Ao longo dos últimos anos, sucessivos governos têm trabalhado sobre o tema da descentralização. Contudo, nem sempre olham para o fenómeno sobre o mesmo prisma. Para muitos, descentralizar é “poupar”. Gastar menos, tentando que, quase como um milagre, se faça mais trabalho com menos custos. Para outros, descentralizar é “ser eficiente”. Acreditar que com menos recursos – técnicos, humanos e de processos – é possível servir melhor as populações e as comunidades. Há ainda quem julgue que descentralizar é “qualificar a democracia”. Com menos níveis de decisão, existirão menos cargos políticos e administrativos.

Pois bem, todas estas visões, por si só, são altamente redutoras daquilo que são os verdadeiros ganhos de uma descentralização efetiva. Descentralizar competências para os municípios, ou para entidades regionais (nas suas mais diversas esferas) é, acima de tudo, colocar o processo de decisão política e administrativa mais perto de quem legitima a democracia. É colocar as decisões sob o rumo e o futuro das nossas comunidades mais próximas dos cidadãos. É, na verdade, um instrumento para aproximar o eleito do eleitor, o decisor e o servidor daquele que será servido. Com as devidas adaptações, é certo, um processo de descentralização robusto é a conceção política que o nosso regime democrático terá mais próxima dos modelos de decisão direta dos cidadãos, muito em voga nos países escandinavos e helvéticos.

Podemos então afirmar que descentralizar, mais do que “poupar”, do que ser “eficiente” ou do que “qualificar” é ganhar. Ganhar conhecimento dos problemas e do melhor modo de os resolver. Ganhar proximidade entre as comunidades e o decisor, seja ele político ou administrativo. É ganhar confiança, pois estimula os cidadãos a participar no processo democrático. É ganhar coesão territorial, pois é esse mesmo território, e os seus cidadãos, que terão as ferramentas de identificação, análise e decisão. Em suma, descentralizar é fundamentalmente um ganho para todos aqueles que integram a comunidade.

Este ganho não traz, obrigatoriamente, uma redução de despesa. Descentralizar não pode ser visto como uma melhoria financeira numa qualquer coluna de excel. Ao aproximarmos a decisão dos eleitores, temos de robustecer os processos e a estrutura dos eleitos. Temos de qualificar os recursos técnicos, humanos e informáticos. Temos de fornecer maior dinamismo e um reforço orçamental, acompanhados de uma agilidade processual e legislativa. Temos de ter menos pareceres supra territoriais e mais confiança nas entidades de proximidade. Temos, acima de tudo, de ser corajosos. Uma coragem que se centra na decisão de passar o testemunho.

Uma democracia mais pujante vive com a salutar convivência entre os diversos níveis de administração política e a consequente confiança nas decisões de todos. Saibamos aproveitar a oportunidade e não fiquemos a meio caminho. Afastemos a tão portuguesa complexidade teórico-técnica.

Se fizermos isto, estamos a passar uma mensagem muito clara aos cidadãos: todos, no nosso Estado, confiamos nas vossas decisões. Vamos, em conjunto, ganhar com a descentralização. Servir em proximidade é fazer mais e melhor, ao lado dos eleitores.