A época natalícia é a altura mais feliz do ano por ser excecional. Em nenhuma outra época se junta tanta gargalhada ou existe tanto entusiasmo generalizado, não apenas por dar e receber prendas materiais, mas por tratar-se de prezar quem temos à nossa beira.

O papel fundamental da família, de sangue ou não, enquanto rede de apoio é basilar na sociedade desde sempre, mas, na verdade, a assinatura longínqua do contrato social estabeleceu o Estado como principal garante das nossas necessidades básicas. À medida que a sociedade evolui e se transforma, o Estado, naturalmente, também se molda em concordância e as expectativas relativas ao seu papel ajustam-se, pelo que hoje tomo por garantido (e ainda bem) o que há algumas gerações seria considerado um luxo.

Para nós, civis, o Natal são dois dias. Ora, para o Estado, deveria ser Natal todo o ano. Todos os dias de todos os meses deviam ter como singular missão prezar os seus cidadãos, de dar a de quem tanto recebe. Daí que me choque profundamente o papel abismal do PS que, tendo ao seu pleno dispor o aparato estatal, escolheu fazer deste “Natal” apenas o período que se seguiu à demissão de António Costa. São 99 os meses que separam novembro de 2015 de março de 2024 e muito me entristece que, desses 99, apenas se considerem importantes os que antecedem um período eleitoral.

Programas políticos oportunistas e eleitoralistas já são maus o suficiente. Quando se trata de um Orçamento do Estado, é escandaloso. Para António Costa, a imagem que os portugueses retêm dos seus governos são “um dos melhores períodos de relacionamento entre os órgãos de soberania”. Diz que deixa “bons presentes de Natal”.

Não se esqueçam de agradecer ao PS por ter retirado a medida de aumento do IUC depois de perceber que há eleições marcadas que tem de vencer, por dar um cheque de 20 euros para que jovens consigam comprar um livro (e nada mais) ou a farsa da devolução da propina universitária disfarçada de “propina zero”.

Portanto, esta não é a imagem que tenho dos últimos oito anos que, aliás, começaram com um sentimento avassalador de esperança. Se é verdade que António Costa e o PS deram bons presentes de Natal ao país, é pena que este Natal, à boa maneira republicana, seja só quando o rei faz anos.

Ainda há dias a Juventude Socialista publicou uma peça apelidando os socialistas de “bacalhau” e os sociais-democratas como “polvo” na ceia de Natal, onde o PS é “o fiel amigo dos portugueses” e o PSD “tem braços para tudo”. Pudera! Quem tem “braços para tudo”, neste momento e nos últimos oito anos, é quem infelizmente não os usou. Quem tem o aparato de Estado é que é, invariavelmente, o polvo. E, se o polvo não faz uso disso, é filho da pota.

Mestrando em Ciência Política e Relações Internacionais