As eleições do passado domingo confirmaram as expectativas menos otimistas.

Estamos perante um cenário marcado pela fragmentação e pela dificuldade objetiva na formação de uma maioria política parlamentar coesa, coerente e estável. Os partidos tradicionais polarizadores de soluções de governo ficaram muito aquém da força necessária para protagonizar uma solução governativa equilibrada.

O Parlamento alterou significativamente a sua composição tradicional. Pela primeira vez uma larga maioria de centro-direita é feita com a participação de uma força política portadora de uma mensagem disruptiva e de confrontação com o modelo institucional prevalente. O statu quo político foi incapaz de perceber os sinais de alerta de insatisfação e de rutura de uma parte importante do eleitorado.

A vinda ao processo eleitoral, a partir da abstenção, de centenas de milhares de eleitores revelou uma forte vontade para a mudança. Ao mesmo tempo, a fraca expressão dos resultados dos partidos centrais pôs em evidência o cansaço, a rejeição e a falta de confiança nos incumbentes. Importará referir, igualmente, a diminuição de peso do conjunto dos partidos à esquerda do espetro político e a incapacidade de partidos novos se afirmarem perante a adversidade do momento e a polarização das escolhas. A vontade de clarificação eleitoral, subjacente ao ato de dissolução do Parlamento, por parte do Presidente da República, desembocou num beco de estreita saída, cujo horizonte se desconhece. Os eleitores quiseram expressar a sua insatisfação com o atual estado de coisas. Quem não tinha percebido o país e achava que tudo estava bem terá ficado surpreendido com a resposta expressa no voto.

Neste contexto o que podem esperar, agora, os cidadãos tendo em vista o futuro próximo? Sentido de responsabilidade institucional seguramente. Apoio a uma solução de governo democrática e razoavelmente estável para um horizonte mínimo de dois anos. Entendimento estratégico em torno dos pontos essenciais que determinam, no plano interno e no plano externo, a segurança do país, a sua confiança e credibilidade. Essa será a obrigação do partido de governo tal como do principal partido da oposição cujo objetivo é, naturalmente, voltar a ser governo.

Não será por esse exercício de responsabilidade institucional que as diferenças se atenuarão. Muito menos que a oposição ficará nas mãos dos extremistas. Estes apenas continuarão a crescer se a resolução dos problemas concretos das pessoas for substituída pela retórica panfletária e pelos assomos de radicalismo inconsequente.

É grande a tentação para a entropia política dos aparelhos partidários. Tal como tem acontecido em tantos outros países europeus, as mesmas práticas e a incapacidade de compreender a transformação da sociedade conduzirão inexoravelmente às mesmas consequências. De pouco valerá brandir o fantasma das cercas sanitárias ou do medo como argumento político. O maior perigo, no meio de toda esta incerteza, reside na incapacidade dos atores políticos de entender e interpretar o sentimento das pessoas e o contexto dos seus problemas reais. Esperemos que, desta vez, perante o quadro que temos, possa ser diferente.

Professor universitário//a.camposfernandes@outlook.com

Artigo publicado na edição do NOVO de sábado, dia 16 de março