O principal objetivo de Joe Biden era provar aos americanos que possuía as condições físicas e mentais para mais quatro anos na Casa Branca. Mas não há outra forma de o dizer: foi um completo desastre. Nenhum analista político sério se atreverá a afirmar que o presidente norte-americano saiu por cima deste debate. Os pedidos para retirar-se da corrida tornaram-se evidentes ainda durante o próprio debate, apesar da prestação de Donald Trump também não ter sido brilhante. O ex-presidente mentiu diversas vezes e foi excessivamente agressivo, embora o formato do debate o tenha favorecido.

O mais trágico para Biden é que, devido à sua atuação, Trump venceu facilmente o debate e a sua fraca prestação não será sequer alvo do normal escrutínio pós-debate. Ficou claro, desde a primeira intervenção de Biden, que seria uma noite desastrosa. Com uma voz titubeante e hesitante – a sua campanha divulgou, durante o debate, que estava com uma gripe –, perdeu-se no raciocínio em diversos momentos e não conseguiu desmontar de forma eficaz várias das mentiras do seu adversário. Pior ainda, algumas frases que pronunciou eram imperceptíveis e, não raras vezes, mudou de argumentos de forma incoerente. A sua frase “derrotámos o Medicare” foi talvez um dos momentos mais caricatos para muitos americanos.

Não foi um debate normal, onde um candidato teve uma má prestação. Chegou a ser penoso ver a fragilidade do homem mais poderoso do planeta exposta desta forma. O Partido Democrata e a equipa de Biden arriscaram antecipar o debate para eliminar as dúvidas sobre a sua capacidade mental, mas apenas conseguiram provar que não há dúvidas: Biden já não tem condições para liderar o país. O que poderá suceder agora, com um partido em pânico face à forte possibilidade de Donald Trump regressar à Sala Oval?

Muitos democratas já pediram a sua desistência e outros poderão juntar-se ao esforço para tentar que Joe Biden desista desta candidatura. Esta é a única forma de ele não ser o candidato, pois já está, na prática, nomeado pelos eleitores americanos. No artigo da semana passada, levantei essa possibilidade que, infelizmente para os Democratas, acabou por se concretizar. Surgiram ontem vários apelos para que nomeiem outra pessoa na convenção de Chicago do próximo mês de agosto, inclusive de muitos republicanos e conservadores que não querem ver Trump novamente à frente dos destinos do país. Seria inédito na era moderna um candidato desistir nesta fase e diz quem conhece Biden que nunca o fará. Será mesmo assim?

Além disso, mesmo que seja convencido a abandonar a corrida, o trágico para os Democratas é que não há ninguém óbvio para lhe suceder. Kamala Harris, a vice-presidente, é mais impopular do que Biden e poucos a consideram apta para o cargo. Esta é, aliás, outra das grandes fragilidades desta candidatura: o presidente é considerado por muitos americanos – e, depois de ontem, por muitos mais – como incapaz de liderar o país e a sua número dois não é credível.

A quem poderiam os Democratas recorrer? Vários governadores têm sido mencionados, como Gavin Newsom, da Califórnia; Gretchen Whitmer, do Michigan; ou JB Pritzker, do Illinois. No entanto, além de não ser um processo fácil, uma campanha presidencial está sujeita a um escrutínio brutal e estes ou outros nomes ainda não passaram por isso a nível nacional. Seriam sempre alvos fáceis para a trituradora máquina republicana e muitos consideram que é demasiado tarde para mudar de candidato. Contudo, não tenho dúvidas de que, se houver uma queda acentuada nas sondagens, a pressão para um novo candidato será muito forte. Especialmente dos muitos candidatos a governadores, senadores e congressistas que podem ser arrastados por Biden nas diferentes eleições de novembro. Será que o Old Joe aguenta?

Especialista em política norte-americana