França: direita procura líder para vencer as presidenciais
O maior partido do centro-direita francês, Os Republicanos (LR), está a escolher o seu candidato presidencial e há três personalidades com força: o ex-comissário europeu Michel Barnier e os presidentes regionais Valérie Pécresse e Xavier Bertrand. Um deles vai correr contra Macron.
O partido Os Republicanos (LR na sigla francesa), maior formação de centro-direita da França, escolhe na próxima semana o seu candidato às presidenciais de 2022, num processo de primárias em duas voltas que termina a 4 de Dezembro. Apesar de três dos cinco candidatos aparecerem em quarto lugar na corrida ao Eliseu, a eleição partidária da tradição gaullista foi muitas vezes decisiva.
A campanha interna incluiu debates televisivos e uma sessão de apresentação das candidaturas perante o conselho nacional (o parlamento do partido). Os cinco candidatos procuraram atrair o voto dos novos militantes, cujo número duplicou desde Setembro, mas a cordial discussão interna foi marcada pela introdução de uma nova abordagem a temas controversos, como imigração ou a crítica do politicamente correcto.
A mudança de tom não pesa, por enquanto, nas sondagens das presidenciais, em que o candidato republicano com melhores perspectivas continua a ser Xavier Bertrand, um líder regional sem visibilidade nacional. Nas sondagens não passa do limiar de 14 a 15%, abaixo de Macron e da líder da extrema-direita, Marine Le Pen – portanto, sem acesso à segunda volta.
Nas primeiras sondagens internas feitas a militantes do LR, Bertrand era o favorito, mas a entrada recente de muitos aderentes pode ter mudado o cenário. Bertrand e Valérie Pécresse foram dois dos vencedores das eleições regionais de Junho, que os republicanos venceram com os socialistas, esmagando a extrema-direita de Marine Le Pen e, de forma ainda mais visível, os candidatos ligados ao partido de Emmanuel Macron. Na altura, pareceu que Os Republicanos podiam lançar-se para um desafio ao Presidente mas, até ao momento, essa dinâmica não se concretizou.
É difícil avaliar até onde irá o entusiasmo da direita, nomeadamente o surto de adesões, mas alguns comentadores da imprensa francesa admitem que poderá beneficiar Michel Barnier, um antigo comissário europeu de 70 anos, negociador do Brexit, que surgiu nesta campanha com posições surpreendentes e uma atitude presidencial. As sondagens internas do LR mostram-no a subir, enquanto Bertrand desce.
Efeito Zemmour
Os gaullistas têm um problema: o aparecimento, em Setembro e Outubro, de um possível candidato às presidenciais, Éric Zemmour, que alterou os temas em discussão, enquanto acusava o centro-direita de ter abandonado os fundamentos ideológicos. Para escândalo da classe política francesa, Zemmour tem feito duras críticas às políticas migratórias e ao suposto declínio da França, dizendo-se do autêntico gaullismo (a França forte do general De Gaulle) e atacando o que classifica de cedências à correcção política ou ao domínio alemão da União Europeia.
O efeito Zemmour mudou o discurso dos candidatos LR e pode ter influenciado os militantes. Do campo do Presidente Macron já começaram a surgir críticas aos candidatos de centro-direita, o sector mais perigoso para a reeleição. Após o terceiro debate televisivo dos republicanos, a ministra Marlène Schiappa descrevia as posições dos candidatos da direita como “as 50 nuances de Éric Zemmour”, frase irónica e acutilante que resumia todo o debate como o triunfo do ensaísta radical, cujas ideias estariam a dominar a campanha gaullista. “Os candidatos passaram o tempo a correr atrás das posições de Zemmour”, acrescentou Schiappa.
Esta vai ser a crítica geral, independentemente do vencedor. Macron precisa de colar os republicanos ao extremismo, mas o centro-direita necessita de adoptar alguns dos temas que até agora pareciam exclusivos do partido de Le Pen e que Zemmour começou a discutir de maneira sofisticada.
O ensaísta rompe com o populismo, assume-se como membro das elites, leva na bagagem uma nova agenda mediática que inclui temas do domínio dos ressentimentos populares que os populistas usavam em exclusivo, atreve-se até a atacar a gestão governamental da crise sanitária. Os republicanos entram no debate mas, na sua qualidade de partido do poder tradicional, será difícil defini-los como extremistas.
Como virar à direita
É neste contexto que os candidatos têm ensaiado posições mais à direita, sobre migrações, por exemplo, onde antes só viam teses populistas. Por outro lado, o partido une-se contra o Presidente, como sugere esta frase de Michel Barnier: Macron “foi eleito para fazer reformas, mas não fez outra coisa senão dar lições”. É preciso “um sobressalto” para “reparar o país”, explicou o ex-comissário europeu na sessão de apresentação perante o conselho nacional.
Na ocasião, Xavier Bertrand exibiu o mesmo tom de crítica e a adopção de argumentos que até aqui não eram frequentes no discurso do centro-direita. Bertrand tentou contrariar a dificuldade de ter saído do partido por discordar da anterior viragem à direita, cuja sensatez agora reconhece. “É tempo de demonstrar à classe média que nós é que a defendemos. É a direita que simboliza hoje o ideal da justiça”, disse ainda, não hesitando em entrar no terreno mais controverso das políticas migratórias: “Não é a França que tem de se adaptar às necessidades da imigração, é a imigração que tem de se adaptar às necessidades da França.” Para Bertrand, o programa terá de ser de “autoridade e trabalho, de zero impunidade”.
Este novo tom está a mudar as “ideias da direita”. Os republicanos dizem que Macron está obcecado com a agenda do partido e Zemmour deverá anunciar a sua candidatura formal durante o congresso d’Os Republicanos, As presidenciais francesas começam a girar em torno da conquista do voto de centro-direita. É ali que se joga a vitória.
Reeleição de Macron é o cenário mais provável a cinco meses das eleições
Tendo ocupado o centro e com muitos votos de esquerda, Emmanuel Macron precisa de neutralizar qualquer ameaça que surja do centro-direita.
Nesta altura do campeonato, o Presidente Emmanuel Macron é o confortável favorito nas presidenciais de Abril, mas a sua popularidade é frágil e tudo pode mudar. Há 40% de franceses satisfeitos com Macron e o nível é estável.
O lote de protagonistas não está definido, mas as sondagens dão médias de 24 a 25% para Macron na primeira volta, margem que garante a passagem à segunda votação. O Presidente tem as vantagens dos meios de comunicação, do apoio institucional e da melhoria da situação económica.
Se as eleições fossem agora, Marine Le Pen seria a adversária na segunda volta, já que a líder da União Nacional tem uma média de 17 a 18% nas intenções de voto. Há, apesar de tudo, sondagens que dão a Éric Zemmour valores acima de Le Pen, embora a média do ensaísta esteja abaixo, em 14 a 15%. Zemmour entusiasma muita gente, mas também tem alto nível de rejeição, pelo que a sua candidatura pode colapsar.
Nos cenários de segunda volta, Macron venceria Zemmour e Le Pen com vantagens folgadas, respectivamente de 14 e 16 pontos percentuais, mas sabemos que isto não vai ficar assim: a esquerda e Os Republicanos (LR na sigla em francês) ainda não têm candidato.
Os partidos de esquerda terão dificuldades em encontrar um campeão único. Os que têm mais hipóteses são Jean-Luc Mélenchon (radical), Yannick Jadot (ecologista) e Anne Hidalgo (socialista), todos abaixo dos 10%. Este campo político pode não juntar mais do que 22 ou 23% dos votos e uma faixa significativa deste eleitorado prefere Macron.
Sem Zemmour na corrida, Le Pen vai à segunda volta; com Zemmour, é tudo mais complexo e o candidato de centro-direita torna-se viável. Os números sugerem que, se Xavier Bertrand for o candidato do LR, Macron terá dificuldades na reeleição. No eventual confronto com Marine Le Pen, Bertrand tem resultado superior ao de Macron, o que indica a possibilidade de o candidato republicano atrair voto de protesto.