe Biden tem capacidade para se recandidatar e ser novamente presidente dos Estados Unidos. Isto baseado nos seus 81 anos, na sua maior dificuldade em andar e em algumas gafes que cometeu. Muitos dizem que tem falta de vigor e que o cargo que ocupa é demasiado exigente para a sua idade.
E muitas destas dúvidas assolam militantes do seu próprio partido e comentadores dos media da sua área política. Deveria Biden ter preparado um sucessor ou sucessora nestes últimos anos e sair de cena? Ainda irá a tempo de desistir e encontrar-se alguém que possa derrotar Trump? Quem poderia ser o melhor candidato ou candidata no campo democrata com hipóteses de vencer o adversário?
São dúvidas que os democratas têm e que o atentado contra Trump em nada ajudam a dissipar. Antes pelo contrário. Mas não é tanto as hipóteses que cada candidato tem que é o tema deste texto. É mesmo a cultura instalada nos Estados Unidos e cada vez mais na Europa (por osmose) de que os velhos não servem, muito menos para ocupar cargos de grande responsabilidade política.
E devemos perguntar-nos todos: Como chegámos aqui? As sociedades ocidentais, até há relativo pouco tempo, valorizavam o saber, a experiência, o bom senso daqueles que já têm uma idade avançada. Ainda é assim em boa parte das sociedades do Oriente, onde os velhos são respeitados com uma quase veneração. São considerados os sábios das suas comunidades. Pelo contrário, nas culturas ocidentais os velhos passaram a ser vistos como incapazes e empecilhos.
Vê-se isso de forma bastante cruel pela forma como literalmente despejamos os nossos velhos em lares, como uma parte considerável das famílias mal os visita, já para não falar de algo pior como os maus tratos, que são já uma chaga social que deveria ter muito mais atenção por parte das autoridades, a começar pelas políticas.
Curiosamente, numa sociedade tão envelhecida como a nossa, este preconceito em relação aos mais velhos significa que estamos a menosprezar uma parte bastante significativa da população. E que poderia ser bastante útil ao bom funcionamento das várias redes sociais que compõem a nossa vivência. Basta para isso que as lideranças políticas ocidentais olhem elas próprias de forma diferente para quem tem mais de 70, 80 ou 90 anos.
E não deixa de ser irónico que numa sociedade que – e muito bem – critica a misoginia, o racismo, a xenofobia e a homofobia conviva tão bem com o idadismo, um preconceito tão grave como os anteriores. É pena que boa parte das pessoas não se ponham no lugar de alguém com 85 ou 90 anos e sintam o que é ser olhado como um fardo, como um tontinho ou como alguém que os outros já só estejam à espera que morra. É esta a sociedade que queremos?
Não é pouco comum ler críticas por se ver tantos comentadores grisalhos nos canais de televisão. “É só velhos”, comenta-se. E então? Não são esses que transportam mais conhecimento, mais experiência, mais vida? Não que alguém com 20 anos não possa exprimir as suas ideias, e deve, mas uma pessoa com 70 anos não tem maior saber acumulado e uma visão do mundo mais enriquecedora?
Há uns tempos houve um clamor, sobretudo nas redes sociais, por mais juventude representada nos canais de informação, que surtiu efeito. Os directores de canais foram buscar rapazes e raparigas na casa dos 20 ao Twitter, agora X, para começarem a opinar na televisão. Não sei se o espectador ganhou com isso, mas cada um tirará as suas conclusões.
O que parece bastante errado é esta fobia crescente em relação aos mais velhos, que se tem alastrado nos Estados Unidos e na Europa e que agora coloca alguém como Biden numa situação de um inútil que vai destruir a possibilidade de ter novamente os democratas na Casa Branca. Mas se Biden perder contra Trump a culpa será muito mais do idadismo sem sentido do que do actual presidente.
E só uma nota final: os velhos são cada vez mais a maioria da população, é urgente olhar para a sociedade de outra forma e saber integrar esta maioria silenciosa. Para o bem deles. Mas sobretudo para o bem dos mais novos.