Faço novamente um disclaimer: Marcelo Rebelo de Sousa foi um muito querido professor da minha turma, muito antes de se pensar que viria a ser Presidente da República. Simpatias pessoais à parte, nem sempre concordo com ele, mas prefiro-o mil vezes, com os defeitos e as virtudes que todos lhe conhecemos, ao antecessor, cujas aparições me fazem recordar um célebre filme de terror.
Dito isto, ainda que não o conhecesse pessoalmente, quem se apoia nos princípios sabe que os mesmos se aplicam, com total independência da pessoa a quem nos dirigimos e, se calhar, até com mais ênfase quando não gostamos do visado, o que não é o meu caso. Por outro lado, confundir os pais com os filhos e vice-versa é um exercício a que cedo me habituei, por razões óbvias, mas que nunca foi correcto. Cada pessoa vale por si e cada pessoa responde pelos seus atos. Esta é uma regra basilar de qualquer Estado de Direito.
O que o Chega pretende fazer – além de assemelhar-se a uma tentativa de ajuste de contas por um debate muito falho de André Ventura, onde Marcelo lhe deu um baile épico – viola demasiados princípios de Direito Constitucional para que ninguém não diga isto de forma clara: os fins não justificam os meios, em especial quando o fim último deste partido é a promoção do seu líder. Se há aqui barricadas, o lado certo é dos princípios e não o daqueles que os fingem ter para, em política de terra queimada, entrarem em autoelogios mais ou menos assumidos.
Já em contagem decrescente para ir para Porto Santo, o meu destino há 47 anos, dou por mim a pensar neste verão que, ao contrário de outros, não me traz esperança num mundo melhor. Enquanto discutimos fracassos nos Jogos Olímpicos ou na identidade dos próximos jogadores do Sporting ou do Benfica, caminhamos para uma crise de valores total.
Não me revejo num mundo em que temos de ter muitíssimo cuidado com o que dizemos para não ferir susceptibilidades, mas em que convivemos com o sofrimento alheio com total indiferença. Também não me revejo num ambiente em que fingimos ser todos muito bonzinhos, muito preocupados com tudo e todos, quando apenas visamos, na realidade, obter uns likes nas nossas redes sociais para fazermos umas quaisquer parcerias que nos darão uns produtos ou umas viagens de borla. Por último, não me revejo num mundo em que tudo se tornou descartável, começando nas pessoas e acabando nos animais que, sentindo-se da nossa família, abandonamos, sem dó, piedade ou remorso, ao menor sinal de incómodos, como este verão tem demonstrado.
No meu mundo ideal as pessoas discutem ideias. Podem até desentender-se, mas não há cartas escondidas, agendas não reveladas ou jogos de poder em que as vítimas são aqueles que se dizem querer salvar.
No meu mundo ideal há menos vídeos – reels, ou lá como se chama agora… – e mais livros. O tempo passa mais devagar e não ao ritmo de cliques. Fala-se em português e sem anglicismos desnecessários.
No meu mundo ideal há amizades. Reais, genuínas e não relações de ocasião que, normalmente, fazem o ladrão, como o velho ditado ensina.
No meu mundo ideal há pessoas. Há bichos que integram famílias. Há conversas, sem pressa. E sorrisos.
O meu mundo ideal está cada vez mais longe de se concretizar. Também por causa disso, olharei para o azul do mar, em especial o de Porto Santo, com a (des)esperança de quem, sabendo que nada vai mudar, fará o que puder para melhorar. No final de tudo, o que fica de nós é o que conseguimos fazer e eu não peço mais do que saber manter-me fiel aos meus princípios, de preferência de pé no mar e olhar no céu.
Boas férias a todos.