Global Risks Report 2023: A “corrida contra o tempo” e a preocupação com o populismo
Especialistas salientaram ao NOVO os perigos do populismo e a importância da colaboração entre os líderes mundiais para enfrentar as crises globais.
Tendo em conta os riscos apontados no Global Risks Report de 2023, o NOVO pediu a dois especialistas de empresas que colaboraram com o Fórum Económico Mundial na realização deste relatório para perspectivarem os próximos anos.
Com a maioria das previsões a indicarem que 2023 deverá ser um ano mais difícil em termos sociais e económicos, à boleia do aumento do custo de vida e com o conflito na Ucrânia aparentemente sem fim à vista, o NOVO questionou Fernando Chaves, Risk Specialist da Marsh Portugal, sobre uma hipotética luz ao fundo do túnel no final deste ano.
“A crise associada à energia, ao aumento do custo de vida e ao fornecimento ou escassez de alimentos depende muito da rapidez com que algumas crises agudas, nomeadamente a guerra na Ucrânia, podem vir a ser resolvidas. No entanto, não só devemos ter em conta que, com o prolongar e agravar da situação, outros cenários de instabilidade podem surgir noutras geografias, ao que se junta o facto de que, mesmo que haja um desfecho positivo nos próximos meses, não seja previsível que se verifiquem melhorias consideráveis durante 2023”, frisou Fernando Chaves.
“Os próximos tempos obrigarão à gestão das urgências imediatas, à mitigação de riscos novos que possam emergir, mas sempre sem perder o foco no investimento para um mundo mais sustentável, apostando profundamente na transição energética, nas políticas sociais e na redução do fosso entre ricos e pobres, além da cooperação institucional bilateral, regional e global de governos e organizações internacionais”, realçou.
Com um panorama geopolítico bastante dinâmico actualmente, e face à proliferação de movimentos populistas que poderão ser exacerbados com as crises sociais nos próximos anos, a polarização das sociedades é um risco a ter em conta.
“O populismo está intrinsecamente associado à polarização crescente das sociedades. Este risco não é novo e vem ganhando força desde há muitos anos. Se consultarmos as publicações anteriores do Global Risks Report, encontramos destaque para algumas notas sobre os perigos do populismo e nacionalismo na edição de 2011, mas a partir de 2017 poderão verificar que esta polarização ganha uma força que, infelizmente, se tem agravado até ao presente”, constata Fernando Chaves. “Ao lançar o encontro deste ano sob a égide da ‘Cooperação num Mundo fragmentado’, o Fórum Económico Mundial está também a procurar consciencializar os líderes políticos, das organizações internacionais, dos grandes grupos empresariais e até a própria sociedade civil, para uma mudança de rumo e para a tomada de medidas não populistas, ou seja, implementação de reformas de fundo com impacto no futuro das gerações mais novas e vindouras, sob pena de virem a aumentar essa mesma polarização”.
Os riscos climáticos e ambientais têm lugar de destaque a curto e a longo prazo, mas as respostas a estes riscos têm sido relegada com frequência para segundo plano pelos líderes mundiais. Para Edgar Lopes, “o desafio que todos temos em mãos pode ser descrito como uma corrida contra o tempo”.
“A verdade é que entre muitos decisores ainda impera um foco muito grande nos riscos a curto prazo, em particular quando falamos de questões económicas e sociais mais imediatas. E, se não existir esta noção de que é essencial ter uma visão mais ampla e sistémica, vamos ficar muito aquém no que toca a mitigar riscos climáticos”, acrescenta o Chief Risk Officer da Zurich em Portugal.
“Acima de tudo, é importante assumirmos uma postura de urgência, mas não derrotista. Apesar dos riscos elencados no relatório, há ainda a oportunidade de mitigar efeitos mais catastróficos. O essencial a reter é que, se continuarmos a protelar acções concretas, suportadas em planos consequentes e mensuráveis, corremos o risco de comprometer o futuro do planeta que as gerações mais novas herdarão”, vinca Edgar Lopes.
O Global Risks Report 2023 deixa um apelo aos líderes mundiais para agirem colectivamente para reforçarem a estabilidade financeira e coordenarem a acção climática urgente. “A recomendação pela colaboração não é nova, mas é certo que sai muito reforçada nesta edição do relatório. Isto porque vemos o confronto geoeconómico aumentar, impulsionado pela pandemia, pela guerra na Ucrânia e pelas tensões EUA-China, mas também vemos que não podemos desviar o foco da estabilidade financeira e das alterações climáticas. Uma acção depende da outra e vice-versa”, refere o responsável da Zurich.
Edgar Lopes assinala que o Global Risks Report classifica a incapacidade de mitigar as alterações climáticas como uma das ameaças mais severas a curto prazo. “Mas também sabemos que é o risco global para o qual estamos menos preparados – 70% dos inquiridos no Global Risks Perception Survey classificam as medidas existentes para preparar ou prevenir as alterações climáticas como ‘ineficazes’ ou ‘altamente ineficazes’”, ressalva.
“É por isso que o Global Risks Report deixa claro que é necessário agir colectivamente e de forma acelerada sobre o clima. Temos de conseguir limitar as consequências de um mundo em aquecimento do planeta. Não temos como não colaborar. No limite, esta colaboração vai definir a nossa sobrevivência e a sobrevivência do planeta. Esta preocupação tem de estar no topo das prioridades dos governos, dos decisores políticos, dos líderes empresariais, das ONG e de todos nós”, declara, enfatizando um aspecto importante. “Não há ninguém, independentemente do cargo que ocupa, que não possa contribuir para um futuro mais sustentável”.