A estratégia usada na última campanha eleitoral, de acenar com o suposto medo do regresso da direita e do risco das mais variadas reversões se isso acontecesse, não é de todo nova.

Foi há já quase 40 anos, que as legislativas francesas de março de 1986 inauguraram uma nova era. Por proposta do partido socialista francês de François Miterrand, essas eleições foram disputadas pelo método proporcional, em vez do habitual sistema maioritário a duas voltas, com a intenção clara de minorar uma previsível derrota da esquerda. Foi então que a esquerda francesa iniciou – e isso ficou para a história – um estilo de campanha baseado no medo da direita e do seu regresso ao poder.

Não é novo. Os cartazes do PSF, nesses tempos já distantes, e numa altura em que eram o método essencial de campanha, mostravam pessoas com rostos assustados, em pânico, a gritar perante o que seria um terror evidente – o regresso da direita ao poder. Um dos cartazes mostrava mesmo um lobo engravatado e a pergunta: Diz-me, linda direita, porque tens uns dentes tão grandes?

Convém ainda recordar que foi precisamente Miterrand que exigiu a dado passo, para participar nos debates, que os houvesse com a presença de François Le Pen, líder da extrema-direita à época e pai da atual líder dos populistas franceses.

A estratégia era evidente: unir a esquerda e desenvolver uma tática de tenaz para pressionar a direita clássica. O resultado foi o oposto. A direita com Jacques Chirac ganhou e foram essas as eleições que marcaram a entrada da extrema-direita no parlamento, com cerca de 30 deputados. Virou-se o feitiço contra o feiticeiro.

É também aqui que nasce a ideia de um país partido em três blocos políticos, o tripartidarismo.

Entre nós, para uma certa esquerda, a divisão do mapa político parece entroncar numa citação célebre de igualmente célebre figura das publicações cor de rosa: “Estar morto, é o contrário de estar vivo”. Para essa esquerda, ser de direita é o contrário de ser de esquerda. Uma lapalissada e uma simplificação que permite, por mera conveniência, definir um inimigo comum unificando a esquerda contra o “perigo” da direita onde se inclui tudo. Das direitas moderadas, centristas, tradicionais, à direita populista e radical.

É a estratégia do medo. Convém a essa esquerda e convém aos populistas de direita, a tenaz. Não deixa de ser irónico que o principal cultor dessa estratégia em Portugal, Augusto Santos Silva, tenha sido uma das primeiras vítimas do seu conceito ao perder o mandato precisamente para um deputado do Chega. Que sirva de lição.

A ideia era, contra os perigos da direita e uma suposta ameaça do “fascismo”, unir toda a esquerda em seu redor para lançar a sua candidatura presidencial, em modo geringonça. Não deu. Virou-se o feitiço contra o feiticeiro, mais uma vez.

Advogado

Artigo publicado na edição do NOVO de sábado, dia 23 de março