É ator, mas essa não foi a sua primeira opção…
Comecei a trabalhar como modelo aos 18 anos; como ator iniciei-me mais tarde, depois dos 30. Ser ator nunca foi uma obsessão, do género de dizer que em criança fazia teatrinhos. O que aconteceu foi que eu, sendo manequim, ao longo dos anos tive oportunidade de fazer castings. Na altura não havia tanta gente como há hoje no mercado; então, os modelos eram chamados e muitos atores vieram daí na altura. E o que aconteceu foi que eu tive acesso a castings e comecei a gostar. Só que, ao mesmo tempo, também não ficava nos castings por alguma razão, porque não tinha formação, estava habituado a fazer castings para publicidade, que é completamente diferente. A partir daí comecei a apostar na formação como ator para poder ter outros resultados. Mas foi uma coisa que surgiu naturalmente, não foi pensado. Eu estava em Sociologia, também não era uma coisa que quisesse seguir por aí além.

E o curso de Sociologia, como ficou?
Ficou no primeiro ano. Os meus pais, na altura, não tiveram a presença de espírito de me deixarem ter um ano zero. A minha mãe era professora universitária de Sociologia, o meu pai era cardiologista; então acabei por ir para o lado da minha mãe, não por antagonizar o meu pai, mas porque, na altura, não havia uma licenciatura em Marketing e Publicidade, que era o que eu gostaria realmente de fazer e isso apareceu dois anos depois. Mas como o meu pai me forçou a entrar na universidade… eu escolhi qualquer coisa. Fui para Sociologia com uma boa média mas, passado um ano, comecei a trabalhar como manequim e no primeiro ano em que estou na universidade vou três meses para a África do Sul como modelo. Quando voltei, pensei que estar numa sala de aulas já não era para mim… nem sequer cancelei a matrícula, vim-me embora só.

O seu primeiro trabalho como ator foi nos Morangos com Açúcar?
Sim. Fiz uma participação antes numa novela chamada Sentimentos, em que morri no primeiro episódio. Para filmar essa pequena participação fui dez dias para Hong Kong e para Macau. Portanto, foi um bom início. Mas sim, o primeiro trabalho a sério foi nos Morangos. Quando entrou nos Morangos, pensou “é isto que vou fazer”? Já estava definido mais ou menos que era esse o caminho que eu queria seguir, mas vou-lhe confessar que, no início, fiz o workshop dos Morangos antes de fazer os Morangos e o workshop correu muito bem, as pessoas elogiavam imenso. Na altura pensei, “está feito, sou um ator do caraças, isto agora é sempre assim”. Mas depois, a trabalhar e a fazer os primeiros Morangos, vi o quão canastrão ainda era e o quanto teria de batalhar para chegar alguma vez a ser um bom ator. Portanto, veio a certeza e vieram muitas dúvidas também com esse primeiro trabalho.

Em Portugal mantém-se muito assíduo. Quer no cinema, com o Pôr do Sol, quer com séries – O Clube -, quer ainda com novelas, como Cacau, da TVI, que vai estrear-se em novembro. É ponto de honra para si manter-se vivo a nível nacional?
É, é. Viajei muito enquanto manequim, trabalhei muitos anos fora, gosto muito de trabalhar em Portugal. E embora a minha carreira internacional seja um dos pontos que quero desenvolver, mas sempre tendo como base Portugal – ainda por cima agora que a ficção portuguesa está a evoluir, está a começar a ter produções diferentes sem ser só novelas -, ainda tenho mais interesse e gosto em consolidar o meu lugar em Portugal na representação.

Tem feito trabalhos para os canais generalistas. Consegue gerir bem essa situação? Há quem prefira exclusividade…
A exclusividade é algo que não se quer, oferecem-nos. Então, as pessoas que têm exclusividade com alguns canais, eu também não teria pena delas, porque estão bem. O único problema é que não podem trabalhar para outros canais e eu tenho essa liberdade, embora não tenha a mesma compensação financeira que teria se tivesse um contrato de exclusividade porque, trabalhe-se ou não, está-se a ganhar. Faço questão de poder trabalhar com todos os canais. Não renego nenhum.

No fundo, aquilo que está a dizer é que nunca lhe ofereceram exclusividade?
Sim, sim. Nem é uma coisa que eu, sinceramente, gostasse, porque é uma prisão. É bom por um lado, mas o único lado bom que vejo é termos uma certeza financeira ao final do mês. Mas como desde os meus 18 anos nunca tive isso, nunca tive um ordenado fixo ao final do mês, nunca sabia quanto ia ganhar… já estou habituado a viver assim e prefiro ter essa liberdade para poder trabalhar com quem quiser.

Como é viver com essa incerteza?
É uma questão de hábito. Eu acho que uma pessoa que tenha tido sempre um emprego certinho e que tenha recebido todos os meses da sua vida e saiba que aquele ordenado vai lá estar, ao passar para a minha situação, é complicado. Quem vive nesta situação desde sempre… Nunca sei quanto vou ganhar no final do próximo mês, daqui a três meses, não sei se o ano vai ser bom, se vai ser mau, mas é uma coisa a que me habituei. E acho que é preciso ter muita cabeça. Vi muitos colegas meus ganharem fortunas e perderem fortunas – com negócios, investimentos. Sempre fui uma pessoa certinha no campo financeiro, sempre tive cabeça.

O seu dinheiro está debaixo do colchão ou está no banco?
Neste momento é igual, com os juros que estão. [risos] Ainda está no banco, mas às vezes penso se não valia mais estar aqui ao pé de mim, no colchão.

Mas tem algum investimento feito?
Sou muito pouco dado aos negócios, tenho muito pouca cabeça para fazer dinheiro, para inventar dinheiro. Não tenho gastos supérfluos, não sou uma pessoa consumista. Já fui, quando tinha 20 anos. Como modelo ganhava muito dinheiro, o mesmo que o meu pai ou a minha mãe, e estamos a falar de profissões de topo. Na altura, em Milão ou em Paris fiz as minhas loucuras, mas percebi que não era algo que compensasse. Tenho dois casacos guardados no armário, que comprei por um preço elevado, e que os vesti duas vezes.

Tem estado em vários projetos internacionais, como os filmes Manzana d’Oro e After ou a série da Netflix Alto Mar. Está a ser mais fácil para os atores portugueses mostrarem-se além-fronteiras?
Está porque surgiram ferramentas novas que não existiam antes. Posso dar um exemplo. Não precisei de ir a Madrid para fazer o casting para o filme espanhol. Fiz em casa, em Lisboa. Fiz uma cassete e enviei, e é isso que hoje em dia se diferencia. Antes teria de estar em Madrid para ir ao casting ou as pessoas tinham de estar em Londres ou em Los Angeles para irem presencialmente às audições. Neste momento, o mercado abriu com estas novas tendências, e de inclusão em todos os aspetos. Há muito mais mercado para pessoas que não falam inglês perfeito – aliás, para isso, eles já têm os ingleses e americanos. Hoje em dia procuram-se pessoas diferentes e de todos os quadrantes, e isso faz com que os portugueses, que eu considero que são muito bons atores, tenham vindo a ser descobertos a pouco e pouco. Temos imensos casos e eu também espero ser um deles nos próximos tempos.

Considera, portanto, que há talento nacional capaz de agarrar oportunidades a nível internacional?
Completamente, até porque há um evento, o Passaporte, da Patrícia Vasconcelos, que fez com que muitos diretores de casting viessem a Portugal e começassem a ver-nos, e claro que, depois, eles indo lá para fora e escolhendo atores portugueses, começa a haver uma espécie de boca em boca. E eu acho que é isso que tem acontecido nos últimos anos. Parece-me que estas migrações de atores portugueses para Hollywood e outros mercados vão continuar a acontecer cada vez mais frequentemente. Somos bons e baratos.

O sucesso das séries espanholas também tem ajudado? Há muitos atores portugueses que falam espanhol e o Rodrigo é um deles.
Estamos aqui ao lado, mas é um bocado desesperante ver a diferença tão grande que ainda existe entre Portugal e Espanha em termos de orçamento, em termos de produção. Estamos a iniciar esse caminho agora, Espanha já iniciou há muitos anos e aqui ao lado há um mercado enorme com séries, umas atrás das outras, que, não sendo a barreira da língua, acho que era um mercado que deveria interessar a todos os atores. Estão a fazer muitas coisas. Portugal vai na onda e acho muito bem que vá e que apanhe rápido o comboio.

Com a greve sem fim em Hollywood, considera que pode haver aqui uma janela para profissionais estrangeiros, entre eles os portugueses, para lutarem por melhores condições?
Confesso que já pensei nisso e que espero que, nalguns casos, sim, porque continuamos a ser uma profissão precária – e não estou só a falar dos atores, estou a falar de todos os artistas e técnicos. Não sei se a greve e as manifestações serão o primeiro passo a tomar, mas acho que é necessário começar a pensar, porque nós somos precários. Trabalho a recibos verdes, estou habituado e consigo lidar com isso, mas preferia ter um contrato. Espero que seja um movimento que traga para cá alguma mudança.

O seu colega José Mata, recentemente, disse numa entrevista que vivia num país que põe de lado a cultura. Sente o mesmo?
Sinto. Como não podemos sentir se o Orçamento do Estado (OE) é o que é para a cultura? Enquanto não tivermos pelo menos 1% para a cultura… Estava esperançado neste ministro [Pedro Adão e Silva]. Ele foi aluno da minha mãe. A minha mãe dá aulas no ISCTE e há imensos políticos, e que são figuras de renome, que passaram pelas suas aulas. Ela fala muito bem dele e sei que é complicado fazer o trabalho que se quer fazer, mas ainda estou esperançado de que ele consiga trazer algo mais para a cultura em Portugal. Ainda falta fazer muito.

O que podem fazer os atores? Há falta de união para serem mais ouvidos?
Acho que não é uma questão de união, é uma questão de organização. Não me quero incluir muito nesse assunto, porque eu não sou dos maiores ativistas, não quero estar agora, aqui, a dar uma imagem de que estou na primeira linha da luta, mas, por exemplo, nunca recebi uma chamada para uma reunião, para um debate de ideias, e acho que às vezes temos de começar por algum lado e acho que organizarmo-nos era o primeiro passo, e depois, sim, encontrar formas de luta para irmos ganhando algum espaço.

Salta à vista que o teatro é uma página em branco na sua carreira. Isto é uma escolha deliberada?
Não, não, de todo, sigo à espera de um convite. Já fiz teatro, mas não a nível profissional. Gostava de ter um convite que me cativasse, gostava muito de fazer teatro. Como nunca fiz nada nestes dez anos em que trabalho como ator, gostava muito de ter um projeto à minha medida. Não sei dizer qual é, nem eu próprio sei.

Tem uma grande vontade de fazer de vilão mas, além desse objetivo, o que gostava de fazer e ainda não fez?
Basicamente, gostava de fazer uma coisa diferente, porque se tivesse feito cinco ou seis vilões, provavelmente estava a pedir para fazer um rapazinho bonzinho, e geralmente, não sei porquê, é o papel que me dão nas telenovelas e eu, às vezes, até pergunto aos produtores e realizadores porque não me põem a fazer de mafioso. Mas, voltando atrás, gostaria muito de começar a fazer teatro. E completando a resposta anterior, acho que é um trabalho que tenho de fazer porque, vindo da moda, não havendo aquele estigma do “é modelo, é canastrão”, às vezes tem de se provar, tem de se provar mais. Senti isso ao longo dos anos, principalmente no início. E agora, neste momento, sim, estou a ter uma consolidação de carreira em que eu próprio já me considero ator. Nos primeiros cinco, seis, sete anos tinha a noção de que estava num workshop permanente e contínuo. Mas agora, com a idade, com coisas que aconteceram na vida, com uma maturidade emocional que não tinha há dez anos – e nota-se isso nos meus trabalhos, e daí estar a trabalhar cada vez mais -, consigo empregar uma força que não tinha antes e sinto-me cada vez mais preparado para fazer outras coisas. Sinto-me em início de carreira neste momento; portanto, teatro, mais séries, espero que venham muitas coisas a seguir.

Sentiu algum desdém ou olhares de soslaio por vir da moda?
Não é uma questão de desdém, de desprezo, de nada desse calibre. Às vezes é uma questão de escolha. Há muita gente que não conhece o meu trabalho e mesmo de pessoas do meio televisivo, muitas vezes, eu ouço “propuseram-te para uma série, mas eu não nunca vi nada teu, fiquei um bocado na dúvida”. É um trabalho que se tem de fazer, de consolidar o meu trabalho como ator e, depois, trabalhando com um realizador que acaba por falar com outro e acaba por falar com outro… é assim que as coisas vão acontecendo. Não é uma questão de as pessoas olharem para mim de uma maneira diferente, dou-me bem com toda a gente.

Tem um fascínio por kickboxing e bodyboard. Funciona como um escape da pressão da representação?
Sim, em alturas diferentes. O bodyboard foi mais ou menos até aos 25 anos. Queria muito já ter feito uma arte marcial quando era puto e pedi ao meu pai para fazer, só que ele queria pôr-me no judo, mas eu odiava o judo, que era só agarranços. Eu queria era murros e pontapés. Há uns quatro, cinco anos atrás inscrevi-me no kickboxing e, até hoje, estou fã. É uma terapia muito boa. Entretanto tenho levado amigos meus e eles vão levando outros. Toda a gente devia praticar um desporto assim.