Na campanha para as Legislativas de 1976, o PS quis vincar a sua matriz europeísta e lançou o slogan “A Europa Connosco”, com cartazes, bandeiras e autocolantes um pouco por todo o país. Essa estratégia culminou com um grande comício no Palácio de Cristal, no Porto, em que Mário Soares convidou vários dirigentes socialistas e sociais democratas para discursarem, entre eles, Willy Brandt, François Mitterrand, Felipe Gonzalez, Olof Palme, Francesco de Martino…
Foi a primeira vez que no Portugal democrático sentimos que fazíamos parte de uma grande família europeia, naquele tempo exclusivamente ocidental, ainda que apenas de um campo ideológico. Mas a Europa democrática estava de facto com Portugal e com os portugueses e desejava que o nosso país seguisse os padrões de desenvolvimento que eles próprios tinham atingido no pós-Segunda Guerra Mundial.
Quase 50 anos depois, tivemos novas eleições europeias e, apesar de Portugal não poder dar lições de desenvolvimento a metade dos Estados da União Europeia, demos uma lição de cidadania, contrariando boa parte da vaga extremista que se sentiu por muitos Estados. As duas forças políticas do centro, PS e AD, conquistaram 15 eurodeputados em 21 e, juntos, têm cerca de 63% dos votos, quase dois terços dos que votaram. E isto é claramente uma boa notícia, após umas legislativas em que cada um destes partidos não alcançou 30%.
Mais, o Chega passa de 18% para 9%, mostrando que é possível fazer diminuir o voto nas forças populistas, ainda que seja muito cedo para poder considerar que este partido se encontra em fase descendente. O cabeça de lista era muito fraco, as europeias não são eleições fáceis em Portugal, dada a elevada taxa de abstenção, e o facto de ter havido eleições há três meses também não ajuda partidos que vivem de um eleitorado de protesto. Ainda assim, o Chega parece ter consolidado um eleitorado fiel que se aproxima dos 400 mil votos.
Mas foi, apesar de tudo, um bom resultado para quem acredita no centro, nos moderados e na democracia. Nesse sentido, a Europa devia estar connosco. O crescimento das extremas-direitas foi notório, ainda que não tenha tido a gravidade que algumas sondagens previam. É um grande desafio para os europeus. A começar pelos franceses que, face à vitória esmagadora de Marine Le Pen, com o dobro dos votos do partido do presidente Macron, vão ter eleições legislativas antecipadas.
Também a AfD, partido da extrema-direita alemão, teve um excelente resultado, ficando em segundo lugar, atrás dos democratas cristãos da CDU. A pergunta que se impõe é esta: que Europa vamos ter nos próximos cinco anos face a este crescimento das forças populistas, algumas delas profundamente anti-democráticas? Felizmente há algumas razões para não sermos demasiado pessimistas.
O grupo do PPE (onde está a AD), do S&D (onde está o PS) e do Renew Europe (onde está a Iniciativa Liberal) perfazem 401 eurodeputados, mais de metade dos 720 eurodeputados que compõem o Parlamento Europeu. Será entre estes três grupos que boa parte da política europeia se fará. Não tanto no Parlamento Europeu, que não tem iniciativa legislativa, mas da Comissão Europeia e do Conselho Europeu. Por isso, dado estes resultados, Ursula von der Leyen tem fortes hipóteses de continuar como presidente da Comissão Europeia e os socialistas e democratas continuarem a presidir ao Conselho Europeu.
Neste último órgão é António Costa que parte na frente para o presidir. Porque pertence ao grupo S&D, porque foi primeiro-ministro durante muitos anos, porque ganhou prestígio não só na sua família política como noutras. E, sabemos desde a noite eleitoral, porque tem o apoio do governo do seu país, apesar de Luís Montenegro pertencer ao PPE. Mais uma vez, a Europa parece estar connosco.
Não sabemos se ter portugueses em altos cargos internacionais é algo que beneficia o país, mas certamente não será prejudicial e certamente aumentará o nosso prestígio. Freitas do Amaral, Durão Barroso, António Guterres, Mário Centeno são alguns dos nomes políticos que têm chegado ao topo das instituições europeias e mundiais. António Costa poderá ser o nome que se segue. Independentemente dos juízos de valor que se possam fazer da sua actuação como primeiro-ministro, ninguém duvidará que tem qualidades mais do que suficientes para exercer o cargo.
Veremos mais tarde se a Europa vai estar com António Costa.
Presidente do movimento Partido Democrata Europeu
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia