Quase quatro anos depois do último embate entre Joe Biden e Donald Trump, os dois políticos enfrentam-se novamente a 27 de junho, em Atlanta, no muito aguardado debate da CNN. Este será um dos grandes momentos desta campanha, antecipando-se ao período normal e com regras muito específicas. Moderado pelos jornalistas Jake Tapper e Dana Bash, terá a duração de 90 minutos, com dois intervalos, com os candidatos a não poderem contactar as suas equipas durante este período.

Apesar da retórica de ambos, marcada por uma agressividade nunca antes vista, foram tomadas medidas para garantir um debate civilizado. Numa decisão rara, o microfone será desligado para o candidato que não estiver a falar. Ao contrário do habitual, não haverá audiência em estúdio, tornando o debate mais focado nos candidatos e nas suas reações. Não poderão levar adereços ou notas pré-escritas para o palco, recebendo apenas uma caneta e papel.

O que poderá significar este debate? Embora não deva ser decisivo – novembro ainda está longe –, será um daqueles momentos que pode mover eleitores, dado o grande aparato mediático que irá provocar. Para muitos norte-americanos, esta será a primeira vez que irão olhar para estas eleições com atenção. Numa altura em que Joe Biden parece recuperar nas sondagens e poucas semanas depois de Donald Trump ter sido condenado pela justiça de Nova Iorque, ambos os candidatos enfrentam problemas. Este debate poderá ajudar a resolvê-los ou a acentuá-los.

O atual presidente, verdadeiro promotor deste debate antecipado, quer desde já eliminar a ideia de que não está apto para o cargo. Nas últimas semanas tem sofrido uma forte onda de ataques devido a presenças públicas onde as suas fragilidades físicas e mentais foram colocadas em evidência, seja através de vídeos truncados ou não. Durante 90 minutos, Biden terá de demonstrar que detém capacidades para se manter na Casa Branca, concentrando-se nos ataques ao adversário republicano.

Biden quer fazer destas eleições uma escolha entre a democracia e a autocracia, entre a decência e a indecência, entre a verdade e a mentira. Para isso, utilizará certamente temas que atualmente são favoráveis aos democratas, como o aborto, a guerra na Ucrânia ou a qualidade da democracia. Biden precisará também de falar para os mais jovens e minorias, onde Trump está a conquistar eleitores, tornando-se ainda mais aceitável.

Donald Trump irá tentar descredibilizar o atual presidente. Ninguém espere que utilize um tom diferente do habitual. Será bastante agressivo e atacará Biden pelas suas aparentes fragilidades físicas e mentais, bem como em temas onde Biden é percepcionado como fraco, como na economia, na imigração ou na política externa.

Será também uma oportunidade para apresentar, perante uma audiência de milhões de eleitores, a sua defesa em relação aos casos judiciais em que está envolvido. Irá tentar convencer os americanos de que é inocente em todos os processos e que são meras jogadas políticas dos democratas, que controlam a justiça. Mesmo que não seja verdade.

Muitas vezes, estes debates não são decididos pelos argumentos ou factos apresentados. Uma frase deslocada ou uma tirada certeira podem ditar o desfecho do mesmo. Na era dos memes e das redes sociais, serão estes pequenos momentos que irão marcar o debate. Quem será mais viral? E quem terá mais publicidade gratuita após o debate? Positiva ou negativa? Serão nestas particularidades que devemos focar a nossa análise.

Uma nota final: ninguém pode descartar uma última hipótese, constantemente aventada na imprensa americana. Se Biden colapsar ou tiver momentos embaraçosos neste debate, haverá ainda tempo para os democratas afastarem o presidente e arranjarem outro candidato. Seria caótico para o processo eleitoral, mas haveria tempo antes da Convenção Nacional Democrata, no final de Agosto, em Chicago. E, quem sabe?, ser benéfico para as perspectivas do partido. O que também diz muito sobre as debilidades de Biden.

Especialista em política norte-americana