Este ano realizam-se eleições nacionais em 64 países, um número sem precedentes, que só deverá ser repetido daqui a 24 anos, se forem cumpridos os ciclos eleitorais, segundo as projeções do Instituto Integridade — isto sem contar com a escolha dos deputados ao Parlamento Europeu e com as presidenciais na Somalilândia, uma região no norte da Somália, que se declarou independente em 1991 mas ainda não é reconhecida por nenhum Estado.

Estão em causa eleições presidenciais, legislativas, regionais e locais, muitas das quais podem alterar significativamente os quadros políticos internos mas ter também reflexos internacionais, num período em que se tornaram notórias tensões geopolíticas.

Estes são seis atos eleitorais a que teremos de prestar atenção durante o ano.

Presidenciais em Taiwan – 13 de janeiro

As eleições em Taiwan podem contribuir para definir o tom das relações entre os Estados Unidos da América (EUA), que tem estreitado relações com a ilha, e a República Popular da China, que a considera parte do seu território. No discurso de fim do ano, o presidente chinês, Xi Jinping, reiterou que a reunificação de Taiwan com o continente é inevitável.

As sondagens indicam que o atual vice-presidente e candidato pelo Partido Democrático Progressista (DPP, na sigla em inglês), Lai Ching-te, é o favorito, recolhendo mais de 37% das intenções de voto e quatro pontos de vantagem sobre Hou Yu-ih, candidato do Kuomintang, que tem subido nas sondagens. Concorre um terceiro candidato, Taipé Ko Wen-je, pelo Partido do Povo de Taiwan, porque os dois partidos da oposição não conseguiram acordar uma proposta comum.

Todos pretendem manter a atual situação, em que a independência de Taiwan não é reconhecida e a ilha não é integrada na China, mas Pequim encara Lai Ching-te como separatista e um inédito terceiro mandato consecutivo do DPP não ajudará a reatar as relações oficiais, que Pequim encerrou em 2016, quando o DPP chegou ao poder.

Eleições gerais na Índia – abril/maio (data indefinida)

A opinião generalizada é que o Partido Bharatiya Janata (BJP, na sigla inglesa) está bem posicionado para vencer as eleições legislativas na Índia, assegurando um terceiro mandato consecutivo, mesmo que não alcance os 353 mandatos que tem atualmente no Lok Sabha, a câmara baixa do parlamento indiano.

O BJP lidera as sondagens e venceu em três dos cinco estados em que se realizaram eleições regionais, em dezembro, beneficiando de uma colagem muito direta ao seu principal ativo, o primeiro-ministro, Narendra Modi, que continua a ser, de longe, o mais popular político na Índia — mesmo que, desta vez, a Aliança Democrática Nacional, a coligação liderada pelo BJP, enfrente uma oposição unida em torno do Congresso Nacional Indiano, o segundo maior partido do sistema, que obteve 48 lugares em 2019, mas que com a coligação feita chega aos 138.

Com Narendra Modi, a Índia tem assumido um papel mais interventivo na cena internacional, como parte dos BRICS e com a presidência do G20, no ano passado, e tem sido cortejada, nomeadamente pelos EUA, que encaram a maior democracia do mundo como um possível contraponto às ambições chinesas.

Eleições para o Parlamento Europeu – 6 a 9 de junho

Os resultados de eleições nacionais e as sondagens que têm sido feitas nos 27 Estados-membros da União Europeia (UE) indiciam que o Parlamento Europeu deverá virar mais à direita e que os dois grupos que têm sido estruturais – Partido Popular Europeu (PPE) e Socialistas e Democratas (S&D) – vão continuar a ser os maiores, mas perdendo peso, o que os obriga a entendimentos com outras forças políticas para conseguirem maiorias.

Uma das principais questões será saber se estes dois grupos, aliados ao Renovar Europa, a terceira força política em Estrasburgo, conseguem manter mais de 50% dos deputados.

Prevê-se que o grupo dos Conservadores e Reformistas Europeus cresça, beneficiando das prestações dos Irmãos de Itália, que venceram eleições e são governo, e dos Democratas da Suécia, que também fazem parte de uma solução de governo. Sem peso suficiente para provocar alterações substanciais de políticas, terá maior capacidade de influência numa legislatura que lidará, por exemplo, com questões de geopolítica, segurança e económicas, e com o alargamento.

Eleições gerais na África do Sul (data indefinida)

Pela primeira vez desde que foram realizadas as primeiras eleições livres na África do Sul, em 1994, o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla inglesa) poderá perder a maioria na Assembleia Nacional, sendo obrigado a entender-se com outros partidos para se manter no poder. É isto que mostram as sondagens que têm sido publicadas para as legislativas e também para as eleições regionais, que se realizam em simultâneo e em que se verifica a mesma tendência, e seguem-se a umas eleições locais, em 2021, em que o ANC conquistou, a nível nacional, menos de metade dos votos.

A erosão da preferência pelo partido do presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, é explicada pelas dificuldades económicas que o país enfrenta, registando um crescimento reduzido, de 0,9% este ano e de 1,8% no próximo, uma taxa de desemprego consistentemente acima de 30% (atualmente de 32,8%) e problemas no abastecimento energético e no acesso a água potável. A segurança, com índices de criminalidade a subirem, e o combate à corrupção são também preocupações.

Eleições legislativas no Reino Unido – final de 2024 (data indefinida)

O primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, anunciou que convocará eleições legislativas durante este ano, como esperado, mas não antes do segundo semestre, justificando com a necessidade de acelerar o crescimento económico, mas procurando ganhar tempo para tentar inverter o que, de outro modo, se afigura como uma mudança no poder, depois de 14 anos de domínio do Partido Conservador.

Desde dezembro de 2021 que o Partido Trabalhista lidera as sondagens e os últimos inquéritos dão-lhe 44% das intenções de voto, o dobro do registado pelos tories, uma diferença que não era vista desde os tempos de Tony Blair. Acresce que 59% dos britânicos estão convencidos de que Keir Starmer, o líder trabalhista, ocupará o número 10 de Downing Street, e a sua taxa de aprovação supera a de Sunak em 11 pontos.

Mesmo assim, o histórico mostra que os incumbentes britânicos sofrem durante o mandato mas recuperam antes das eleições, o que beneficia Rishi Sunak, e os inquéritos indiciam que o Labour ainda tem de ganhar a confiança dos eleitores de que é capaz de encontrar soluções para problemas como o aumento do custo de vida, a crise no sistema de saúde ou a política de imigração.

Presidenciais nos Estados Unidos da América – 5 de novembro

As eleições norte-americanas têm sempre impacto interno, mas também consequências na política externa, com efeitos em todo o mundo, e as forças que, tudo indica, se vão opor no final do ano têm visões muito diferentes.

O incumbente, Joe Biden, deverá ser indicado pelo Partido Democrata para disputar as eleições com o candidato do Partido Republicano, que deverá ser Donald Trump, reeditando-se o confronto de 2020, a não ser que a justiça impeça Trump de concorrer.

Uma vitória do ex-presidente terá reflexos no apoio norte-americano ao esforço de guerra ucraniano contra a Rússia, em que os republicanos já sinalizaram querer limitações, no papel dos EUA na NATO ou nas relações com a China, mas também nas políticas de imigração ou nas políticas ambientais e de mitigação das alterações climáticas.

À entrada de um ano que será, na prática, de campanha eleitoral, Donald Trump tem liderado a maioria das sondagens quando o opõem a Joe Biden, mesmo que este vença em alguns dos estudos. Biden tem também a pior taxa de aprovação de um presidente na entrada do último ano do primeiro mandato, na era moderna, com 39%, menos quatro pontos do que Trump na mesma altura do seu mandato.

 

Artigo publicado na edição do NOVO de 6 de janeiro