O embaixador de Cabo Verde em Portugal disse hoje que até agora nada se alterou em Portugal para imigrantes portadores de vistos CPLP, mas admitiu que a revogação da “manifestação de interesse” terá impacto para muitos cidadãos lusófonos.
Até agora, “o que o Governo português ainda alterou e revogou foi a manifestação de interesse, mais nada”, afirmou Eurico Monteiro, em declarações à Lusa, a propósito do impacto das alterações anunciadas na legislação sobre imigração em Portugal para cidadãos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).
“Tudo aquilo que existia continua a existir”, sublinhou o diplomata, e também “não foi introduzida nenhuma alteração nas tipologias de vistos de entrada” no território português, acrescentou, pelo que vistos e autorizações de residência CPLP continuam a existir.
Assim, os detentores de residência CPLP continuam a não ter acesso ao espaço Schengen, por exemplo, admitiu.
Para Eurico Monteiro, o Governo português anunciou um conjunto de medidas que, “na sua essência, têm a ver muito mais com a integração do que com qualquer espécie de restrição ou compressão nas fronteiras, na entrada aqui em Portugal”.
No entanto, o diplomata admitiu que a “revogação da manifestação de interesse” tem impacto para muitos imigrantes de países lusófonos, bem como para os oriundos de outros Estados, porque funcionava como uma possibilidade de “legalização dos ilegais”, que entravam no país com vistos de curta duração e depois conseguiam um trabalho e queriam a autorização de residência.
Além disso, o facto de o Governo ter dito que “vai visitar toda a legislação”, cria expectativa e “ansiedade”, considerou.
Como representante em Lisboa da presidência cabo-verdiana da CPLP, na altura, o embaixador foi um dos negociadores do Acordo de Mobilidade assinado entre todos os Estados-membros daquela comunidade, em julho de 2021, na Cimeira de Chefes de Estado e de Governo que decorreu em Luanda, e defende que nada deste documento está em causa com as alterações legislativa em Portugal.
Para o diplomata cabo-verdiano, “é evidente que quando existe na atmosfera geral um sentimento de que é preciso controlar a imigração, que isto está um pouco descontrolado, isso pode ter reflexos na conduta dos funcionários consulares, que começam a olhar (…) com mais cuidado e talvez até numa perspetiva mais restritiva”.
Essa atmosfera resulta da “pressão europeia e dos partidos radicais, que já transformaram a imigração no grande problema europeu”, referiu.
Quando os atores políticos começam a falar sobre migrações “cria-se alguma ansiedade, as pessoas ficam expectantes e Portugal tem uma comunidade imigrada (…) dos países da CPLP, dos países africanos e particularmente do Brasil”, importante, lembrou.
“A dimensão da mobilidade entre países é essencial” e não é apenas “no plano formal da relação entre os Estados”, é “entre os povos, as organizações da sociedade civil”, declarou, salientando que “é tudo isto que cria uma cultura de antipatia ou de simpatia, de maior ou menor proximidade” entre Estados.
A 04 de junho entraram em vigor as novas regras para a imigração em Portugal, com a publicação em Diário da República do decreto-lei que altera a Lei n.º 23/2007, de 04 de julho, procedendo à revogação dos procedimentos de autorização de residência assentes em manifestações de interesse.
Uma alteração de 2017 à lei de estrangeiros permitia, “através de uma manifestação de interesse, a regularização da permanência em território nacional, por meio do exercício de uma atividade profissional subordinada ou independente, sem visto válido para o efeito”.
No decreto-lei agora publicado, o Governo considera que a “possibilidade de regularização de imigrantes que não se encontravam munidos de um visto consular de residência” foi uma medida “irrefletida” que comprometeu “os princípios assumidos por Portugal e pelos parceiros europeus no Espaço Schengen”.
Para entrar no “regime geral de obtenção de autorizações de residência”, bastava “o registo de manifestação de interesse e a mera promessa de contrato de trabalho”.
Em 2019 foi feita uma nova alteração, que permitia a regularização de imigrantes desde que tivessem “a situação regularizada perante a segurança social há, pelo menos, doze meses”.
“Com estas alterações, admitiu-se, de forma clara, a possibilidade de qualquer cidadão estrangeiro permanecer em território nacional, ainda que tenha entrado de forma irregular no país”, refere o decreto-lei agora publicado.