Marco Galinha diz, em entrevista à Lusa, que entrou nos media “com amor a Portugal” e considera que o futuro do setor no mercado português vai passar por “fusões e aquisições”. O presidente executivo do grupo BEL deixou de ser CEO da Global Media, que detém o Diário de Notícias, Jornal de Notícias, O Jogo e TSF, entre outros títulos, assumindo agora as funções de chairman, quase três anos depois de ter entrado na empresa.
Num balanço da sua experiência no setor dos media, o empresário refere que conheceu “pessoas fabulosas” e sentiu que andavam “todos a caminhar para o mesmo lado” e que “gostava que eles sentissem” que da sua parte “foi a mesma coisa”. No entanto, “há uma grande falta de diálogo” e interpretações “erradas” muitas vezes “sobre a intenção dos acionistas”, aponta.
“A minha intenção no grupo que represento foi fazer o melhor de acordo com as capacidades que tínhamos”, defendeu, acrescentando que entrou no setor dos media sem “nenhuma agenda” e investiu “para além das possibilidades na salvação” da GMG, apesar de levar “pancada”.
“Eu vim para os media com amor a Portugal, com amor à portugalidade e a acreditar seriamente que este projeto de língua portuguesa era uma nova forma de afirmarmos a liderança neste mundo global”, sublinha, apontando a língua portuguesa como “uma força mundial”.
“É quase o nosso quinto império futuro daquilo que podemos fazer”, sublinha o empresário, considerando que país tem a ganhar com isso.
Depois, “inevitavelmente acredito que vão existir fusões em Portugal, reestruturações dos grupos, porque o mercado é muito pequeno em Portugal, mas é enorme na língua portuguesa”.
Se “remarmos todos para o mesmo lado, podemos atingir aqui uma liderança na direção certa”, defende, apontando que Portugal tem jornais mais antigos que o New York Times, dando o exemplo do Açoriano Oriental.
“Temos jornais que são ainda grandes referências mundiais”, remata.
Além disso, acredita que o futuro do setor “vai ser muito ligado Inteligência Artificial”, “com bons jornalistas”, talvez “menos” profissionais, mas com “mais qualidade”. O gestor adianta que já está a trabalhar com Inteligência Artificial em todo o espólio do Diário de Notícias e que tem como objetivo criar uma fundação e usar a tecnologia para organizar a informação.
Questionado sobre a análise que a ERC está a fazer sobre o fundo suíço Union Capital Group, que agora controla a Global Media, Marco Galinha refere que este tem cerca de 100 mil subscritores.
“Andar a pedir um beneficiário efetivo de um fundo com 100 mil subscritores é uma coisa do outro planeta, só revela que há qualquer coisa que não bate certo”, afirma.
“Este fundo acreditou no projeto de língua portuguesa”, sublinha, acreditando que o “ruído” à volta do novo acionista da Global Media “também seja do interesse da concorrência”, citando a teoria do caranguejo: quando se vê alguém a sair da caixa, o ideal é puxá-lo para trás.
“O que eu sei é aquilo que foi feito e que eu tive conhecimento: foi um projeto para dignificar a língua portuguesa e para Portugal estar na liderança da língua portuguesa, dos media do futuro”, remata.
“A Global Media, quando o grupo Bel entrou, ainda não fez três anos, estava numa situação muito difícil”, ou seja, de “quase não continuidade do grupo todo em 15 dias”, relata, recordando que, na altura, “foi feito um plano de emergência, uma equipa brilhante a trabalhar dia e noite neste projeto de salvação, porque a importância de um Diário de Notícias, de um Jornal de Notícias, de O Jogo, de uma TSF era verdadeiramente importante”.
“Dado o impacto que aquilo tinha a nível nacional” a decisão tomada foi “correr o risco e salvar a empresa”. O Diário de Notícias foi retomado a papel, depois surgiu a covid, depois o impacto do conflito Ucrânia-Rússia.
“Estrategicamente o grupo Bel tinha interesse na área da logística. Tivemos oportunidade de comprar a Vasp, na altura à Impresa, e essa é a nossa essência, nós somos um operador logístico. Contudo, dada a responsabilidade que tínhamos no projeto e que falámos aos jornais do projeto da lusofonia, (…) andámos a tentar arranjar o parceiro certo e eu penso que o encontrámos”, prossegue.
Atualmente, Marco Galinha acompanha a Global Media nas notícias e nas reuniões em que está presente no Conselho de Administração, uma vez que já não tem funções executivas.
“A minha função na empresa é auxiliar naquilo que posso, a decisão foi tomada porque havia um período do grupo Bel sair deste projeto nesta fase”, até para se concentrarem na “sua essência” de operador logístico, numa empresa que tem de tomar as decisões, quer na Vasp, quer na distribuição.
Também a Vasp tem “uma grande relação” com os media e “existiam incompatibilidades de estar à frente da Global Media e assumir 100% da Vasp”, por razões de concorrência, “então esta decisão tinha que ser tomada”.
Sobre o eventual despedimento coletivo na Global Media, o empresário refere que as reestruturações dos projetos de media estão a acontecer em todo o mundo. Com a “continuidade de todas estas ameaças que vemos atualmente os projetos têm de ser viáveis e há que tomar decisões e imagino que o fundo tome as decisões”, tal como a nova equipa de gestão, que “são essenciais para a continuidade da empresa”.
Venda da Lusa bem encaminhada
Marco Galinha garante “não haver qualquer razão para preocupação” relativamente à venda das participações da Agência Lusa e que “as coisas estão muito bem encaminhadas”, depois de ter confirmado, a 4 de agosto, que o grupo Bel tinha vendido “parte da Global Media” à Union Capital Group e que não era estratégico ter uma participação na agência de notícias, tendo o Estado manifestado interesse em comprar as participações, que perfazem 45,71%.
“Os negócios normalmente têm a sua confidencialidade e não nos permite alongar muito”, começa por dizer Marco Galinha, quando questionado sobre o ponto de situação das negociações. “Mas o que eu posso dizer é que não era do interesse estratégico estar a ter uma empresa tão importante portuguesa num fundo que não era português. Com a saída do grupo Bel do controlo acionista da mãe da Lusa, não fazia sentido uma empresa com uma grande importância nacional estar nas mãos de um grupo estrangeiro”, acrescenta.
O Estado, através da Direção-Geral do Tesouro e Finanças, detém 50,15% da Lusa, com a Global Media ser detentora de 23,36% e a Páginas Civilizadas 22,35%. O fundo controla a maioria (51%) do capital da Páginas Civilizadas, que detém 41,5% da GMG.
Questionado sobre os valores que estão a ser negociados, Marco Galinha não avança detalhes: “O que eu sei é o que temos na contabilidade. Os valores que nós falámos são três vezes abaixo do valor de custo, no caso da Global e das outras empresas, mas já falámos e até pode ser que isto chegue a um final feliz”.
Sobre se existe um prazo para negociar a venda da Lusa, tendo em conta que a Assembleia da República será dissolvida dentro de pouco tempo, o empresário remata: “Eu diria que não vai haver qualquer razão para preocupação, as coisas estão muito bem encaminhadas”.
O também atual chairman da Global Media Group admite a possibilidade de se poder chegar a um acordo esta semana, mas está tudo em aberto: “Como não há interesse estratégico, portanto, só faz sentido haver uma proposta que agrade ambas as partes”.
A Impresa concluiu, a 31 de dezembro de 2021, a venda da posição que detinha na Lusa à Páginas Civilizadas por 1,25 milhões de euros. Além do Estado, da Global Media e da Páginas Civilizadas, a Lusa conta ainda com a Notícias de Portugal (2,72%), Público (1,38%), RTP (0,03%) e Empresa Diário do Minho (0,01%) na sua estrutura acionista.