Considerando “muito preocupante” aquilo que se está a passar nos serviços de obstetrícia, a Ordem dos Médicos criou uma comissão de peritos para fazer um “retrato da situação” em que se encontram as maternidades públicas e privadas. Coordenada pelo médico Caldas Afonso, a equipa que já está no terreno é composta por nove elementos de três áreas: ginecologia/obstetrícia; anestesia e neonatologia.

Um dos objetivos, explica ao NOVO o coordenador, é “perceber em que ponto é que estamos”, nomeadamente, numa primeira fase, em termos de recursos humanos disponíveis. “E a partir daí, fazer uma programação para as próximas duas décadas das necessidades que o país vai precisar [em matéria] de obstetras, de modo a que situações de rutura como as que estamos a atravessar possam ser minimizadas ou não aconteçam”, afirma, assinalando tratar-se de algo que “já devia ter sido feito há algum tempo” e cuja responsabilidade é “claramente da tutela”.

Caldas Afonso, que é membro do Conselho Nacional da Ordem dos Médicos, sublinha a importância de se avaliar o que se passa no setor público, sobretudo na região de Lisboa e Vale do Tejo, onde, neste momento, “cerca de 35% a 40% dos nascimentos” já são feitos fora do Serviço Nacional de Saúde (SNS). “Era importante termos conhecimento da totalidade da oferta para, de uma maneira validada cientificamente, programar as necessidades de obstetras que o país precisa para as próximas décadas”, acentua o responsável.

A equipa que Caldas Afonso já está no terreno. Cada uma das especialidades envolvidas constituiu uma base de pedido de informação a enviar às maternidades, tendo o apoio de um professor da Universidade do Porto, que trabalhará a componente de programação estatística para o futuro. Os inquéritos já foram cientificamente validados, prevendo agora a comissão enviá-los aos cerca de 50 locais de nascimento logo na primeira semana de janeiro. Depois disso, seguem-se visitas presenciais a cada uma das maternidades.

Estando dependentes da celeridade das respostas dos blocos de partos, Caldas Afonso não arrisca comprometer-se com uma data muito precisa sobre as conclusões deste trabalho, mas o grupo gostaria que tal acontecesse ainda no primeiro semestre de 2024, sendo certo que, recolhidas as informações, a equipa irá fazer as visitas presenciais “o mais rapidamente possível”.

Caldas Afonso, que é também diretor do Centro Materno Infantil do Norte, não tem dúvidas de que a obstetrícia em Portugal vive a sua pior fase, sendo mesmo “uma das especialidades que está, neste momento, mais em causa”. Para isso contribuem as aposentações, que superam largamente as entradas na profissão. “Estamos neste momento numa situação muito preocupante e a curto/médio prazo a situação tende a agravar em termos de profissionais disponíveis. É por isso que temos tido a preocupação na Ordem dos Médicos de aumentar o máximo possível, sem ultrapassar linhas vermelhas da qualidade formativa, aumentar o número de vagas, que foi o que aconteceu este ano”, lembra o especialista, alertando, no entanto, que “formar um obstetra demora seis anos”.