Estranha de forma vida é, em primeiro lugar, um fado de Amália e Alfredo Marceneiro que abre o filme de Almodóvar com o mesmo título. Sucede que a tão portuguesa estranha forma de vida abrange em especial as intrigantes amizades que já varreram tantos políticos, sempre apenas ao serem conhecidos os trâmites em que as mesmas decorriam.

Ao contrário da maior parte dos comentários, não alinho no discurso de que a Justiça se deveria vergar aos inconfessáveis interesses do que se acha melhor para o país, da mesma forma que já deixei a fase da ingenuidade em que acreditava que juízes e procuradores eram completamente independentes do poder político (esteja que partido estiver no poder).

Por outro lado, procuro não alinhar no voyeurismo judicial com que a comunicação social nos tem presenteado, visando transformar cada português num elemento de um inexistente júri do tribunal. Somos instados a dar opinião sobre tudo quando praticamente não sabemos nada, exceto que há quem seja advogado e faça diplomas legislativos para a sua própria constituinte, quem fume droga e outros ainda que escondem dinheiro em sítios pouco recomendáveis (aliás, de forma incompreensível não demonstrando qualquer capacidade de inovação, uma vez que garrafas de vinho são um tópico já usado e os envelopes já deveriam ser uma espécie em vias de extinção). De “casinhos” em “casinhos” passámos ao “casão” mas os eventos a que agora nos referimos não são motivados por movimentações extraconjugais mas em prol dos “amigos”. Aqueles amigos que, por exemplo, foram administradores da TAP, depois de terem participado da privatização, da nacionalização e agora se aliavam (ou eram) potenciais investidores, apresentando como currículo gostar de aviões desde pequeno. Os outros amigos que se zangaram e terminaram com um tristíssimo episódio com um assessor, cujos exatos contornos nunca foram apurados.

Não estou, confesso, muito interessada no destino que irá ter o processo judicial, o qual antecipo ser o arquivamento ou a prescrição. De facto, aqui e sempre, à Justiça o que é da Justiça e desejo a Costa e restantes amigos que obtenham melhor Justiça do que aquela que nos deixaram.

Na essência, o que me interessa, e admito estar muito isolada, é a dimensão ética. Enquanto quase todos olham para os efeitos na economia e ficam num dos lados da barricada de uma guerra que não é nossa, prefiro focar-me na honestidade. É verdade que aquela se faz com total independência dos valores e princípios, mas são estes que deveriam ser indispensáveis para o exercício de cargos políticos.

É verdade que temos uma tradição de alguma reverência, de que nunca partilhei, para com titulares dos órgãos de soberania. Tenho contudo aprendido que, no nosso país e pelo que se tem sabido e desde há anos, o melhor cargo de todos é ser amigo de político. Pelo que se vê e neste país, a amizade vale muito mais do que o amor porque parece ser assentes nesta que os grandes negócios se fazem, sempre em prejuízo de Portugal. E estranhamente perdemo-nos em discussões sem aprendermos a lição.

Não resisto a terminar estas linhas com uma alusão ao poema que lhes dá título: Nós, claramente, não sabemos para onde vamos e, mais do que teimarmos em correr, o que melhor fazemos é rir das desgraças. Na maior parte das vezes, das nossas próprias desgraças.

Advogada

Artigo publicado na edição do NOVO de dia 11 de novembro.