A poucas semanas do 50º aniversário do 25 de abril de 1974, em jeito de rescaldo da última noite eleitoral, e, quando faltam ainda apurar os resultados dos círculos da emigração, a mais importante nota traduz-se na forte relevância que os portugueses atribuíram ao ato, reforçando a sua participação cívica para valores ao nível de 1995, interrompendo uma, infelizmente, crescente taxa de abstenção.

Fica assim demonstrado, mais uma vez, que não se encontram alheados da política, nem dos políticos, compreendendo bem o momento singular que se viveu.

São eles os maiores vencedores.

Um ato eleitoral provocado por uma demissão do governo socialista de António Costa, por sua vez motivada por um caso judicial e em verdadeira erosão após mais de 8 anos em funções, tal como se vaticinava, o desfecho foi bastante complexo.

Através de uma clara e generalizada viragem à direita, com uma curta e nada clarificadora, vitória da AD, apresentando resultados semelhantes aos somados no último escrutínio pelos partidos que a compuseram, Luis Montenegro e o PSD liderarão a partir de agora um governo em condições bastante exigentes.

Mais do que fiéis discípulos, será necessário um verdadeiro “governo de combate”, o mais abrangente possível, com músculo político forte, mas, ao mesmo tempo, uma permanente capacidade e aptidão para o diálogo parlamentar e, sobretudo, extraparlamentar.

Todavia, uma preocupante tendência, que se vem sedimentando ao longo dos últimos anos, traduz-se no grosso da votação, nesta coligação, estar concentrado no Centro, Norte e Regiões Autónomas, com a AD a não conseguir vencer em nenhum círculo eleitoral a Sul do Rio Tejo sendo, inclusivamente, a terceira força política em muitos desses distritos.

Beneficiando, por um lado, do cansaço com o “sistema” reinante há – quase – cinquenta anos, por outro, do radicalismo ideológico que estes últimos oito anos de governação socialista evidenciaram, e, por fim, da incapacidade dos tradicionais partidos (em particular os do centro-direita) em apresentar soluções diferenciadoras e agregadoras, o Chega foi um dos grandes vencedores da noite.

Vencendo no Algarve, ficando em segundo lugar em todos os círculos a Sul do Tejo, e, em terceiro nos restantes, o resultado deste partido-movimento, mais do que “enterrar a cabeça na areia”, deverá provocar uma profunda meditação nos dois principais partidos nacionais.

Ainda do lado dos vencedores, o Livre, único partido de esquerda a crescer em número de deputados, conseguiu capitalizar algum do descontentamento com a governação socialista assente numa aparente moderação, mais em termos discursivos que, propriamente, programáticos.

Fustigado por casos e casinhos, dilacerando uma maioria absoluta na mais pura incompetência governativa, com a maioria dos serviços públicos perto do colapso, e, centrando a sua campanha quase em exclusivo na agitação do “papão da direita”, o grande derrotado acaba, efetivamente, por ser o Partido Socialista, de Pedro Nuno Santos.

Sem chama, sem ideias, os aparentes “banhos de multidão” (não exclusivos do PS) demonstraram que a bolha político-mediática dos “tiffosi” se distancia a passos largos da realidade do País.

Contudo, outros derrotados houve.

A esquerda, na sua globalidade, uma vez que, perante a queda abrupta do PS não conseguiu (à imagem do que vinha sendo habitual nos últimos ciclos políticos) capitalizar o descontentamento dos portugueses. Mas, em particular, o PCP, que mantem a sua trajetória descendente caminhando a passos largos para a irrelevância.

Por outro lado, BE, IL e PAN, que apesar de – diretamente – não terem perdido deputados, e, dadas as idiossincrasias próprias de cada um, não conseguiram seduzir o eleitorado demonstrando a fragilidade de narrativas e/ou lideranças pouco agregadoras, até internamente.

Mas, também, o centro moderado, já que, desde 1985, com o epifenómeno PRD, que PS e PSD juntos não obtinham um resultado eleitoral tao baixo, no limiar dos dois terços de deputados exigidos para acordos de regime, em particular, uma revisão constitucional.

Em suma, e tal como aqui escrevi a semana passada, para além de soberano, o povo, coletivamente, nunca se engana. Estejam os seus representantes à sua altura.

Advogado