Mais de metade das pessoas de etnia cigana revelou já ter sofrido discriminação em Portugal, segundo os resultados do Inquérito às Condições de Vida, Origens e Trajetórias da População Residente em Portugal (ICOT) divulgados esta segunda-feira.

Realizado entre janeiro e agosto de 2023, o inquérito hoje publicado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), no âmbito do Dia Nacional do Cigano, indica que 51,3% das pessoas que se identificaram como ciganas já sofreram discriminação, valor muito superior aos 16,1% registados na população total.

“Entre as razões por detrás dessa discriminação, destaca-se, essencialmente, um conjunto de fatores que agrega a cor da pele, o território de origem e o grupo étnico, identificado por 95,0% das pessoas daquela etnia que foram discriminadas (proporção que é mais do dobro da observada na população total que foi discriminada, 40,1%)”, refere o relatório do INE sobre o inquérito.

De acordo com o ICOT, cerca de 47.500 pessoas com idades entre os 18 e os 74 anos e a residir há pelo menos um ano em Portugal, “autoidentificaram-se com o grupo étnico cigano”.

“Mais de quatro quintos (82,8%) disseram existir discriminação no país e cerca de três quartos (74,3%) consideraram que a discriminação com base na origem étnica é frequente ou muito frequente (48,8% na população total). Mais de metade da população deste grupo étnico (52,7%) já testemunhou situações de discriminação (35,9% na população total)”, adianta o documento.

Na origem da discriminação, segundo o ICOT, é apontado “principalmente o conjunto de fatores já identificados na discriminação vivida, ou seja, cor da pele, território de origem e grupo étnico (91,2%), bem como fatores sociodemográficos, como a idade, sexo, escolaridade e situação económica (70,6%)”.

Também mais de metade da população de etnia cigana (52,7%) diz ter testemunhado situações de discriminação, mais do que os 35,9% assinalados na população total. O inquérito revela ainda que as pessoas que se identificaram como ciganas apresentavam “uma maior proporção de mulheres (56,6%, contra 51,7%, na população total)”, registando uma diferença de 13,2 pontos percentuais entre sexos naquele grupo étnico.

Também a população do grupo étnico cigano apresentava uma estrutura etária mais jovem (35% tinham idades entre os 18 e os 34 anos), do que a população total (25%), mas menos escolarizada.

O ICOT avança ainda que nove em cada dez pessoas de etnia cigana não tinham trajetórias imigratórias pessoais e familiares. “Observa-se que 88,1% das pessoas que se identificaram como ciganas não têm qualquer ‘background’ imigratório, isto é, são pessoas nascidas em Portugal e cujos pais e avós nasceram também em Portugal, numa proporção superior à observada na população total (81,5%)”, salienta.

O inquérito mostra que “a quase generalidade da população de etnia cigana (95,3%) nasceu em Portugal, o que compara com 87,5% de todos os residentes no país, tendo também 96,7% nacionalidade portuguesa (95,2% para a população total), a qual foi obtida maioritariamente por nascença (95,1%, o que compara com 89,9% para a população total)”.

As pessoas de etnia cigana privilegiam mais os espaços de maior proximidade, como o bairro (57,7%), vila ou cidade (63,2%), ou a região onde vivem (66,3%), por comparação com a população total, segundo o inquérito.

No mercado de trabalho, a população de etnia cigana tinha uma menor proporção de ativos (61,3%, para 70,8% na população total), posicionando-se maioritariamente no primeiro quintil da distribuição de rendimentos, ou seja, nos 20% da população com rendimentos mais baixos (72,6%).

As pessoas de etnia cigana avaliaram genericamente a sua saúde como muito boa ou boa (62,0%), embora assinalando uma maior proporção de doenças crónicas. Este grupo populacional também apresentava valores muito abaixo da média nacional na propriedade (30,6% contra 70,8% na população total) e conforto térmico da habitação (46,8% conttra 72,3%), bem como no acesso à internet (74,2% contra 91,8%) e a automóvel (55,1% contra 75,6%).

O ICOT foi realizado em todo o território nacional com uma amostra de 35.035 unidades de alojamento, constituindo a maior amostra de inquéritos às famílias realizados pelo INE. Foi entrevistada apenas uma pessoa por alojamento, selecionada pelo método do último aniversário no alojamento, tendo sido obtidas 21.608 entrevistas completas.