“Uma atrocidade enorme”: abate “cego” de 300 sobreiros junto à Linha do Vouga gera revolta

Quercus denuncia abate ilegal e apela ao fim do corte “indiscriminado” de árvores centenárias junto à Linha do Vouga. Ao NOVO, o ICNF assegura que vai “proceder de forma adequada à verificação da situação dentro das suas competências”.

“Uma atrocidade enorme”: é desta forma que a população da zona de Águeda vê o abate de mais de 300 sobreiros junto à Linha do Vouga, uma acção que está a gerar indignação. A Quercus denuncia ilegalidade, apela ao fim do abate indiscriminado e exige esclarecimentos.

Segundo a associação ambientalista, uma empresa subcontratada pela Infra-Estruturas de Portugal (IP) está, desde o dia 21 de Março, a executar o abate dos sobreiros na zona envolvente à Linha do Vouga, constando existir autorização do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

No entanto, “apesar de alguns sobreiros não se encontrarem cintados de branco conforme requisito legal, o madeireiro já se encontra no local a cortar todas as árvores”, denuncia a Quercus, frisando que a maioria destes sobreiros “não representam perigo de queda e nem todos estão na faixa de gestão de combustível dos dez metros, pois alguns estão em zona urbana ou agrícola”.

Apelando à suspensão do abate de sobreiros até “cabal esclarecimento deste processo”, os ambientalistas lembram que o “desaparecimento destas árvores é uma grande perda ambiental, paisagística e cultural que devia ser evitada”, pois parte delas, nomeadamente os sobreiros, “podia ter sido podada, cortando apenas alguns ramos e evitando o seu corte”.

Ainda de acordo com a Quercus, constatou-se no local que “alguns dos sobreiros já cortados, além de saudáveis, não estavam a causar problemas à circulação dos comboios”.

Por outro lado, sustenta a associação, “além de cumprirem uma função de protecção e estabilização dos taludes nas zonas com declive, debaixo destes não cresciam acácias como na zona envolvente”. “Sem estes, não só vai existir mais erosão como irá proliferar o acacial já instalado”, prevê a Quercus, assinalando que o sobreiro, além de espécie protegida, é considerado desde 2011 a Árvore Nacional de Portugal, devido ao seu valor económico, social e ambiental.

“Continuamos a assistir a situações deste género, promovidas por entidades públicas, que deveriam fazer muito melhor gestão e protecção do património natural da região e do país”, remata.

Questionado pelo NOVO, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas esclarece que o abate destas árvores junto à Linha do Vouga foi “devidamente autorizado a 5 de Maio de 2022, a pedido da Infra-Estruturas de Portugal (IP), na qualidade de entidade gestora da linha ferroviária”.

À IP foi então concedida uma autorização – válida até 5 de Maio de 2023 – para o corte de sobreiros ao longo de 16 quilómetros da linha, “considerando a necessidade de garantir a segurança da circulação ferroviária e dos trabalhos que se encontram a decorrer com vista à sua requalificação, a que acresce a necessidade de dar cumprimento à legislação de Defesa da Floresta Contra Incêndios”, sendo a IP, neste caso, “a responsável legal pela execução da faixa de gestão de combustíveis”.

No entanto, tendo tido conhecimento de informações que dão conta de que poderão estar a ser cortados sobreiros cujo abate não foi autorizado, “o ICNF irá proceder de forma adequada à verificação da situação dentro das suas competências”, assegura.

O NOVO tentou obter um esclarecimento junto da Infra-Estruturas de Portugal, aguardando ainda uma resposta.

A polémica levou já Inês de Sousa Real, deputada única do PAN, a lamentar a situação e a questionar, no Twitter: “Para quando uma política ambiental séria neste país?”

População contra abate cego
Na localidade de Jafafe, em Macinhata do Vouga, no concelho de Águeda, a população colocou bandeiras nacionais nos sobreiros para tentar evitar o seu abate, um protesto acompanhado e divulgado pela Quercus no seu site.

A população defende que os sobreiros em causa não interferem com a passagem do comboio, lamentando o corte destas árvores centenárias. “Não encontramos aqui justificação plausível para o corte de forma cega dos nossos sobreiros”, afirma um popular. Outro acrescenta: “Queremos mostrar a nossa indignação perante o que achamos uma atrocidade enorme, cortarem árvores que fazem parte da nossa paisagem.”

“Era evitável estarmos aqui, se as pessoas tivessem um pingo de noção daquilo que estão a fazer”, critica também Palmira de Oliveira Abreu, natural daquela região. “O que está a acontecer é horrível. Estamos a perder árvores que nos fazem falta. Se tal coisa acontecer, garanto-vos: vou-me embora daqui”, ameaça ainda.