Crê-se que foi em torno do séc. III a.C. que o general Galba, que comandava as legiões que queriam ocupar a Península Ibérica, pejada de tudo quanto eram tribos bárbaras, terá escrito uma carta para Roma, informando César de que, “nos confins da Ibéria, há um povo estranho que não se governa e não se deixa governar”. Mais tarde, Viriato, que dominava os Montes Hermínios (hoje a Serra da Estrela), terá liderado os Lusitanos contra o invasor romano, provocando avultadas baixas.

Mas este adjetivo caraterístico da nossa “portucalidade” não desapareceu. No séc. XIX, o rei Dom Carlos desabafou “esta choldra é ingovernável”, fazendo jus à enorme dificuldade que é o governo das gentes portuguesas.

Com a queda da Monarquia, em 1910, a I República perpetuou a tradição com um sem fim de governos, golpes palacianos e guerras partidárias que culminaram com a imposição de algumas ditaduras, como a de Pimenta de Castro. A coboiada só acabou com a Constituição de 1933 e a criação do Estado Novo, que trouxe estabilidade política durante 41 anos, até à Abrilada de 1974, onde mais uma vez o povo vai para a rua com os militares, grita-se, ofende-se alguns parentes, não se trabalha nem se estuda e é tudo “peace and love”, mesmo que depois seja o contrário.

Escusado será de referir que os 41 anos da II República foram pesados a nível nacional e internacional, com a II Guerra Mundial e a guerra do Ultramar, entre outras situações reprováveis. Mas de que houve governabilidade, não há dúvidas.

De 1974 até à data, cria-se o mito do arco da governação, do bloco central, da gerigonça e outras formas de controlar a governação e fazer prevalecer a democracia, conquanto seja a favor da esquerda. Efetivamente, a geringonça é o último golpe palaciano da nossa democracia, em que um primeiro-ministro não foi eleito pelo povo, mas pela coligação de partidos de esquerda.

Com as eleições de domingo passado, e enquanto se apuram os votos da Diáspora – sempre tão esquecida mas que pode desiquilibrar a balança do resultado eleitoral -, teme-se as gerigonças. Porque o seu espetro esvoaça sobre a nossa cabeça como uma mosca chata. Ou a esquerda faz o habitual complô, e lá vai tudo para o galheiro de novo, ou a Aliança une-se com os partidos mais à direita para ter estabilidade governativa, mas aí o medo do desconhecido impera.

Ninguém viu a Iniciativa Liberal ou o Chega a governarem. Não se sabe o que pode advir duma geringonça à direita. Pode ser um mar de rosas ou um campo de minas.

De novo a ingovernabilidade num povo que não se perdoa, nem faz fé nos seus. É notória a falta de liderança em quase todos os partidos, casos de corrupção sem fim judicial à vista e um sistema falhado em quase todas as frentes.

Salve-se quem puder.

Diretor do Instituto Mundo Lusófono

Artigo publicado na edição do NOVO de sábado, dia 16 de março