Os debates presidenciais não são uma tradição antiga, mas irromperam na política norte-americana com força em 1960, ajudando o “jovial” John F. Kennedy a derrotar o “cansado” Richard Nixon. Esses primeiros debates televisionados já fazem parte da história da comunicação, até pela forma como JFK venceu para quem o viu na televisão – a grande maioria –, mas não para quem o seguiu pela rádio.
Durante 16 anos estiveram ausentes das campanhas presidenciais, mas regressaram em 1976, quando o enfraquecido presidente Gerald Ford desafiou o seu adversário, o então governador da Geórgia, Jimmy Carter, a debater a convite da League of Women Voters. O repto não correu bem a Ford, mas, nos dois ciclos eleitorais seguintes, o republicano Ronald Reagan aproveitou a sua larga experiência como ator para vencer de forma categórica Jimmy Carter e Walter Mondale.
Em 1987, estes debates institucionalizaram-se com a criação da Commission on Presidential Debates, uma organização não partidária, mas com apoio dos dois principais partidos. Desde as eleições de 1988 que há dois ou três debates presidenciais, acrescidos de um entre candidatos a vice-presidente. A história dos últimos ciclos eleitorais passou muito por estes momentos, que normalmente se realizavam entre o final de Setembro e o mês de outubro. Mas Trump e Biden romperam com este passado.
O Partido Republicano já se tinha retirado desta comissão em 2022, alegando que era controlada pelos Democratas, anunciando que não voltariam a participar nela. Mais tarde, Trump reverteu essa posição e afirmou que estaria disposto a participar em qualquer debate com Biden. Mas foi o próprio presidente esta semana que deu uma machadada final na comissão, declarando que não aceitava o calendário já proposto. Isto porque propunham organizá-los numa altura em que eleitores de alguns estados já poderiam votar antecipadamente. Com este argumento, Biden recusou esses debates e afirmou a sua disponibilidade para debater com Trump na CNN a 27 de junho e na ABC News a 10 de setembro. O republicano já aceitou estas datas e demonstrou vontade para debater com o “Crooked Joe” também em Julho e Agosto, além de propor a realização de um debate entre os candidatos a vice-presidente.
Ainda é incerto o calendário final. Mas sabe-se que Biden decidiu antecipá-lo porque está à defesa e as sondagens não são as melhores. A tese é clara: se sair por cima no primeiro debate em junho, passará o verão ao ataque e demonstrará que tem força física e intelectual para ser presidente. Neste momento, a sua maior fragilidade. Se correr mal, terá ainda o segundo debate e tempo para recuperar. Isto até contando que também se pode sair mal no segundo debate. Se o último fosse já em outubro, como a comissão propunha, isso deixaria pouco tempo para ultrapassar essa prestação. Não deixa de ser uma manifestação de fragilidade da campanha de Biden, que mostra receio pela sua prestação pública. Aliás, têm sido cada vez mais raras as aparições públicas e conferências de imprensa. Mas, ao mesmo tempo, baixa as expectativas, o que poderá beneficiar as suas prestações e o impacto nos eleitores.
Já Donald Trump está a demonstrar uma confiança inabalável, apesar de o calendário ter riscos, pois o primeiro debate será pouco tempo depois do desfecho do seu julgamento em Nova Iorque, onde poderá ser condenado. Os seus apaniguados continuam a criticar o sistema e os canais de notícias que vão receber os debates, que são habitualmente mais hostis aos republicanos. Lara Trump, a sua nora e co-presidente do Republican National Committee, já afirmou que serão “injustos” para Trump. A habitual vitimização. Mas a verdade é que os Democratas agiram de forma a deixar a Fox News de fora destes debates, alegando que apenas canais que organizaram debates das primárias republicanas de 2016 e democratas de 2020 poderiam receber os candidatos. Ora, precisamente estes dois.
A única coisa de que podemos ter a certeza é que serão momentos extremamente impactantes na corrida eleitoral. Até ao momento, o debate com mais espectadores da história foi entre Donald Trump e Hillary Clinton, com 84 milhões. Será que este ano baterá o recorde?
Especialista em política norte-americana