A fome nos campos de deslocados no Darfur, devido à guerra que assola o Sudão há mais de um ano, está a aumentar descontroladamente e pode tornar-se na mais mortífera do mundo, alertaram hoje as autoridades norte-americanas.

A Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas (PAM) e outras agências humanitárias independentes e governamentais intensificaram os apelos a um cessar-fogo e ao acesso à ajuda em todo o Sudão.

Este apelo veio no seguimento de os peritos internacionais do Comité de Revisão da Fome terem confirmado formalmente, na quinta-feira, que a fome em pelo menos um dos três campos improvisados de deslocados, que albergam cerca de 600 mil pessoas, estava a viver um período severo.

A última grande fome mundial, que possivelmente será ultrapassada pela atual no Sudão, ocorreu na Somália e matou cerca de 250 mil pessoas em 2011, metade das quais crianças com menos de cinco anos de idade.

Os bloqueios que as partes beligerantes do Sudão estão a colocar aos alimentos e a outras ajudas destinadas aos civis encurralados no campo de Zamzam estão a concretizar “os piores receios da comunidade humanitária”, disse um dos peritos norte-americanos.

A última vez que os trabalhadores humanitários conseguiram levar ajuda humanitária aos civis encurralados nos campos de Darfur foi em abril, sendo que o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF) tem a área sob cerco e são acusados de atacar hospitais, campos e outros alvos civis.

A diretora do Programa Alimentar Mundial, Cindy McCain, exortou, após a declaração do Comité de Revisão da Fome, a comunidade internacional a trabalhar para um cessar-fogo.

Também o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados confirmou hoje que a crise de fome no Estado de Darfur do Norte, no oeste do Sudão, está a matar pessoas.

“Temos agora a confirmação trágica de que há fome na região de Darfur do Norte do Sudão. Mulheres, crianças e homens deslocados estão a morrer de fome, subnutrição e doenças”, afirmou o coordenador regional dos refugiados no Sudão, Mamadou Dian Balde, em comunicado.

O coordenador recordou que o conflito obrigou mais de dez milhões de pessoas a fugir das suas casas, muitas das quais foram deslocadas várias vezes.

Nesse sentido, indicou que, somadas as “terríveis atrocidades contra os direitos humanos” e a falta dos serviços mais básicos para uma grande percentagem da população, “a catástrofe humanitária mais premente do mundo está a crescer e a aprofundar-se todos os dias, ameaçando engolir toda a região”.

“A chegada de milhões de refugiados e de pessoas deslocadas internamente está a levar as comunidades de acolhimento ao ponto de rutura. À medida que a fome aumenta no meio da violência no Sudão, aqueles que atravessam as fronteiras em busca de segurança chegam em condições cada vez mais precárias”, acrescentou.

Balde apelou a uma “ação urgente para evitar mais mortes e sofrimento” e para pôr fim à guerra.

O Darfur do Norte é o único Estado da região do Darfur que não é controlado pelos paramilitares, que estão a sitiar a sua capital, Al Fasher, onde se aglomeram centenas de milhares de pessoas deslocadas.

A guerra no Sudão já deixou entre 30 mil e 150 mil mortos, segundo diferentes estimativas, e transformou o país africano no cenário da pior crise de deslocados do planeta.

Os Estados Unidos e a Arábia Saudita convidaram as duas partes para conversações de cessar-fogo na Suíça, em agosto. O líder das RSF disse que planeava participar, enquanto o governo sudanês, controlado pelos militares, declarou que qualquer negociação antes de implementar a Declaração de Jeddah “não seria aceitável para o povo sudanês”.

A Declaração de Jeddah de Compromisso para a Proteção dos Civis, aprovada no ano passado, pretendia pôr fim ao conflito, mas nenhuma das partes se comprometeu com os seus objetivos.