A SIC Notícias foi palco de um debate muito amigável com muita concordância, simpatia e objetivos comuns por parte da coordenadora do Bloco de Esquerda (BE) e o líder do Livre, Rui Tavares. Mais do que um debate, foi uma conversa.

O debate (?) começou com Mariana Mortágua a solidarizar-se com Rui Tavares e a criticar Luís Montenegro por o líder da AD se querer fazer substituir por Nuno Melo nos debates com o Livre e com a CDU.

“Acho errado que se mudem as regras do jogo a meio do jogo, a postura nos debates dita a postura com que estamos na política. Era importante que os fizesse todos a bem da democracia e do esclarecimento”, disse Mariana Mortágua a abrir, numa deixa aproveitada por Rui Tavares com algum humor à mistura.

“Estou um bocado chateado com a Mariana, porque depois do debate que teve com Luís Montenengro ele não quer debater comigo e com o Paulo Raimundo. É uma descortesia enorme, o Livre não foi informado por parte de nenhum dos três líderes da coligação. Se for primeiro-ministro, Luís Montenegro como vai fazer nos debates quinzenais? Só responde a uns partidos e a outros manda responder um ministro ou um secretário de Estado? Luís Montenegro deixou que presumisse que todos os debates fossem com ele, deixou que tacitamente que todos pensassem que um sim era um sim, mas ao mesmo tempo está a dizer que um não é um não. Eu quero saber é se esse não dele ao Chega vale tanto como o sim que valia para estes debates”, questionou Rui Tavares.

Em seguida, foi pedido a Mariana Mortágua que esclarecesse como a sua avó foi abrangida pela lei das rendas de 2012, situação com que atacou Luís Montenegro no debate que teve com o líder da AD. Contudo, a coordenadora do BE não tirou todas as dúvidas. “Todos sentiram na pele a lei das rendas. Todos os idosos que tivessem um arrendamento ficassem em sobressalto. A minha avó sentiu esse sobressalto e não foi a única. O que eu digo e mantenho é que em 2012 foi aprovada uma lei muito cruel. Não faz sentido discutir as questões particulares, cada idoso teve a sua situação partiular, todas diferentes, mas em comum o medo e o sobressalto”, sublinhou sem ir mais fundo na questão.

Questionados sobre o que distingue os dois partidos, Mariana Mortágua preferiu começar por dizer que existem objetivos comuns ao Livre e ao BE: “Derrotar a direita, conseguir uma maioria que vire a página das políticas da amaioria absoluta. Temos diagnósticos comuns para os principais problemas, entre eles o da habitação.”

E aqui surge uma pequena divergência. O Bloco quer proibir a venda de casas no centro das cidades e a não residentes. Já o Livre não concorda com a proibição pura e dura, mas sim aplicar uma “sobretaxa de IMT sobre prédios de luxo, que esse mercado pode muito bem pagar e que sirva para um fundo de emergência na habitação para fomentar o mercado no segmento classe média-baixa e jovens”.

E acrescentou: “Não é ilegítimo que essas pessoas queiram viver em Portugal mas podemos aumentar os impostos para ser menos atrativo, mesmo continuando a comprar pode ajudar a quem está em risco de perder as suas casas.”

Mariana Mortágua ouviu e sentenciou: “A sobretaxa não resolve o problema, o milionário do Dubai paga com felicidade essa taxa.”

Para a atrair os jovens a permanecer em Portugal, os dois partidos mostraram  ideias comuns.

Rui Tavares falou que é possível manter os jovens “melhores salários”, mas deixou um alerta: “Vivemos num espaço de liberdade de circulação da União Europeia (UE) que permite aos jovens que não tenham de esperar que os nossos políticos venham a convergir com a média da UE. Temos que estar na vanguarda da UE em vários sectores, as pessoas vão à procura de qualidade de vida, excelentes serviços públicos, não devemos recuar um milímetro no Estado social, e sair da ansiedade em que os seus pais viveram do fim do mês. Erradicar a pobreza deve ser o nosso grande desígnio.”

Sobre o mesmo tema, Mortágua defendeu que a “direita não sabe como se faz o crescimento económico, a direta pensa que diminui o IRC e a economia cresce”. “Portugal é incapaz de reter gente qualificada e que faz falta ao SNS e aos serviços públicos. Precisamos de melhores salários, mas estes não sobem por milagre nem decreto, é preciso combate à precariedade, reforço de contratação coletiva, o aumento salarial depende de regras laborais.”

Outra das (pequenas) divergência tem a ver com Rendimento Básico Incondicional (RBI) que o Livre quer testar com um projeto piloto. Mortágua contrapôs revelando que o valor indexado ao RBI é maior “do que são as contribuições para a Segurança Social”.

“Há muita gente com certezas sobre RBI, o que o Livre diz é ‘experimente-se’. Pode ser testado em duas comunidades portuguesas, na Finlândia entre RSI e RBI , as pessoas com RSI procuravam menos trabalho porque tinham a guilhotina de deixar de receber o RSI e com o RBI, como essa guilhotina não existia, era um incentivo à procura de trabalho ao contrário do que diz a direita”, argumentou Rui Tavares.

O Livre também é o ‘pai’ da proposta de quatro dias de trabalho por semana. “Uma semana de quatro dias pode ser uma forma de fixar os jovens em Portugal”, concordou Mariana Mortágua.

No último tema, um possível reforço do orçamento de despesa para a defesa. O BE, nas palavras de Mariana Mortágua, “apoia a autodeterminação dos povos, a Ucrânia e a defesa da Ucrânia”. Confrontada se o BE continua a defender a saída de Portugal da NATO, a dirigente do BE mostrou a constituição que a acompanhou no debate. “É o que diz a constituição portuguesa, artigo 7.º dissolução dos blocos militares”.

Em suma, uma conversa amigável entre líderes de dois partidos que durante meia-hora sorriram muito, criticaram a direita e mostraram que querem fazer parte de uma solução de esquerda liderada pelo PS.

“Não acho que estejamos a disputar eleitorado de esquerda, todos os partidos acolhem todos os votos venham de onde venham. Seria mau se os partidos de esquerda estivessem a tentar ganhar votos uns aos outros, Toda a esquerda precisa de crescer”, disse Rui Tavares.

“Sabemos de onde viemos e que temos objetivos comuns”, concordou Mariana Mortágua.