A Convenção da Aliança Democrática (AD) do último domingo angariou comentários de um pouco por todo o espetro político. Luís Montenegro deveria prestar atenção a todos, não somente às críticas construtivas de quem irá votar na AD, e aos comentários positivos de quem não partilha do seu espaço político.

Relativamente a este primeiro tipo de opiniões, tenho algo a apontar, o que fiz, aliás, repetidamente. O evento pareceu-me fechado, virado para dentro. Isto é especialmente preocupante quando a última sondagem da Intercampus – feita antes da Convenção – revela uma diferença de apenas quatro pontos percentuais a separar a AD do Chega, com o PS em primeiro lugar isolado em intenções de voto, embora a esquerda não tenha maioria parlamentar. Sobram 15% de indecisos que a AD terá obrigatoriamente de tentar recrutar.

A importância destes eventos é fundamental para o crescimento eleitoral da direita democrática e é essencial que consiga roubar votos ao centro que iriam para o PS; inspirar o sector revoltado do eleitorado do Chega, com perspetivas reais de mudança; e apelar ao voto útil que iria para a Iniciativa Liberal fora dos grandes centros urbanos em torno de Lisboa, Porto e Braga.

Para o primeiro eleitorado, tendo em conta a questão demográfica vigente, há que continuar (e melhorar) a estratégia que Luís Montenegro já começou: reconciliar os pensionistas e reformados. A sua premissa de não prometer o impossível afastará, à partida, comparações a Pedro Passos Coelho, uma figura (ainda hoje) extremamente polarizadora. Este eleitorado ao centro tende a ser egoísta e menos ideologicamente vincado e é talvez o menos complicado para converter exatamente por causa disso. A promessa de aumento das pensões ao longo de duas legislaturas será decerto bem-vinda, especialmente se acompanhada por uma requalificação do sistema de Segurança Social, já que será praticamente impossível, a longo prazo, conseguir arcar com este encargo numa população tendencialmente envelhecida.

Para o segundo eleitorado, que, não estando ideologicamente alinhado, votaria Chega em protesto, a AD terá de demonstrar que é uma alternativa clara e inequívoca ao PS. A insistência no “plano de emergência” para a saúde é fundamental, assim como o é a (embora tardia) associação e solidariedade para com os polícias. Urge a criação de uma estratégia séria de imigração por parte da AD, porque em temas de que só o Chega fala apenas o Chega conseguirá angariar eleitorado.

Para o terceiro eleitorado, o alívio da carga fiscal, tanto para particulares como para empresas, é o caminho a seguir para a AD. A bandeira da salvação da classe média poderá ser um dos seus maiores trunfos.

O quarto tipo de eleitorado está escondido, e chama-se abstenção. É esta a chave para uma possível vitória da AD, já que os eleitores do Chega irão às urnas em força: quanto mais infelizes com o status quo, quanto mais afastados do centro político, maior será a sua participação. É ao centro que existe a maior perda de votos para a inação, que dá aos extremos o poder de decisão.

Para que isto não aconteça, é preciso que o PSD não seja um PS(B), como é muitas vezes acusado de ser. É preciso que tenha visão política que lhe permita agir em vez de reagir. Se política é como arquitetura rococó, onde não existem espaços vazios, é preciso ocupar espaços antes que outros o façam. A AD não conseguiu fazê-lo com os reformados e pensionistas nem com os polícias, mas poderá fazê-lo com os professores, os profissionais de saúde, os empresários de pequena e média dimensão. Pode reconciliar-se com os jovens – e é essencial que o faça.

Nada disto, no entanto, é importante se não for visto por quem está fora da bolha, daí a minha preocupação com o alcance mediático da AD. Avançar com propostas concretas, realistas e pertinentes é meio caminho andado, mas é através de propaganda que se garante que estas se possam executar no futuro.

A gestão das narrativas políticas é essencial. A AD tem de manter-se séria, mas deixar de ser ingénua. Deixou-se que a Troika e a austeridade se colasse à direita quando foi José Sócrates que pediu o resgate ao FMI e é António Costa o detentor do recorde absoluto da carga fiscal. Deixou-se que a saída de quadros do PSD para o Chega se transformasse numa suposta associação entre os partidos – que deu, aliás, a maioria absoluta ao PS em 2022 –, quando poderia ser exposto como uma espécie de limpeza de personalidades que não poderiam possivelmente ter espaço no PSD.

Talvez já seja tarde para a estratégia de comunicação da AD, mas nem tudo está perdido. Mantenho-me fiel à minha palavra, e continuo a considerar altamente provável um cenário de eleições antecipadas independentemente de quem ganhar as Legislativas de 2024. Estamos em pré-pré-campanha. Pede-se, por uma vez, continuidade na estratégia, para que possa dar-se uma quebra com o ciclo que perdura desde 2015.

Mestrando em Ciência Política e Relações Internacionais