Sobreviventes do Holocausto alertaram, numa carta aberta, os jovens eleitores contra a extrema-direita, para travar a ascensão do partido Alternativa para a Alemanha (AfD) nas eleições europeias desta semana.
“Para milhões de vós, as eleições europeias são as primeiras das vossas vidas. Para muitos de nós, podem ser as últimas”, escreveram oito homens e mulheres, com idades compreendidas entre os 81 e os 102 anos, na carta aberta apresentada numa conferência de imprensa em Berlim, capital alemã.
As eleições, que se realizam de 6 a 9 de junho nos 27 Estados-Membros da União Europeia, deverão ser marcadas por uma mudança significativa à direita em muitos países, com os partidos populistas de direita radical a ganharem votos e lugares em toda a União Europeia, segundo as sondagens.
O apelo dos sobreviventes surge numa altura em que a AfD goza de uma popularidade crescente entre os jovens, que podem votar a partir dos 16 anos na Alemanha para estas eleições. Uma sondagem publicada em abril mostrava que o partido era agora o preferido dos jovens entre os 14 e os 29 anos, com 22% das intenções de voto, o dobro do valor de há dois anos.
Ruth Winkelmann, 95 anos, disse à AFP que assinou a carta “porque o AfD está a tornar-se demasiado forte”, considerando que o partido tem “muito em comum” com os nazis dos anos 30, que também eram “contra outras pessoas, que são diferentes”. Filha de um pai judeu e de uma mãe protestante que se converteu ao judaísmo para casar, Ruth Winkelmann lembra-se de ver as montras das lojas judaicas destruídas a caminho da escola, quando era criança, na Berlim dos anos 30.
Depois de o pai ter sido deportado para Auschwitz, em 1943, escondeu-se com a mãe e a irmã num barracão no jardim. Quando a guerra finalmente terminou, Ruth disse que caiu nos braços da sua mãe e gritaram de alegria: “Sobrevivemos, agora somos livres!”.
Walter Frankenstein, 99 anos, também estabelece paralelos entre o atual clima político e o dos anos 30, com “um governo democrático fraco e um partido que reunia os descontentes”. Pedreiro de formação foi recrutado para trabalhos forçados. Com a mulher, Léonie, passou à clandestinidade com os dois filhos pequenos e sobreviveu aos últimos dias da guerra, no final de abril de 1945, num bunker público.
“Os jovens de hoje não devem dizer apenas ‘não sei em quem votar, por isso não vou de todo’”, afirmou Walter Frankenstein numa mensagem de vídeo, em que insistiu que a “democracia tem de ser defendida uma e outra vez”.
Eva Umlauf, 81 anos, tinha dois anos quando foi libertada com a mãe do campo de refugiados de Auschwitz, onde chegaram em novembro de 1944, vindas da Eslováquia, poucos dias depois de os nazis terem deixado de gasear os prisioneiros até à morte.
“Uso o número que me foi gravado no antebraço em Auschwitz como recordação de outros tempos. Um tempo que não deve ser repetido”, defendeu.
Leon Weintraub, 98 anos, que passou a maior parte da sua juventude em vários campos de concentração, também alertou para o risco de a história se repetir.
“Quatro em cada cinco dos meus familiares próximos foram assassinados. Esta é a consequência destes pensamentos radicais, do desprezo pelos outros, da xenofobia”, declarou.
Um estudo realizado em janeiro pela Claims Conference, uma organização que procura obter compensações para os sobreviventes do Holocausto, revelou que o número de sobreviventes em todo o mundo tinha diminuído para 245.000, com uma idade média de 86 anos.