Não é novidade para ninguém que vivemos tempos políticos conturbados, com os extremismos a crescer, com posições radicais, discursos de ódio, acusações fáceis e cancelamentos de personalidade. É assim em boa parte do mundo, é assim na nossa Europa e é assim também em Portugal.

Parece cada vez mais que é atacando o outro ou as ideias do outro que se consegue valorizar a si mesmo e as suas ideias. É verdade que a política sempre usou críticas e acusações ao opositor, mas havia mais respeito e, sobretudo, dentro das narrativas mais moderadas. Isso dava ao eleitor uma sensação de maior estabilidade política e alguma segurança na preservação de valores comuns.

A época que vivemos é outra, as extremas-direitas e as direitas radicais ganham adeptos e as esquerdas e as esquerdas mais extremas estão mais radicais, achando que assim combatem de forma mais eficazmente o outro extremo. É uma má opção, que está a polarizar profundamente o ambiente político, tornando muito mais difícil a procura de consensos, tão necessários à vida democrática e ao progresso dos povos.

A esquerda e a esquerda radical deixaram praticamente de lado a luta de classes, a defesa dos mais pobres, as propostas de inserção social, o aumento de salários, as melhores condições de trabalho… para se dedicarem a causas, passando a absorver a narrativa da extrema-direita, mas no campo oposto.

A direita moderada e o centro-direita, o centro, o centro-esquerda e a esquerda moderada devem ter como certo que os direitos individuais alcançados neste século XXI não são para voltar atrás. Questões como a interrupção voluntária da gravidez, os direitos LGBT+, leis anti-racistas, eutanásia, entre outras, não podem ter nenhum tipo de retrocesso. São avanços civilizacionais, como antes foram o fim da escravatura ou o fim da pena de morte.

É óbvio que os moderados, de centro, de esquerda e de direita, devem sempre defender estes valores que não são mais do que valores humanos. O problema é ter uma certa esquerda a focar a sua narrativa política quase em exclusivo nestes temas, esquecendo o seu papel histórico e tão necessário: a defesa de quem trabalha. Quem defende hoje os direitos dos trabalhadores de forma eficaz?

É essa a esquerda que faz falta. Não tanto a esquerda que se inspira todos os dias na ala mais esquerdista do Partido Democrata norte-americano. Não deixa de ser irónico ver a esquerda europeia – e parte do centro-esquerda europeu – inspirar-se e copiar uma variante da esquerda do Estados Unidos, que, para simplificar, chamamos normalmente de wokismo. É uma variante perigosa, não nos valores, mas na forma como ataca o outro ou aquele que possa pensar de forma diferente.

É uma esquerda que odeia o Ocidente, o passado histórico europeu e que acha que devemos ter um eterno sentimento de culpa por feitos realizados há 200, 300, 400 ou 500 anos. São posições extremadas que alimentam a extrema-direita e polarizam o discurso político. Os resultados eleitorais para as esquerdas não têm sido os melhores e já se percebeu que não será por essa via que reconquistarão o seu eleitorado.

A política precisa das esquerdas, fazem falta ao equilíbrio de forças numa democracia. Mas precisamos claramente das esquerdas que se foquem na sua essência, sem nunca abandonarem os seus valores.

Presidente do movimento Partido Democrata Europeu

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia