O combate à corrupção foi uma das bandeiras que a AD incluiu no programa eleitoral que levou a votos no dia 10 de março. Considerando que a corrupção “é um dos maiores problemas que afeta a qualidade da democracia” e a “eficiência da gestão pública”, a AD lembrava no seu programa eleitoral que se mantêm “elevados os sentimentos de desconfiança dos portugueses e dos organismos internacionais sobre a eficácia das políticas de combate à corrupção em Portugal”.
Por isso, assim que foi empossado como primeiro-ministro, na terça-feira, juntamente com os 17 ministros do 24.º Governo Constitucional, Luís Montenegro anunciou que a ministra da Justiça, Rita Júdice, teria como primeira missão convocar todos os partidos para se tentar um “consenso político” em torno de um pacote anticorrupção. Montenegro fez questão de deixar claro que o governo tem as suas propostas, mas que as da oposição também devem ser analisadas e tidas em conta. A síntese de todas as propostas deverá estar concluída dentro de dois meses. Um dia depois, nesta quarta-feira, a ministra seria mandatada para esta tarefa naquele que foi o primeiro Conselho de Ministros do novo governo.
Veja as propostas da AD para o combate ao crime de corrupção:
– Criar o crime de enriquecimento ilícito, que no passado chegou a ser tentado, mas esbarrou no Tribunal Constitucional.
– Em alternativa ao enriquecimento ilícito, ponderar a criação legal de mecanismos como a “Ação Cível para Extinção de Domínio” ou unexplained wealth orders, que permite ao Estado português recuperar bens adquiridos por particulares através de atividades ilícitas, independentemente de uma condenação penal do proprietário dos bens.
– Regulamentar o lobbying, o que incluirá a criação de um registo obrigatório e público de lobistas e de entidades representadas. Esta base de dados incluirá todos os representantes de interesses legítimos que pretendam contactar entidades e decisores públicos, incluindo órgãos de soberania, administração pública e reguladores. O registo deve ser comum a todas as entidades públicas, obrigatório, de acesso público e gratuito e consultável por todas as entidades públicas.
– Criar o Código de Conduta do Registo de Transparência para os representantes de interesses legítimos e das entidades públicas, que estabeleça regras gerais para as relações entre representantes de interesses legítimos e entidades públicas, bem como impedimentos e incompatibilidades.
– Que passe a ser obrigatório publicitar as reuniões de todos os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos com grupos de interesse.
– Criar períodos de cooling-off para que quem tenha desempenhado cargos políticos, públicos ou funções em entidades públicas não possa dedicar-se ao exercício da atividade de representante de interesses, nem voltar a interagir com a entidade pública na qual trabalhou.
– Criar a chamada “Pegada Legislativa” do governo, através da publicação no seu portal na internet das várias etapas de cada processo legislativo e regulamentar do executivo.
– Reforçar as regras de transparência, controlo dos conflitos de interesses, incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, incluindo o alargamento do período de nojo para o exercício de funções em entidades privadas relacionadas com a sua área de atuação.
– Delimitar as regras existentes quanto ao exercício de funções posteriores ao exercício do cargo político.
– Implementar um modelo de registo centralizado de ofertas e hospitalidades na Assembleia da República e governo.
– Alargar regras de impedimentos e incompatibilidades a todos os membros dos gabinetes ministeriais.
– Aplicar as regras de prevenção de conflitos de interesses em negócios envolvendo o sector público com o sector privado, nomeadamente as PPP e os grandes contratos de obras públicas e de contratação pública.
– Criar incompatibilidade para cargo público por exercício de prévias funções como magistrados judiciais e do Ministério Público nos três anos anteriores.
– Criar a figura do provedor do utente em serviços públicos com atendimento ao cidadão, com competências para receber denúncias e queixas dos utentes, bem como para auditar os serviços e de emitir recomendações vinculativas, que sejam objeto de resposta obrigatória pelos serviços.
– Alargar normas anticorrupção aos partidos políticos, passando a ser obrigatória a implementação de planos de prevenção de riscos, códigos de conduta, designação de um responsável de cumprimento normativo e canais de denúncia internos, bem como existência de formação interna nestas matérias.
– Apostar no recurso às tecnologias digitais para aumentar a transparência e reduzir a burocracia nos processos de decisão pública e adotar programas de inteligência artificial para identificar padrões decisórios suspeitos.
– Publicar todas as decisões judiciais, de todos os tribunais, incluindo os de primeira instância, online, cumprindo as recomendações do GRECO.
– Reforçar os recursos humanos, materiais, organizativos e tecnológicos disponíveis para o combate, investigação e ação penal relativamente à corrupção e outros crimes no exercício de cargos públicos.
– Agravar as sanções previstas no Regime Geral de Prevenção da Corrupção equiparando-as à legislação de prevenção do branqueamento.
– Alargar e robustecer as medidas de direito premial do Código Penal, expandindo os âmbitos subjetivo, temporal e objetivo da dispensa de pena, com vista a favorecer a descoberta da verdade e a carreação de prova em processos-crime.
– Fixar no Código do Processo Penal o limite máximo de 72 horas para decisão jurisdicional após detenção, permitindo a intervenção de mais do que um juiz no processo para tal efeito.
– Incluir conteúdos curriculares sobre a prevenção e o combate à corrupção, nos diferentes níveis de ensino.
– Divulgar as boas práticas e os casos de sucesso na prevenção e no combate à corrupção, reconhecendo e valorizando os exemplos de transparência e de integridade, e incentivando a replicação e a disseminação dessas melhores práticas.