Portugal alcançou o feito extraordinário de corromper o combate à corrupção. Uau! Conseguiu criar uma teia corrupta para evitar combater a corrupção. Incrível! Comecemos, claro, pelo cerne, pela prevenção da corrupção dos deputados. Em 2015, o GRECO (Grupo de Estados contra a Corrupção) sugeriu a Portugal cinco recomendações para esta área. Oito anos depois, o que tem a Assembleia da República para apresentar? Nada. Raspas. Zero. Nem uma única concretização. Portanto, a própria “casa da democracia” logo mostra ao que vem. Fraude.
Tudo o resto é ravina. No Índice de Perceção da Corrupção (IPC) ocupamos, num universo de 180 países, a 33.ª posição. Também não progredimos na nevrálgica prevenção da corrupção em relação a juízes e procuradores. Aliás, cumprimos de forma satisfatória apenas três das 15 recomendações. Lá fingimos que fizemos alguma coisinha. Só para disfarçar.
Isto em domínios altamente sensíveis, conectados com o funcionamento de dois importantes órgãos de soberania.
E há mais conclusões demolidoras do dito grupo do Conselho da Europa. Continuamos a lamber papel com punhos de renda e mangas de alpaca. Desenvolvemos um lindo e mui extenso quadro jurídico e institucional anticorrupção, cheio de arrebiques e berloques gongóricos e rococós, mas sem qualquer operacionalidade ou eficácia. Há a Estratégia Anticorrupção, o Mecanismo Anticorrupção, a Entidade da Transparência, o código de conduta para membros do governo e dos gabinetes governamentais, há isto e aquilo, mas nada funciona. Tudo parado.
Ou seja, tudo está formalmente criado, mas não há sombra de implementação efetiva. Gerámos a ilusão de lutarmos contra a corrupção quando, na prática, nada fazemos. Só empatamos.
Óbvio que, assim, fica quase tudo por fazer: a verificação da integridade das pessoas com funções executivas de topo, as restrições pós-emprego, os processos de consulta pública e o acesso à informação pública, a transparência dos contactos entre altos funcionários executivos, lobistas e terceiros, a concretização dos requisitos relativos à proteção de denunciantes, um sistema sólido de escrutínio da declaração de rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos. Etc., etc., etc.
Pelo meio, os mesmos autores desta burla sobre a burla, qual metaburla burlesca, conseguiram ainda edificar um negro anátema que recai sobre todos os que alertam sobre os graves problemas portugueses neste domínio. Ou seja, os que se atrevem a falar do fracasso das políticas anticorrupção são logo apodados de perigosos populistas ou demagogos pela fina flor da política e pela nata bem-pensante do arco da governação ou até geringonço. Já o único partido mais sonoro sobre a gangrena nacional também se cala na hora da verdade. O Chega grita que vai limpar o país, mas no Parlamento não mexe uma palha e até protege os poderes fácticos. Ou seja, mais uma criativa forma de ludibriar. Enfim, os nossos políticos controlam os meios de combate à corrupção para garantir que ela continua. É o crime perfeito. Chama-se Portugal.
CASO SÉRIO
Já éramos dos campeões mundiais de vacinação. Também estávamos no pódio dos confinamentos. E na luta pela medalha de maiores destruidores dos serviços públicos de saúde. Agora somos campeões de excesso de mortalidade. E a nova diretora da DGS até anunciou que é para continuar. Isto é que tem sido salvar a saúde pública ! Ufa.
Ativista política
Artigo publicado na edição do NOVO de sábado, dia 20 de janeiro